Política
Opinião
Maurício Rands: STF, Renan e ativismo judicial
Com esse tipo de postura de seus membros, como fica a legitimação do STF para exercer algum ativismo judicial em seu papel contramajoritário?
Publicado: 12/12/2016 às 07:00
Por Maurício Rands
Advogado, PhD pela Universidade Oxford, professor de direito da UFPE
No constitucionalismo contemporâneo muito se debate sobre a forma como as cortes supremas devem atuar. Para uns, adeptos da teoria da autocontenção (judicial restraint), o papel de guardião da constituição tem que ser exercido com parcimônia. O fundamento é o de que são os poderes Executivo e Legislativo que detêm a soberania popular por serem eleitos pelo povo. Para outros, adeptos do ativismo judicial, as cortes supremas podem interpretar a constituição de modo a inovar nas garantias dos direitos fundamentais.
A suprema corte atua ora com maior ativismo ora com maior autocontenção. Mas, fundamentalmente, exerce dois papéis distintos. O contramajoritário, quando invalida atos dos outros poderes em nome da constituição, mesmo eles sendo detentores da vontade majoritária da nação. O outro, que pode ser chamado de “representativo argumentativo” (Alexy), quando inova no atendimento de certas demandas sociais mesmo que não expressamente legisladas.
O ativismo sempre desperta controvérsias. Os que concordam com a “inovação legislativa” do Judiciário, tendem a saudar o ativismo. Os que dela discordam, criticam-no com o argumento de que legislar é competência dos poderes eleitos. Exemplos recentes de ativismo judicial do nosso STF foram as decisões sobre uniões homoafetivas, abortos de fetos anencefálicos, abortos até 3 meses de gestação, proibição do nepotismo e do financiamento eleitoral por empresas privadas.
No Brasil de hoje dois fatores levam à ampliação do ativismo judicial. Um é a fraqueza ou baixa legitimidade dos dois poderes eleitos. O outro é a crise econômica, política e institucional. Por isso, tanto em seu papel contramajoritário quanto “representativo argumentativo”, o STF tem ocupado um grande espaço para explicitar direitos fundamentais e assegurar o funcionamento constitucional das instituições.
Vivemos, pois, uma conjuntura em que o ativismo judicial tem sido consentido e estimulado pela sociedade. Com essa maior “legitimação”, era de se esperar que a postura do STF fosse de responsabilidade, temperança e respeito aos princípios de uma constituição republicana. Correto? Não parece ser como pensam e agem alguns de seus integrantes. Comportam-se como se fossem atores políticos eleitos ou pop stars. Parecem inebriados pela aparição no Jornal Nacional e na TV Justiça (na qual um ministro da Corte Suprema Alemã, em recente visita, recusou-se a aparecer alegando que seus pares não apreciariam a exposição). Em entrevista ao jornal O Globo do dia 9/12/6, o ministro Marco Aurélio Mello afirmou categoricamente que “já estava tudo acertado” antes da sessão do dia 7/12 que manteve Renan na Presidência do Senado. Foi além, sem qualquer pudor, e regozijou-se: “Ontem, vindo para o Rio, fiquei de alma lavada. Fui parado para tirar fotografia, para ser cumprimentado, como se eu fosse um jogador de futebol ou um ator”. Seu desafeto, o ministro Gilmar Mendes, também é autor de excessos incompatíveis com a sobriedade exigida de um juiz. Como sua frase acusando Marco Aurélio de inimputável e merecedor de “impeachment”.
Há quem assevere que um acordão entre os ministros do STF, Michel Temer e Renan Calheiros teria envolvido a comissão especial dos supersalários (extrateto). Teria passado também pelo compromisso de Renan de não fazer avançar o projeto da responsabilização de juízes, procuradores e policiais por abusos de autoridade. É esperar e conferir. Nesse quadro, surpreende que o desacato à ordem judicial perpetrado por Renan tenha sido prontamente esquecido pelo STF na sessão do dia 07/12? Com esse tipo de postura de seus membros, como fica a legitimação do STF para exercer algum ativismo judicial em seu papel contramajoritário? Que sinalização é passada aos cidadãos comuns?
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