Opinião Raimundo Carrero: Uma ação é só uma ação, não atormente o leitor com excessos Raimundo Carrero é escritor e jornalista

Publicado em: 21/08/2017 07:24 Atualizado em:

Costumo ensinar na Oficina de Criação Literária que uma ação – ou uma cena – deve ser escrita com palavras exatas, apenas o inevitável. Agora revelo aqui o conselho de Tchekhov a Górki em carta datada de 3 de setembro de 1899: “Outro conselho, ao fazer a revisão, corte, onde for possível, os atributos dos substantivos e dos verbos. Você coloca tantos atributos que fica difícil para a atenção do leitor não se perder. E ele se cansa. É compreensível quando escrevo: ‘O homem sentou-se na grama’; é compreensível por ser claro. Ao contrário, é pouco inteligível e pesado para o cérebro, se escrevo: ‘um homem alto, de peito cavado,, porte discreto e barbicha ruiva sentou-se na grama verde já pisoteada pelos transeuntes; sentou-se sem fazer ruído, olhando nitída e temerosamente à sua volta’. Isso demora um pouco a entrar no cérebro, e a literatura deve entrar imediatamente, num átimo”.

Veja bem: este é apenas um dos aspectos do texto. Não é que seja mal escrita, verdade. Está até bem escrita. No entanto, o excesso de informações dificulta a compreensão. Insistindo: Não é erro de texto, mas de informação. Escreva sempre objetivamente. Isso é o que impressiona e emociona. Acredite, sim. Acredite que pode escrever com muita clareza, sem frases gordas, gananciosas ou vaidosas. Em geral, as frases vaidosas são lugares comuns, horríveis. Com jeito de autoajuda. Em geral, autoajuda resulta em frase mal feita. Texto mal escrito.

Tchecov chama, ainda, a atenção para os atributos dos substantivos. Estes atributos têm nome: adjetivos e advérbios. Um adjetivo pode ser substituído por uma ação simples e direta. “Não escreva eu vi uma linda mulher”, mas represente a lindeza. Escreva uma ação, uma cena. E lembre-se que o advérbio quase sempre está contido no verbo. No meu livro Os segredos da ficção, Cepe-2017, demonstro, no entanto, que, em literatura, há dois tipos de adjetivos: “definitivos e circunstanciais.” Definitivo: Eu vi uma linda mulher; esta mulher será sempre linda, independente de tempo ou época; circunstancial: Eu vi uma mulher, linda; a mulher é linda apenas naquele momento. O adjetivo representa aqui a psicologia do personagem. Mas o ideal é que não seja escrito.

Se existe, porém, um ideal, coloque o adjetivo na voz do personagem. Use no diálogo. É eficiente. Portanto, o excesso fica por conta da psicologia  do personagem, onde  escritor tem mais liberdade. Mas apenas no diálogo. Apenas.
 


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