Diario Editorial: Matança desafia o Estado

Publicado em: 07/11/2017 07:17 Atualizado em:

“Que país é este?” A pergunta, título da composição de Renato Russo, então líder e vocalista da banda Legião Urbana, está na boca e mente dos brasileiros. Não à toa. A cada hora, uma pessoa é morta no país. Nesse ritmo, foram registrados 61.619 assassinatos em 2016, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública — aumento de 3,8% em relação a 2015. Para os autores do estudo, o total de mortes equivale ao número de vítimas da bomba nuclear que dizimou, em 1945, a cidade de Nagasaki, no Japão.

Em proporção inversa ao aumento de homicídios, os investimentos em políticas de segurança pública foram reduzidos. O país destinou R$ 81 bilhões ao setor, ou 2,6% menos que em 2015. O governo federal foi o que mais retraiu os gastos: 10,8%. As unidades da Federação, em média, reduziram em 1,7%. Os municípios aumentaram em 0,6% as despesas com o setor.

A violência contra as mulheres não se arrefece. A cada duas horas, uma mulher foi assassinada em 2016, totalizando 4.657 vítimas. Só 533 casos foram classificados como feminicídio, o que indica a dificuldade das autoridades de tipificar o crime de acordo com a nova lei. Os estupros somaram 49.497 casos (aumento de 3,5%), ou seja, 135,6 ocorrências por dia.

Cresceu 17,5% (437 casos) o número policiais civis e militares vítimas de homicídio. A letalidade policial também teve alta de 25,8%. Ou seja, 4.224 (aumento de 25,8%) indivíduos foram mortos nas intervenções dos agentes de segurança pública. Entre 2009 e 2016, as ações policiais provocaram 21.897 óbitos, sendo 99,3% homens, dos quais 81,8% entre 12 e 29 anos, a maioria foi de negros (76,2%).

O Brasil ocupa, ainda, a sétima posição entre os 183 países mais perigosos e letais para crianças e adolescentes masculinos de 10 a 19 anos, com taxa de 59 mortes em cada 100 mil. É o que revela o relatório Um rosto familiar. A violência na vida de crianças e adolescentes, apresentado, internacionalmente, pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), na terça-feira. O país fica à frente do Afeganistão, o oitavo mais mortal para crianças e jovens em igual faixa etária, em razão dos conflitos bélicos.

Mudar a realidade exige do Estado tratar o tema como prioridade absoluta. Demanda investimento no serviço de inteligência e em medidas preventivas, como saúde, educação e aplicação do Estatuto do Desarmamento. É preciso compor uma rede por meio da integração dos órgãos de segurança das unidades da Federação ao sistema nacional a fim de conter e reduzir a violência. O fim da matança requer, acima de tudo, decisão política.
 


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