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A escola onde seus filhos estudam é inclusiva?

Famílias de estudantes com deficiência física, mental ou intelectual sofrem para fazer matrícula

Publicado em: 18/01/2018 07:15

"A luta deve ser de todos nós%u201D, pontua. Foto: Marlon Diego/Esp DP (Foto: Marlon Diego/Esp DP)
"A luta deve ser de todos nós%u201D, pontua. Foto: Marlon Diego/Esp DP (Foto: Marlon Diego/Esp DP)
A tarefa de Luziane Santos, psicóloga, 46 anos, parecia simples. Precisava matricular o filho Miguel (nome fictício), de 6 anos, em uma escola regular. As surpresas começaram logo nas primeiras visitas às unidades de ensino. Para decepção da psicóloga, nunca havia vaga para a criança. Quando essa não era a justificativa, alegava-se falta de profissional especializado em sala de aula no atendimento a estudantes com deficiência. Nas contas de Luziane, o filho teve a matrícula negada em mais de dez escolas particulares do Recife. Foi quando ela decidiu denunciar o caso ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE).

A situação da psicóloga é semelhante a de outras famílias de crianças com algum tipo de deficiência física, mental ou intelectual. Quando precisam mudar a escola dos filhos e filhas, vivem uma verdadeira peregrinação em busca de instituições que cumpram simplesmente o que diz a lei e matriculem meninos e meninas independentemente de suas condições. Miguel tem Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e Transtorno Opositor Desafiador (TOD). Desde os dois anos, começou a estudar. Luziane, no entanto, precisou tirar o filho da escola porque a unidade somente ofertava até o infantil 4.

A psicóloga se antecipou e começou a procura por uma outra instituição em julho do ano passado. Até encontrar uma escola inclusiva, em novembro, em Jaboatão dos Guararapes, onde mora, viveu um calvário que envolveu um sentimento de solidão, injustiça e tristeza. “Teve dias em que eu chorei com essa situação”, lembra. Os caminhos começaram a ficar menos nebulosos quando a psicóloga publicou seu drama no Facebook, onde passou a receber ajuda.

No início deste mês, o músico Tico Santa Cruz, da banda Detonautas, usou a mesma rede social para revelar que sua filha não teria sido aceita em uma escola no Rio de Janeiro após a coordenação saber que a menina tem TDAH, o mesmo transtorno de Miguel. Segundo o cantor, a escola comunicou que a menina deveria passar por uma avaliação para ver se estava apta para cursar o 4º ano e, logo depois, ele foi informado da falta de vagas e que a escola não poderia atender a criança em nenhuma de suas unidades. Após o desabafo, a escola alegou falha na comunicação.

A promotora de Justiça de Educação da Capital, Eleonora Rodrigues, reconhece: casos como o de Luziane são muitos, mas a história é sempre a mesma. “A justificativa é que não há pessoal para trabalhar o filho, que já tem um número de crianças em sala e que não tem material específico. A lei diz, no entanto, que a matrícula é compulsória e a negativa é crime”, alerta a promotora, que atua há 13 anos na área. Muitas escolas alegam o custo alto gerado por uma criança com deficiência por conta dos investimentos em salas com recursos diferenciados e professores especializados. Para Eleonora, essa justificativa não tem sentido. “Esses custos precisam estar previstos na planilha da escola desde o começo do ano. Além disso, é direito de uma criança sem deficiência conviver com outra com deficiência. Do contrário, jamais vamos transformar a sociedade e ajudar se não convivo com essas pessoas. A luta deve ser de todos nós”, pontua.

Uma das formas de fazer valer o direito é procurar a Secretaria Municipal de Educação, quando se trata de ensino infantil, e a Secretaria Estadual de Educação, no caso de ser Ensino Fundamental ou Médio. Em paralelo, a família pode fazer a denúncia no MPPE.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência alterou o art. 8º da Lei Federal nº 7.853/1989 para majorar a pena do crime de recusa de matrícula em virtude de alguma deficiência: “Constitui crime punível com reclusão de 2 a 5 anos e multa recusar, cobrar valores adicionais, suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, em razão de sua deficiência.” Denunciar esse tipo de postura, alerta a promotora, é o começo de uma grande mudança e do fim da impunidade.
 
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