Vida Urbana
Entrevista
Saúde precisa ser prioridade, diz o oncologista Antônio Buzaid
O médico é considerado um dos maiores oncologistas do país
Publicado: 20/10/2017 às 23:03
Com mais de 30 anos de profissão, o oncologista Antônio Carlos Buzaid, 59 anos, não para de estudar. Graduado em Medicina em 1982 pela Universidade de São Paulo, ele se define como um eterno pesquisador. Dedica-se aos livros pelo menos dez horas a cada fim de semana. Para descobrir a cura da doença de algum paciente, não mede esforços. Buzaid luta como se estivesse num tatame do tae kown do, seu hobby preferido desde pequeno. “O princípio do tratamento é igualzinho ao das lutas marciais, onde o inimigo tem pontos fortes e fracos”, comparou o médico, que é membro do Comitê Gestor do Centro de Oncologia Dayan-Daycoval do Hospital Israelita Albert Einstein e chefe do Centro de Oncologia Antônio Ermírio de Moraes (Coaem), do Hospital São José, ligado à Beneficência Portuguesa, em São Paulo.
Natural de São Paulo, ele conta nesta entrevista exclusiva ao DIARIO DE PERNAMBUCO que sempre pensou em ser médico. Vocação presente nas brincadeiras de criança. Fazia pequenos experimentos em laboratórios com cobaias. Aos 18 anos, ingressou na Faculdade de Medicina. De lá para cá, não parou mais. Passou mais de dez anos fazendo especialização nos Estados Unidos, onde foi laureado com o prêmio de Teacher of the Year do Hospital MD Anderson Cancer Center, o maior centro de câncer do mundo, em Houston, no Texas. Buzaid também é autor do Manual de Oncologia do Brasil, criado em 2002, que tem edições em português, inglês e espanhol. Também possui livros publicados, o
último deles, Vencer o Câncer, publicado em parceria com o médico Fernando Maluf. Também possui um site com mais de 200 vídeos, que auxilia seus pacientes e familiares.
Nesse sábado, o oncologista estará no Recife, onde participa, a partir das 8h30, do II Seminário para Pacientes de Câncer de Mama, no Mar Hotel Conventions, em Boa Viagem. Na entrevista ao DIARIO, ele fala da sua experiência, dos pacientes, na luta contra o câncer, sobre as iniciativas para aumentar qualidade da oncologia no Brasil e os avanços nas pesquisas que podem caminhar para cura da doença.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como o senhor começou sua carreira em Medicina?
ANTONIO BUZAID - Desde jovem tive interesse em ser médico. Quando adolescente tinha um laboratório para fazer pequenos experimentos em cobaias e sempre tive interesse em biologia, doenças, experimentos, etc. Sempre me intrigou o porque as doenças ocorriam e como tratá-las. Aos 18 anos, entrei na Universidade de São Paulo (USP) para fazer a graduação. Sempre gostei de casos complexos, quanto mais difícil, mais despertava a atenção e meu interesse.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como surgiu o interesse do senhor pela Oncologia?
ANTÔNIO BUZAID - Quando residente de clinica médica no Hospital das
Clinicas da USP eu testemunhava pacientes com câncer serem negligenciados. Eles eram literalmente marginalizados das unidades de internação e colocados e enfermarias a espera da morte. Aquele contexto me incomodava de modo profundo. Decidi que enfrentar este desafio seria minha missão em vida. Como no Brasil não havia programa de treinamento de oncologia naquele tempo, fui fazer minha especialização nos Estados Unidos.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Que avanços tivemos no tratamento do câncer de
mama no país?
ANTÔNIO BUZAID - Os maiores avancos no tratamento do câncer de mama
foram principalmente para o subtipo de câncer de mama chamado HER-2
positivo tanto no tratamento pre-operatório quando na doença metastática. Para os tumores que têm receptores hormonais na célula cancerosa e são HER-2 negativos (chamados de luminais), teremos em poucos meses no Brasil uma nova droga chamada Palbociclibe, que, quando associada à hormonioterapia, aumenta muito sua eficácia. O que as mulheres mais temem é a quimioterapia, pelo mal estar, queda de cabelo, e essa molécula carrega a quimioterapia dentro dela. Ela chega no tumor entra e libera a medicação somente no tumor.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Os casos de câncer de mama estão de fato
aumentando ou é porque o crescimento dos registros deve-se à procura
maior por exames?
ANTÕNIO BUZAID - Ambos os fatores participam do aumento. Mudanças de
hábito de vida como gestação tardia, uso de álcool, obesidade na pós-menopausa, reposição hormonal excessiva, dieta pró-inflamatória (como grande ingesta de refrigerantes, carne vermelha e carbohidratos) contribuem para este aumento. Um bom sinal é que a qualidade dos exames de imagem no país tem melhorado cada vez mais. O que facilita o diagnóstico precoce e chances de cura e recuperação mais rápida dos pacientes.
DIARIO DE PERNAMBUCO - A quimioprevenção deve ser aplicada em
pacientes com câncer de mama, de que forma?
ANTÔNIO BUZAID - A quimioprevenção consiste no uso de medicações que
reduzem o risco de se adquirir um câncer. No caso do câncer de mama, o antihormonios como tamoxifeno e raloxifeno (antiestrogenos) reduzem o risco. São usados em casos selecionados em pacientes com alto risco de desenvolver câncer de mama. Mas deve ser aplicada em pacientes de alto risco. Por exemplo, a biópsia não mostrou câncer, mas uma lesão aumento o risco de câncer no futuro. Essas pessoas podem receber remédios. Os mais usados são esses que citei. Eles reduzem o risco, mas não diminuem. O problema é que eles provocam efeitos colaterais como calores, secura vaginal e alterações no sono.
DIARIO DE PERNAMBUCO - O que o senhor achou de medidas como a tomada
pela atriz Angelina Jolie que realizou mastectomia?
ANTÔNIO BUZAID - A atriz é portadora da mutação BRCA1 que resulta em importante aumento do risco de câncer de mama e de ovário. O risco acumulado(se a paciente vive até os 80 anos) é de 67% para câncer de mama e de 45% para câncer de ovário. A decisão que a Angelina tomou foi a mais correta. Ela também teve os ovários removidos para reduzir o risco de câncer ovariano. A retirada dos ovários, neste caso, deve acontecer aos 35 anos pois a partir dessa idade para quem tem essa mutação, o risco aumenta rápido. Orientamos, geralmente, a mulher passar por um aconselhamento genético, explicando os prós e contras da mastectomia e remoção dos ovários.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como é lidar com uma especialidade em que os
pacientes estão tão frágeis emocionalmente?
ANTÔNIO BUZAID - É a parte mais dura da oncologia. Eu sempre digo que
nunca me canso de trabalhar ou estudar. Me canso de ver pacientes sofrerem. Oncologia é uma das especialidades da Medicina, no que concerne ao emocional do médico. Exite um cançado em relação à prática do que faço, que é o cançaso emocional. Choramos por dentro quando, mesmo fazendo um grande esforço, perdemos um paciente. A oncologia produz profundo cansaço emocional que tem que ser contrabalanceado com atividades que reduzem o stress. Por exemplo, vou a academia sete dias por semana para me exercitar e viajo para a minha casa de campo no interior de São Paulo, e quando o tempo permite, para meu apartamento no Paiva, em Pernambuco, para relaxar um pouco.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Que experiência mais marcou o senhor ao longo
dos seus mais de 30 anos de profissão?
ANTÔNIO BUZAID - O maior prazer que tenho na vida é curar pacientes
quando isto é dificil de ser feito. Já curei muitos pacientes que todos os médicos ao meu redor disseram que era impossivel. Estas são as experiências marcantes e mais recompensadoras. Ainda era residente na USP, quando chegou um homem com uma parada cardiorespiratória, uma pessoa simples. Nós rescussitamos ele, que se recuperou e teve alta depois. Meses após, fui abordado na rua pela aquele homem maltrapilho que veio me agradecer. Fiquei sensibilizado. Já ganhei tantos
presentes que não tenho nem onde colocar.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Na sua especialidade, os tratamentos são
longos, duram meses ou anos. Qual a estratégia para superar as barreiras emocionais e fazer com que o paciente assuma o tratamento?
ANTÔNIO BUZAID - Meu hobby são as marciais desde que era pequeno. Tenho o hábito de me aliar ao paciente na briga contra o câncer. Explico que se ele tiver 1% de chance, darei 100% do meu esforço para ajudar. Enfatizo, vamos brigar juntos. Acho que a única maneira de vencer uma briga é entrar com 100% de esforço para ganhar. Os pacientes percebem isso. Vou ao limite, me esforço, brigo por isso. Entro numa briga para tentar ganhar, embora esteja ciente que as
chances de sucesso às vezes seja pequena.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Para o senhor, quais os maiores desafios que a
Oncologia encontra no Brasil, na área clínica e principalmente no campo da pesquisa?
ANTÔNIO BUZAID - A medicina brasileria tem dois grandes extremos: a medicina pública e a privada. Há um abismo separando as duas. A medicina privada, em centros de excelencia, é comparável àquela dos maiores centros do mundo. A pesquisa clínica no Brasil está melhorando, mas ainda está muito defasada, quando comparamos a países desenvolvidos. A pesquisa básica é ruim pois não há funding adequado para isto. Pesquisa básica é luxo de país rico. O próprio câncer é um desafio. Ainda não há cura para muitos casos da doença avançada. Um dos desafios no Brasil, além da pesquisa, à aprovação de drogas, que
acontece de forma mais lenta em relação aos Estados Unidos e Europa.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Porque há tanta morosidade para conclusão de estudos científicos no país?
ANTÔNIO BUZAID - A burocracia criada no nosso país para iniciar estudos clínicos é fruto de vergonha para todos os brasileiros. Isto tem que ser retificado de uma vez por toda. Enquanto nos Estados Unidos, em geral, em três meses um programa de pesquisa está aprovado e em andamento, no Brasil, demora, no mínimo, um ano. Então, estamos sempre atrasados. O governo está tentando modificar isso, mas existe uma pressão tanto da indústria farmacêutica quanto dos próprios médicos. Atualmente, para participar dos protocolos com as drogas mais quentes, não disponíveis no Brasil, somos obrigados a mandar o paciente para fora do país. Obviamente, que aí o acesso se limita àqueles que têm condições de viajar.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Então que avaliação, o senhor faz do atendimento atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS)? E O que pode ser feito para melhorar?.
ANTÔNIO BUZAID - Infelizmente, a saúde não tem sido prioridade para a maioria dos governos. É imperativo que haja maior alocação de recursos. Outra estratégia é colocar mais estudos clínicos no SUS, o que aumentaria a qualidade do cuidado médico rapidamente. Mas, é preciso fomentar protocolos de pesquisas clínicas que ofereçam aos pacientes sempre tratamentos mais avançados. A Alemanha é um país que conseguiu fazer de maneira adequada.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como a experiência do senhor fora do país tem
contribuído para um melhor desenvolvimento da Oncologia no Brasil?
ANTÔNIO BUZAID - Tive a oportunidade de ser professor tanto na Universidade de Yale por quatro anos, assim com no maior hospital de câncer do mundo, o MD Anderson Cancer Center, em Houston, no Texas, por outros cinco anos. Nos dois centros, trabalhei nas funções médica como administrativa. O que me ajudou muito a criar, conjuntamente com o doutor Raul Cutait e Frederico Costa, o primeiro Centro de Oncologia em um hospital privado, o Hospital Sirio-Libanes, em 1998, onde foi diretor até 2011. Há três anos, viemos para o Beneficencia Portuguesa e estabelecemos o Centro de Oncologia Antônio Ermírio de Moraes, que hoje é considerado uma das maiores referências do país. Me sinto honrrado em fazer parte desse time.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como é possível avançar na detecção precoce do
câncer no Brasil?
ANTÔNIO BUZAID - É simples. É necessário melhorar o cuidado da medicina pública e promover programa educativos. De nada ajuda se uma paciente nota um pequeno nódulo na mama e demora meses para avaliar, diagnosticar e tratar. Campanhas e o acesso à medicina de nível razoável há muito a fazer. Saúde, na minha visão, precisa ser prioridade dos governos. É uma pena que somos um país onde a percentagem de investimento do PIB não é elevada, se comparada a
outros países desenvolvidos no mundo. Por isso, a população precisa escolher melhor seus governantes.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Qual é o papel das diversas especialidades médicas no diagnóstico e acompanhamento do paciente oncológico?
ANTÔNIO BUZAID - O tratamento do câncer é multidisciplinar, simplesmente porque hoje ainda precisamos de vários tratamentos, como cirurgia, radioterapia, quimioterapia, imunoterapia, terapia alvo e hormonioterapia, para se atingir a maior chance de cura ou sobrevida. Além disso, é comum o paciente sofrer complicações durante o tratamento, por isso se relacionam com cardiologistas e
pneumologistas, por exemplo. Nenhum médico interage tanto com outras disciplinas. Você está lidando com pacientes desesperados, e isso, desperta um estímulo maior dentro de você. Por isso, continuo sempre estudando.
DIARIO DE PERNAMBUCO - O senhor lançou um manual para leigos, O Vencer o Câncer, que dicas o livro traz?
ANTÔNIO BUZAID - Este livro foi editado por mim e pelo Doutor Fernando Maluf, com foco nos pacientes, familiares e pessoas em geral que tenham interesse no assunto. Hoje, temos um Instituto como mesmo nome, sem fins lucrativos, para educar os pacientes sobre tudo relativo ao câncer. Conhecer o inimigo é o primeiro passo para combatê-lo. O site www.vencerocancer.org.br é fantástico. Convido a todos para ver seu conteúdo. No site, há mais de 200 vídeos educacionais. Um melhor entendimento do inimigo aumenta as chances de vencermos a guerra.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como surgiu a necessidade de explicar o câncer para leigos?
ANTÔNIO BUZAID - É imperativo que o paciente ajude no seu tratamento para ter as maiores chances de cura ou sobrevida. Saber mais sobre a doença sempre ajuda. Quando um paciente tem um problema, hoje, ele consulta o Google e aparece um bilhão de informações. Mas falta um filtro. Esse filtro é o médico, que deve orientar e explicar o que de fato é bom ou não é para cada um. O paciente não é capaz de sozinho discriminar os dados, ele pode interpretar erroneamente. Por isso, nosso site tenta assistir os pacientes oferecendo informações de alta
eficácia. Atualizamos sempre com pequenos vídeos, novas medicações e funcionamento das mesmas.
Natural de São Paulo, ele conta nesta entrevista exclusiva ao DIARIO DE PERNAMBUCO que sempre pensou em ser médico. Vocação presente nas brincadeiras de criança. Fazia pequenos experimentos em laboratórios com cobaias. Aos 18 anos, ingressou na Faculdade de Medicina. De lá para cá, não parou mais. Passou mais de dez anos fazendo especialização nos Estados Unidos, onde foi laureado com o prêmio de Teacher of the Year do Hospital MD Anderson Cancer Center, o maior centro de câncer do mundo, em Houston, no Texas. Buzaid também é autor do Manual de Oncologia do Brasil, criado em 2002, que tem edições em português, inglês e espanhol. Também possui livros publicados, o
último deles, Vencer o Câncer, publicado em parceria com o médico Fernando Maluf. Também possui um site com mais de 200 vídeos, que auxilia seus pacientes e familiares.
Nesse sábado, o oncologista estará no Recife, onde participa, a partir das 8h30, do II Seminário para Pacientes de Câncer de Mama, no Mar Hotel Conventions, em Boa Viagem. Na entrevista ao DIARIO, ele fala da sua experiência, dos pacientes, na luta contra o câncer, sobre as iniciativas para aumentar qualidade da oncologia no Brasil e os avanços nas pesquisas que podem caminhar para cura da doença.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como o senhor começou sua carreira em Medicina?
ANTONIO BUZAID - Desde jovem tive interesse em ser médico. Quando adolescente tinha um laboratório para fazer pequenos experimentos em cobaias e sempre tive interesse em biologia, doenças, experimentos, etc. Sempre me intrigou o porque as doenças ocorriam e como tratá-las. Aos 18 anos, entrei na Universidade de São Paulo (USP) para fazer a graduação. Sempre gostei de casos complexos, quanto mais difícil, mais despertava a atenção e meu interesse.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como surgiu o interesse do senhor pela Oncologia?
ANTÔNIO BUZAID - Quando residente de clinica médica no Hospital das
Clinicas da USP eu testemunhava pacientes com câncer serem negligenciados. Eles eram literalmente marginalizados das unidades de internação e colocados e enfermarias a espera da morte. Aquele contexto me incomodava de modo profundo. Decidi que enfrentar este desafio seria minha missão em vida. Como no Brasil não havia programa de treinamento de oncologia naquele tempo, fui fazer minha especialização nos Estados Unidos.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Que avanços tivemos no tratamento do câncer de
mama no país?
ANTÔNIO BUZAID - Os maiores avancos no tratamento do câncer de mama
foram principalmente para o subtipo de câncer de mama chamado HER-2
positivo tanto no tratamento pre-operatório quando na doença metastática. Para os tumores que têm receptores hormonais na célula cancerosa e são HER-2 negativos (chamados de luminais), teremos em poucos meses no Brasil uma nova droga chamada Palbociclibe, que, quando associada à hormonioterapia, aumenta muito sua eficácia. O que as mulheres mais temem é a quimioterapia, pelo mal estar, queda de cabelo, e essa molécula carrega a quimioterapia dentro dela. Ela chega no tumor entra e libera a medicação somente no tumor.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Os casos de câncer de mama estão de fato
aumentando ou é porque o crescimento dos registros deve-se à procura
maior por exames?
ANTÕNIO BUZAID - Ambos os fatores participam do aumento. Mudanças de
hábito de vida como gestação tardia, uso de álcool, obesidade na pós-menopausa, reposição hormonal excessiva, dieta pró-inflamatória (como grande ingesta de refrigerantes, carne vermelha e carbohidratos) contribuem para este aumento. Um bom sinal é que a qualidade dos exames de imagem no país tem melhorado cada vez mais. O que facilita o diagnóstico precoce e chances de cura e recuperação mais rápida dos pacientes.
DIARIO DE PERNAMBUCO - A quimioprevenção deve ser aplicada em
pacientes com câncer de mama, de que forma?
ANTÔNIO BUZAID - A quimioprevenção consiste no uso de medicações que
reduzem o risco de se adquirir um câncer. No caso do câncer de mama, o antihormonios como tamoxifeno e raloxifeno (antiestrogenos) reduzem o risco. São usados em casos selecionados em pacientes com alto risco de desenvolver câncer de mama. Mas deve ser aplicada em pacientes de alto risco. Por exemplo, a biópsia não mostrou câncer, mas uma lesão aumento o risco de câncer no futuro. Essas pessoas podem receber remédios. Os mais usados são esses que citei. Eles reduzem o risco, mas não diminuem. O problema é que eles provocam efeitos colaterais como calores, secura vaginal e alterações no sono.
DIARIO DE PERNAMBUCO - O que o senhor achou de medidas como a tomada
pela atriz Angelina Jolie que realizou mastectomia?
ANTÔNIO BUZAID - A atriz é portadora da mutação BRCA1 que resulta em importante aumento do risco de câncer de mama e de ovário. O risco acumulado(se a paciente vive até os 80 anos) é de 67% para câncer de mama e de 45% para câncer de ovário. A decisão que a Angelina tomou foi a mais correta. Ela também teve os ovários removidos para reduzir o risco de câncer ovariano. A retirada dos ovários, neste caso, deve acontecer aos 35 anos pois a partir dessa idade para quem tem essa mutação, o risco aumenta rápido. Orientamos, geralmente, a mulher passar por um aconselhamento genético, explicando os prós e contras da mastectomia e remoção dos ovários.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como é lidar com uma especialidade em que os
pacientes estão tão frágeis emocionalmente?
ANTÔNIO BUZAID - É a parte mais dura da oncologia. Eu sempre digo que
nunca me canso de trabalhar ou estudar. Me canso de ver pacientes sofrerem. Oncologia é uma das especialidades da Medicina, no que concerne ao emocional do médico. Exite um cançado em relação à prática do que faço, que é o cançaso emocional. Choramos por dentro quando, mesmo fazendo um grande esforço, perdemos um paciente. A oncologia produz profundo cansaço emocional que tem que ser contrabalanceado com atividades que reduzem o stress. Por exemplo, vou a academia sete dias por semana para me exercitar e viajo para a minha casa de campo no interior de São Paulo, e quando o tempo permite, para meu apartamento no Paiva, em Pernambuco, para relaxar um pouco.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Que experiência mais marcou o senhor ao longo
dos seus mais de 30 anos de profissão?
ANTÔNIO BUZAID - O maior prazer que tenho na vida é curar pacientes
quando isto é dificil de ser feito. Já curei muitos pacientes que todos os médicos ao meu redor disseram que era impossivel. Estas são as experiências marcantes e mais recompensadoras. Ainda era residente na USP, quando chegou um homem com uma parada cardiorespiratória, uma pessoa simples. Nós rescussitamos ele, que se recuperou e teve alta depois. Meses após, fui abordado na rua pela aquele homem maltrapilho que veio me agradecer. Fiquei sensibilizado. Já ganhei tantos
presentes que não tenho nem onde colocar.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Na sua especialidade, os tratamentos são
longos, duram meses ou anos. Qual a estratégia para superar as barreiras emocionais e fazer com que o paciente assuma o tratamento?
ANTÔNIO BUZAID - Meu hobby são as marciais desde que era pequeno. Tenho o hábito de me aliar ao paciente na briga contra o câncer. Explico que se ele tiver 1% de chance, darei 100% do meu esforço para ajudar. Enfatizo, vamos brigar juntos. Acho que a única maneira de vencer uma briga é entrar com 100% de esforço para ganhar. Os pacientes percebem isso. Vou ao limite, me esforço, brigo por isso. Entro numa briga para tentar ganhar, embora esteja ciente que as
chances de sucesso às vezes seja pequena.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Para o senhor, quais os maiores desafios que a
Oncologia encontra no Brasil, na área clínica e principalmente no campo da pesquisa?
ANTÔNIO BUZAID - A medicina brasileria tem dois grandes extremos: a medicina pública e a privada. Há um abismo separando as duas. A medicina privada, em centros de excelencia, é comparável àquela dos maiores centros do mundo. A pesquisa clínica no Brasil está melhorando, mas ainda está muito defasada, quando comparamos a países desenvolvidos. A pesquisa básica é ruim pois não há funding adequado para isto. Pesquisa básica é luxo de país rico. O próprio câncer é um desafio. Ainda não há cura para muitos casos da doença avançada. Um dos desafios no Brasil, além da pesquisa, à aprovação de drogas, que
acontece de forma mais lenta em relação aos Estados Unidos e Europa.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Porque há tanta morosidade para conclusão de estudos científicos no país?
ANTÔNIO BUZAID - A burocracia criada no nosso país para iniciar estudos clínicos é fruto de vergonha para todos os brasileiros. Isto tem que ser retificado de uma vez por toda. Enquanto nos Estados Unidos, em geral, em três meses um programa de pesquisa está aprovado e em andamento, no Brasil, demora, no mínimo, um ano. Então, estamos sempre atrasados. O governo está tentando modificar isso, mas existe uma pressão tanto da indústria farmacêutica quanto dos próprios médicos. Atualmente, para participar dos protocolos com as drogas mais quentes, não disponíveis no Brasil, somos obrigados a mandar o paciente para fora do país. Obviamente, que aí o acesso se limita àqueles que têm condições de viajar.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Então que avaliação, o senhor faz do atendimento atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS)? E O que pode ser feito para melhorar?.
ANTÔNIO BUZAID - Infelizmente, a saúde não tem sido prioridade para a maioria dos governos. É imperativo que haja maior alocação de recursos. Outra estratégia é colocar mais estudos clínicos no SUS, o que aumentaria a qualidade do cuidado médico rapidamente. Mas, é preciso fomentar protocolos de pesquisas clínicas que ofereçam aos pacientes sempre tratamentos mais avançados. A Alemanha é um país que conseguiu fazer de maneira adequada.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como a experiência do senhor fora do país tem
contribuído para um melhor desenvolvimento da Oncologia no Brasil?
ANTÔNIO BUZAID - Tive a oportunidade de ser professor tanto na Universidade de Yale por quatro anos, assim com no maior hospital de câncer do mundo, o MD Anderson Cancer Center, em Houston, no Texas, por outros cinco anos. Nos dois centros, trabalhei nas funções médica como administrativa. O que me ajudou muito a criar, conjuntamente com o doutor Raul Cutait e Frederico Costa, o primeiro Centro de Oncologia em um hospital privado, o Hospital Sirio-Libanes, em 1998, onde foi diretor até 2011. Há três anos, viemos para o Beneficencia Portuguesa e estabelecemos o Centro de Oncologia Antônio Ermírio de Moraes, que hoje é considerado uma das maiores referências do país. Me sinto honrrado em fazer parte desse time.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como é possível avançar na detecção precoce do
câncer no Brasil?
ANTÔNIO BUZAID - É simples. É necessário melhorar o cuidado da medicina pública e promover programa educativos. De nada ajuda se uma paciente nota um pequeno nódulo na mama e demora meses para avaliar, diagnosticar e tratar. Campanhas e o acesso à medicina de nível razoável há muito a fazer. Saúde, na minha visão, precisa ser prioridade dos governos. É uma pena que somos um país onde a percentagem de investimento do PIB não é elevada, se comparada a
outros países desenvolvidos no mundo. Por isso, a população precisa escolher melhor seus governantes.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Qual é o papel das diversas especialidades médicas no diagnóstico e acompanhamento do paciente oncológico?
ANTÔNIO BUZAID - O tratamento do câncer é multidisciplinar, simplesmente porque hoje ainda precisamos de vários tratamentos, como cirurgia, radioterapia, quimioterapia, imunoterapia, terapia alvo e hormonioterapia, para se atingir a maior chance de cura ou sobrevida. Além disso, é comum o paciente sofrer complicações durante o tratamento, por isso se relacionam com cardiologistas e
pneumologistas, por exemplo. Nenhum médico interage tanto com outras disciplinas. Você está lidando com pacientes desesperados, e isso, desperta um estímulo maior dentro de você. Por isso, continuo sempre estudando.
DIARIO DE PERNAMBUCO - O senhor lançou um manual para leigos, O Vencer o Câncer, que dicas o livro traz?
ANTÔNIO BUZAID - Este livro foi editado por mim e pelo Doutor Fernando Maluf, com foco nos pacientes, familiares e pessoas em geral que tenham interesse no assunto. Hoje, temos um Instituto como mesmo nome, sem fins lucrativos, para educar os pacientes sobre tudo relativo ao câncer. Conhecer o inimigo é o primeiro passo para combatê-lo. O site www.vencerocancer.org.br é fantástico. Convido a todos para ver seu conteúdo. No site, há mais de 200 vídeos educacionais. Um melhor entendimento do inimigo aumenta as chances de vencermos a guerra.
DIARIO DE PERNAMBUCO - Como surgiu a necessidade de explicar o câncer para leigos?
ANTÔNIO BUZAID - É imperativo que o paciente ajude no seu tratamento para ter as maiores chances de cura ou sobrevida. Saber mais sobre a doença sempre ajuda. Quando um paciente tem um problema, hoje, ele consulta o Google e aparece um bilhão de informações. Mas falta um filtro. Esse filtro é o médico, que deve orientar e explicar o que de fato é bom ou não é para cada um. O paciente não é capaz de sozinho discriminar os dados, ele pode interpretar erroneamente. Por isso, nosso site tenta assistir os pacientes oferecendo informações de alta
eficácia. Atualizamos sempre com pequenos vídeos, novas medicações e funcionamento das mesmas.
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