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Lula prega polarização e diz que não dá para ficar no meio do caminho

Publicado em: 23/11/2019 10:29

Ainda tentando recuperar seus direitos políticos, mas apontado pelo PT como principal nome para a eleição de 2022, Lula sinalizou seus planos de continuidade política em um discurso de pouco mais de uma hora (Foto: NELSON ALMEIDA / AFP)
Ainda tentando recuperar seus direitos políticos, mas apontado pelo PT como principal nome para a eleição de 2022, Lula sinalizou seus planos de continuidade política em um discurso de pouco mais de uma hora (Foto: NELSON ALMEIDA / AFP)
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) exaltou a polarização política e reforçou seu lugar na oposição ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido). 
 
Segundo ele, aqueles que pedem para ele "calar certas verdades para não tumultuar o ambiente político, para o PT não provocar uma ameaça à democracia" são os que, na verdade, não tiveram compromisso com a democracia.

"Aos que criticam ou temem a polarização, temos que ter a coragem de dizer: nós somos, sim, o oposto de Bolsonaro. Não dá para ficar em cima do muro ou no meio do caminho: somos e seremos oposição a esse governo de extrema-direita que gera desemprego e exige que os desempregados paguem a conta", afirmou o petista em discurso na abertura do 7º Congresso Nacional do PT, nesta sexta-feira (22), em São Paulo. 

O evento, que termina no domingo (24), deve confirmar a reeleição de Gleisi Hoffmann como presidente do partido por mais quatro anos.

Nesta sexta, reuniu petistas presos pela Lava Jato, como Delúbio Soares, João Vaccari Neto e José Dirceu, que foi aclamado pelo público.

Ainda tentando recuperar seus direitos políticos, mas apontado pelo PT como principal nome para a eleição de 2022, Lula sinalizou seus planos de continuidade política em um discurso de pouco mais de uma hora.

"Hoje me coloco à disposição do Brasil para contribuir nessa travessia para uma vida melhor, vida em plenitude, especialmente para os que não podem ser abandonados pelo caminho", afirmou. 

No palco, a namorada de Lula, Janja, se sentou ao lado dele. Após o início do evento, ex-presidente se ausentou do palco por cerca de uma hora. Segundo assessores, ele estava acertando detalhes do discurso, que foi parte lido –algo bastante incomum para o petista– e parte improvisado.

Petistas da cúpula do partido já haviam dito que o discurso de Lula seria mais elaborado e pensado do que os anteriores, considerados mais um desabafo de quem acabara de sair da prisão.

Após ter ficado 580 dias preso, condenado por corrupção e lavagem de dinheiro pelo caso do tríplex de Guarujá, o ex-presidente foi a estrela do congresso petista e fez questão de reforçar a polarização com Bolsonaro ao mesmo tempo em que reafirmou o compromisso do PT com a democracia.

"Vamos deixar uma coisa bem clara: se existe um partido identificado com a democracia no Brasil é o Partido dos Trabalhadores", afirmou. "Nós não aceitamos mais censura, tortura, AI-5 e perseguição a adversários políticos."

"Não fomos nós que falamos em fechar congresso e muito menos o STF com um cabo e um soldado [referência a uma frase do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do atual presidente, em 2018]. Não fomos nós que pedimos revisão do pleito só pra desgastar o partido vencedor. [...] Que sustentamos uma farsa judicial e midiática para tirar do páreo o candidato líder nas pesquisas. [...] Não fomos nós os responsáveis pela eleição de um candidato que tem ojeriza à democracia", disse .   

"São essas pessoas que agora nos dizem para não polarizar o país. Como se polarização fosse sinônimo de extremismo político e ideológico. Como se o Brasil já não estivesse há séculos polarizado entre os poucos que têm tudo e os muitos que nada têm", completou.

"Não venham me dizer que o PT é radical. Um pouco de radicalismo faz bem a nossa alma. [...] Não estou mais radical, estou mais conciente", disse em parte improvisada.

Também no improviso, Lula disse ser "o maior polarizador desse país". Lula repetiu a lógica de que só quem polariza está no jogo e pode chegar ao segundo turno. "Parabéns pela polarização", declarou.

Lula rejeitou comparação a Bolsonaro ao dizer que jamais ameaçaria cassar uma concessão de TV, como o presidente fez em relação a Globo. O petista, porém, não poupou críticas à emissora.

"Antes que a Rede Globo me acuse outra vez pelo que não disse nem fiz, não ousem me comparar ao presidente que eles escolheram. Jamais ameacei e jamais ameaçaria cassar arbitrariamente uma concessão de TV, mesmo sendo atacado sem direito de resposta e censurado como sou pelo jornalismo da Globo."

Lula ainda defendeu a liberdade de imprensa e a regulação da mídia, afirmando que "democratizar a comunicação não é fechar uma TV, é abrir muitas".

"Não pode um grupo familiar decidir sozinho o que é notícia e o que não é, com base unicamente em seus interesses políticos e econômicos", afirmou.

O ex-presidente voltou a criticar a Lava Jato, o ex-juiz Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol e disse que busca a anulação de sua sentença. "Hoje eu me sinto muito mais forte do que quando eu me entreguei [à polícia]", disse.

Lula chamou a Lava Jato de "a maior farsa judicial que este país já assistiu" e disse que lutará para que sua sentença seja anulada e ele tenha novo julgamento justo. "Se eu for inocente, tenham coragem de dizer que Lula é inocente."

O ex-presidente também repreendeu medidas do governo Bolsonaro e os índices econômicos ruins. Para Lula, "o Brasil só não quebrou ainda por causa da herança dos governos do PT". 

"Parece que enfiaram o Brasil à força numa máquina do tempo e nos enviaram de volta a um passado que a gente já tinha superado. O passado da escravidão, da fome, do desemprego em massa, da dependência externa, da censura, do obscurantismo", declarou.

Ao falar da oposição, defendeu aliança com a centro-esquerda e forças do campo popular, além de reaproximação com os trabalhadores excluídos.

"Salvar o país da destruição e do caos social que este governo está produzindo não é tarefa para um único partido", disse.

O petista voltou a rejeitar fazer autocrítica -disse que o erro foi não fazer mais e melhor. "Querem de nós um humilhante ato de contrição, como se tivéssemos de pedir perdão por continuar existindo no coração do povo brasileiro, apesar de tudo que fizeram para nos destruir."

A presença de Lula, possível após decisão do Supremo Tribunal Federal contra a prisão de condenados antes do trânsito em julgado (fim dos recursos), fez com que o congresso tivesse que ser repensado. A direção do PT tentou mover às pressas a abertura para a praça da República para atrair multidão, mas problemas de logística e chuva impediram.

Com isso, a fala teve que ocorrer na Casa de Portugal, que abriga cerca de 1.500 pessoas. O local ficou cheio, mas não superlotado. Houve controle na entrada, restrita a credenciados no congresso.

Ao abrir o evento, Gleisi afirmou que a soltura de Lula coloca a oposição ao governo federal em novo patamar. Da mesma forma, a ex-presidente Dilma Rousseff disse que ao lado de Lula a luta será mais fácil.

Dilma afirmou ainda que neoliberalismo e neofascismo são irmãos siameses, "um não existe sem o outro". 

"É isso que torna a elite brasileira tão frágil diante do neofascismo, que a torna tão cúmplice da reforma da Previdência e da precarização do trabalho", disse.

Fernando Haddad afirmou que o PT não pode subestimar sua própria força. "Bolsonaro perto de nós pode muito pouco se tivermos consciência histórica da nossa energia e do que o povo espera de nós", declarou.

O evento reuniu ainda petistas como Jaques Wagner, José Genoíno, Fernando Pimentel e outros líderes da cúpula petista.

Guilherme Boulos (PSOL) e Manuela D'Ávila (PC do B) também participaram. Durante o evento, o governo comunista de Cuba homenageou Lula e a plateia respondeu com "viva a revolução". O petista também recebeu título de cidadão parisiense. 

Ao contrário do usual, Lula leu boa parte de seu discurso. Petistas da cúpula do partido já haviam dito que o discurso de Lula seria mais elaborado e pensado do que os anteriores, considerado mais um desabafo de quem esteve 580 dias preso.

O congresso do PT discutirá, entre outros assuntos, as alianças para a eleição de 2020 e a oposição a Bolsonaro. Ao final, o partido apresenta uma resolução que guia seus rumos nos próximos anos. O documento terá como base a tese defendida pela corrente majoritária do PT, a CNB (Construindo um Novo Brasil).

Lula já enfatizou a necessidade de que o partido tenha candidaturas próprias no maior número de cidades e lance seus melhores quadros. A estratégia é usar as campanhas petistas e o tempo de TV em 2020 para fazer uma defesa do partido, do seu legado e dele próprio em meio aos processos da Lava Jato. 

Em relação a Bolsonaro, líderes da corrente dizem que pedir impeachment será palavra vazia, pois não há crime de responsabilidade nem mobilização social ou maioria parlamentar para dar sustentação a isso. 

A tese da CNB, que será debatida pelos petistas e pode receber alterações, fala em buscar o centro numa ampla frente contra Bolsonaro.
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