Diario Editorial: Desmatamento na gangorra

Publicado em: 10/11/2017 06:54 Atualizado em:

Entre agosto de 2016 e julho deste ano, o desmatamento na Amazônia atingiu 6.624km2, 16% a menos que os 7.893km2 do período anterior (2015/2016). A redução chega a 76% em relação a 2004, quando a região perdeu 26.136km2 de floresta, pouco menos que a área do estado de Alagoas. O governo federal comemora e reconhece que a presença mais ostensiva do Estado freou a ação das motosserras. Mas dificilmente o país conseguirá atingir a meta do Acordo sobre o Clima de Paris: conter o desflorestamento a 3.900km2 até 2020. O dado positivo anunciado pelo Ministério do Meio Ambiente, na terça-feira, é inferior à metade das perdas ocorridas entre 2014 e 2016, quando foram desmatados 14.196km2.

Apesar de o país estar longe da meta do acordo internacional, para o Ministério do Meio Ambiente o importante é que houve reversão da curva ascendente dos últimos dois anos. O resultado festejado recebeu boa contribuição da crise econômica, iniciada em 2014. A recessão forçou a queda do preço do gado e o do consumo de carne, o que inibiu a expansão da pecuária na Amazônia. O segmento é apontado como responsável por 65% das derrubadas de floresta para dar lugar à implantação de pastagens.

A importância da preservação do patrimônio natural no país é questão controversa. No Congresso Nacional, há elevado número de propostas voltadas à redução ou eliminação das unidades de conservação existentes na Amazônia. A flexibilização das exigências para obras de grande impacto ambiental também soma contra a manutenção das florestas. A revisão do Código Florestal, ainda no governo Dilma, tornou mais frouxas as regras de recuperação de áreas degradas e abriu brechas para a diminuição das unidades reservadas em propriedades rurais.

Esses fatores, aliados às infrações ambientais inalcançadas pela fiscalização — insuficiente ante a dimensão do país —, colocam em risco a Amazônia e os outros biomas. As punições para o desmatamento ilegal são brandas e, na maioria das vezes, deixam de ser aplicadas — a burocracia e o elevado número de recursos possíveis asseguram a impunidade aos infratores.

Enquanto os holofotes do poder público se voltam para a Amazônia, que atrai a atenção da opinião pública nacional e internacional, o cerrado, berço das águas, é legado a plano secundário. Entre 2013 e 2015, foi desmatado 1,9 milhão de hectares, ou seja, 1,7% de vegetação nativa remanescente. Só em 2015, 9.483km2 de cerrado foram devastados, segundo estudo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Tanto a Amazônia e o cerrado quanto os demais biomas brasileiros exigem políticas mais adequadas à proteção do patrimônio nacional. A interatividade entre eles é essencial ao equilíbrio climático do país e do planeta. Na gangorra dos índices, o Brasil vai se distanciando do desmatamento zero reivindicado pelas organizações nacionais e estrangeiras, preocupadas com o seu papel estratégico nas respostas aos desafios impostos pelas mudanças climáticas. Mais: perde riquezas e a possibilidade de assumir a vanguarda de uma economia sustentável, ao se render a modelos predatórios, que comprometem a qualidade de vida da atual e das futuras gerações. Ainda há tempo de mudar de rota — tomar o rumo do desmatamento zero. Já.


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