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AFRO Afoxé Alafin Oyó: 31 anos de resistência negra em Pernambuco Quem vê o grupo cantando músicas de resistência negra não imagina as duras batalhas que enfrentou nas ruas contra o preconceito e a discriminação

Por: Samuel Calado - Redes Sociais e Site

Publicado em: 06/09/2017 16:25 Atualizado em: 06/09/2017 17:13

Cortejo em homenagem aos 31 anos da Entidade Cultural. Foto: Divulgação
Cortejo em homenagem aos 31 anos da Entidade Cultural. Foto: Divulgação

Pedir licença a Xangô, uma das principais divindades do panteão dos deuses africanos, bastante cultuada nas religiões de matriz africana. Com muito respeito, é isso o que fazem os participantes de um dos Afoxés mais tradicionais de Pernambuco, o Alafin Oyó que adotou este orixá como patrono. O nome, traduzido como ‘senhor dos palácios’, está ligado à quarta majestade do reino de Iorubá, no continente africano, onde hoje fica a Nigéria. Fundado em 1986, o grupo comemora 31 anos de militância e resistência negra no estado de Pernambuco. 

Fabiano Santos, relata que a entidade foi concebida com o objetivo de unir pessoas de várias camadas sociais, moradores de diferentes cidades. Foto: Divulgação
Fabiano Santos, relata que a entidade foi concebida com o objetivo de unir pessoas de várias camadas sociais, moradores de diferentes cidades. Foto: Divulgação
O presidente do afoxé, Fabiano Santos, relata que a entidade foi concebida com o objetivo de unir pessoas de várias camadas sociais, moradores de diferentes cidades, praticantes e não praticantes do candomblé, inclusive ateus, que tinham em comum a ligação com o movimento negro. "Decidimos nos estabelecer como uma manifestação além do carnavalesco e sem ligação apenas com um terreiro. O Afoxé Alafin Oyó surgiu como um espaço aglutinador onde negros e negras de diferentes realidades poderiam se articular na luta pela afirmação da identidade negra e contra o preconceito e a discriminação racial”. 

Apresentação do Afoxé no Cortejo dos Afoxés de Pernambuco. Foto: Divulgação
Apresentação do Afoxé no Cortejo dos Afoxés de Pernambuco. Foto: Divulgação
Quem vê o grupo brilhando e cantando músicas de resistência negra não imagina as duras batalhas que enfrentou nas ruas. Fabiano relata que os encontros e as apresentações eram limitados pelo racismo e os resquícios de censura do período da Ditadura Militar. Mesmo assim, os passos de ijexá continuavam ao som dos atabaques, agogôs e outros instrumentos nas ruas de Olinda. "Apesar do termo 'reacreativa', o nosso estatuto busca evidenciar, sobretudo, os ensinamentos da tradição Yorubá nagô, louvando os nossos deuses através da música, da dança, do cântico e dos rituais", explica Fabiano.  

Os participantes relatam que cresceram dentro do afoxé e foi através dele que aprenderam a valorizar e defender a identidade negra. Foi dentro do Alafin que nasceram outros grupos conhecidos como o Afoxé Oxum Pandá, o quarto mais antigo de Pernambuco. O babalorixá Genivaldo Lemos Barbosa, presidente do Oxum Pandá, relata que foi um dos associados do Alafin. “O meu afoxé foi fundado em 1995. Antes, eu já era do Alafin, fui um dos primeiros sócios”. 

Apesar do regimento burocrático que obriga a entidade possuir um estatuto que estabeleça uma hierarquia formalizada, os coordenadores explicam que a interação entre os integrantes acontece de forma democrática e horizontalizada. Todos possuem voz. Isso faz a diferença no grupo, evidenciando sobretudo o caráter político. 

Foto: Divulgação
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Percussionista e um dos diretores do grupo, Leonardo Azevedo conta que além de levar para os quatro cantos do mundo a tradição nagô, o grupo ensina aquilo que foi deixado pelos ancestrais africanos. “Nós desfilamos nas ruas com as cores vermelho e branco, tocando o ritmo ijexá e cantando músicas de afirmação da nossa identidade negra e religiosidade africana”. 

Bailarina e coordenadora do Balé Alafin Oyó, Maria Luiza (25) explica que as coreografias do grupo respeitam e reverenciam cada divindade: “De Exu a Oxalá, todos são respeitados e cultuados através dos movimentos”. 

Foto: Divulgação
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A festa está muito presente na cultura africana e o afoxé se preocupa bastante em tornar o ambiente alegre e fraternal. Assim como nas casas de candomblé, os jovens aprendem com os mais velhos e ensinam aos que estão por vir, configurando uma grande família. 

Foto: Divulgação
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 Legado 

Há mais de 20 anos, o Diario de Pernambuco publicou uma matéria sobre o trabalho de comunicação do grupo, que possuía um boletim chamado Negração. Esse material continha textos de militância e informações direcionadas às comunidades e à população afrodescendente, conhecido por exercer um importante papel de representatividade. 

Além do Negração, o grupo também já participou da produção dos álbuns Afoxés de Pernambuco - lançado em 2004 pelo Movimento Negro Unificado (MNU) -, Umbilical, de Juraci Tavares - lançado em 2016 com apoio da Secretaria de Cultura da Bahia - e Liberdade de expressão, promovido pela Secretaria da Justiça de Pernambuco. 

 No audiovisual, estrelou um documentário produzido pela TV Viva - produtora local de TV aberta ligada ao Centro Cultural Luiz Freire -, e foi premiado no 4º Vídeo Music Festival Democracy and Comunication/IMRE, em 1992, em Nova York. 

É possível pesquisar na Biblioteca Pública de Pernambuco e na internet, diversos livros, artigos e outros materiais bibliográficos sobre o grupo. 

Foto: Divulgação
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Dentro e fora

Entre as milhares de apresentações nacionais e internacionais do grupo, destacam-se a participação de mais de 10 anos na Festa da Lavadeira (Paiva, Olinda, Recife e no estado de Goiás), os vários anos no Festival de Inverno de Garanhuns (FIG), e o Festival Del Fuego (Santiago de Cuba), em 2010.

Manutenção e limitações 

Durante todo esse tempo, o afoxé tem se mantido com doações e com os cachês de apresentações. Seus membros são voluntários e o grupo tem o sonho de reformar a sede para melhor receber os visitantes e acolher os participantes. As pessoas que quiserem doar, participar das oficinas ou visitar a sede do Alafin podem ligar para a sede ou acessar as redes sociais.




Serviço
Endereço: Avenida Joaquim Nabuco, nº 475, Varadouro, Olinda - PE
Instagram: @alafineusou
Contatos: (81) 99823-8769 e 98500-0568.



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