° / °

Vida Urbana
Recife

Roteiro leva turista para conhecer a Bomba do Hemetério

Alternativo à praia de Boa Viagem e aos cartões-postais do Recife Antigo, o passeio pelo bairro da Zona Norte mistura candomblé, maracatu e até caldinho de cebola

Publicado: 19/03/2015 às 09:27

A árvore-orixá Iroko fica nos fundos do terreno do Sítio do Pai Adão, primeiro terreiro de candomblé da Nação Nagô no Brasil. Foto: Rodrigo Silva/Esp. DP/DA Press/

A árvore-orixá Iroko fica nos fundos do terreno do Sítio do Pai Adão, primeiro terreiro de candomblé da Nação Nagô no Brasil. Foto: Rodrigo Silva/Esp. DP/DA Press()

Única agência de viagem a organizar passeios na Bomba do Hemetério, a Loa Turismo de Experiências (F.: (81) 8838-5360) quer apresentar o turista a um Recife real. Distante da orla da praia de Boa Viagem e dos equipamentos culturais do entorno do Marco Zero, o bairro da Zona Norte do Recife foi o escolhido para receber visitantes em busca de um turismo de contato. A fim de andar a pé, experimentar frutas na feira, visitar pontos turísticos ligados à cultura africana. "Tem gente que prefere fazer um tour gastronômico, tem gente que prefere passar duas horas em um só lugar, tem gente que prefere conhecer mais lugares em menos tempo. Montamos o roteiro de acordo com o interesse de cada grupo", explica Larissa Almeida, sócia-diretora. Um pacote sob medida sai a R$ 65 por pessoa, para grupos de até 50 integrantes.

A Loa mantém uma relação estreita com a Universidart (F.: (81) 9667-3393), um centro de cultura e artes que vem mudando a cara do bairro desde 2000. Sobretudo, depois que o Instituto Walmart aportou na Bomba do Hemetério no ano de 2008. Em parceria com o Governo de Pernambuco, a Prefeitura do Recife, instituições privadas e organizações não governamentais, o instituto resolveu investir não só na Universidart, como na região como um todo. O Bombando Cidadania é um programa de desenvolvimento social, traçado a partir de estratégias voltadas a economia, educação, saúde e meio ambiente. "Desde então, o bairro vem se transformando", garante Elisandro Damasceno, coordenador institucional da Universidart, com sede no número 458 da Rua do Rio. "Hoje, inclusive, temos 20 moradores capacitados para atuar como condutores locais". A capacitação foi conduzida pelo Instituto Federal de Ciência, Educação e Tecnologia de Pernambuco (IFPE). A Universidart, por sua vez, também organiza passeios pela Bomba do Hemetério. Valores a combinar, a depender do passeio.

Moradores da Bomba do Hemetério participam do Bombando Cidadania, programa desenvolvido pelo Instituto Walmart. Foto: Rodrigo Silva/Esp. DP/DA Press
O Bombando Cidadania entende a Bomba do Hemetério como um território expandido. O bairro de Água Fria faz parte dessa lista. É lá que o visitante tem acesso ao primeiro terreiro tombado no Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), no dia 5 de setembro de 1985. O Conjunto Ritualístico do Terreiro Obá Ogunté, mais conhecido como Sítio do Pai Adão, é ainda o primeiro terreiro de candomblé da Nação Nagô no país. Sua história remete ao final do século XIX, quando Inês Joaquina da Costa (1875-1905) chegou ao Recife como escrava nigeriana. Conhecida como Ifá Tinuké, dona Inês teria se instalado no entorno do que hoje é a Bomba do Hemetério. É considerada pela população, portanto, a fundadora do Sítio do Pai Adão. A tradição atravessou os séculos. Atualmente, o babalorixá Manoel Papai é o responsável pelo terreiro, que inclui um ilê, ou barracão, como sede dos cultos às divindades. Nos fundos do terreno, repousa um Iroko, termo que remete à árvore de origem africana que abrigaria um poderoso orixá de mesmo nome. No Brasil, a árvore é também chamada de gameleira.

A árvore-orixá Iroko fica nos fundos do terreno do Sítio do Pai Adão, primeiro terreiro de candomblé da Nação Nagô no Brasil. Foto: Rodrigo Silva/Esp. DP/DA Press
Saindo do número 1466 da Estrada Velha de Água Fria, seguimos em direção à sede do Maracatu Nação Raízes de Pai Adão. Inicialmente, a agremiação funcionava junto ao terreiro. Cresceu tanto que tomou emprestada a casa do antigo Instituto Vida para ter um endereço próprio. Fundado em 1998, o grupo reúne cerca de 110 pessoas. "Desse total, 90% são crianças e adolescentes", conta Jorge Carneiro, condutor e um dos diretores do Raízes de Pai Adão. Com agendamento prévio, o turista pode visitar o espaço, experimentar os acessórios usados pelos músicos e dançarinos e ter uma palhinha de como funciona o cortejo. Guilherme Venâncio, 12 anos, é um dos integrantes. "Vi meus amigos tocando e quis participar". Luanda, malê e martelo são os três batuques característicos do Maracatu Nação, o garoto ensina. "É fácil, quer ver?". Com sorte, um lanche ainda é servido como um agrado ao visitante.

Maracatu Nação Raízes de Pai Adão recebe visitantes com agendamento prévio. Foto: Rodrigo Silva/Esp. DP/DA Press
Falando em comida, a Bomba do Hemetério recebe todo mês de setembro o festival Delícias da Comunidade, que também contempla os bairros de Brasília Teimosa e Santo Amaro. Seguindo até o Largo da Bomba, como é chamada a Praça Castro Alves, encontramos o Bar Tuca Versátil (F.: (81) 3444-5863) e o Espetinho da Ceça (F.: (81) 3449-0700) pelo caminho. Ambos se sobressaíram no festival, atraindo clientela durante todo o ano. Na Rua Bomba do Hemetério, 425, o carro-chefe de Tuca é o caldinho de cebola (R$ 3,50). Disponível de quarta-feira a sábado, das 17h às 23h, e domingo, das 12h às 23h. Sextas e sábados têm até música ao vivo. Já na Rua Chã de Alegria, 235, são 12 espetinhos diferentes no cardápio de Ceça. Tem de carne, frango, codorna, coração de galinha. A partir de R$ 4. Aberto de terça-feira a domingo, das 17h às 2h da madrugada. Esse contato com a cozinha local ajuda a consolidar a Bomba do Hemetério como um destino turístico-cultural de base comunitária.

Caldinho de cebola é o carro-chefe do Bar Tuca Versátil. Foto: Roberto Ramos/DP/DA Press
Na Rua Raul Pompéia, 462, funciona o Ponto de Cultura Bacnaré (F.: (81) 3444-3710), o balé de cultura negra do Recife. No currículo, mais de 160 prêmios, ao longo de 26 anos de luta. "Meu marido foi o primeiro bailarino negro a pisar no palco do Teatro de Santa Isabel. Depois que ele faleceu, me senti na obrigação de continuar esse trabalho de divulgação da cultura afro", comenta Antônia Batista, diretora do Bacnaré. Em julho, o grupo viaja mais uma vez à França. Vai participar de um evento internacional em homenagem a Mestre Ubiracy Ferreira, marido de Antônia e fundador do Bacnaré. Entre homens e mulheres, cerca de 50 bailarinos integram o coletivo. Também com agendamento, é possível assistir a um trecho de um de seus três espetáculos: Memória, Sangue africano ou Nações africanas. Há também uma lojinha que vende utensílios produzidos e usados pelos bailarinos.

Bacnaré é um balé de cultura negra que soma mais de 160 prêmios, ao longo de 26 anos de história. Foto: Rodrigo Silva/Esp. DP/DA Press
Mais de Vida Urbana