Diario Editorial: O bloqueio do WhatsApp e suas consequências Os questionamentos em torno da suspensão do WhatsApp revelam a dificuldade em se relacionar com as novas tecnologias

Por: Diario de Pernambuco

Publicado em: 03/05/2016 07:13 Atualizado em:

É desproporcional o fato de uma investigação policial sobre tráfico de drogas em uma pequena cidade de 100 mil habitantes interferir diretamente no hábito de comunicação de 100 milhões de brasileiros. Mas a verdade é que os questionamentos em torno da suspensão dos serviços do WhatsApp por 72 horas no país vão muito além dos fatos pontuais e revelam a dificuldade das instituições e da própria sociedade em compreender, dimensionar e se relacionar com as novas tecnologias e suas aplicações cotidianas. 

A base da decisão do juiz Marcel Maia Montalvão, da Vara Criminal do município de Lagarto, em Sergipe, está no fato de o Facebook (que, desde 2014, comprou o WhatsApp) se negar a quebrar o sigilo de mensagens do aplicativo para ajudar na investigação da Polícia Federal sobre o tráfico de drogas na cidade sergipana. Para quem não lembra, este é o mesmo juiz que determinou a prisão do vice-presidente do Facebook no Brasil, Diego Dzodan, no início de março. 

Trata-se do mesmo processo. Depois da prisão, inclusive, o WhatsApp adotou uma nova tecnologia de criptografia para proteger ainda mais o conteúdo das mensagens enviadas pelo aplicativo. Com a criptografia End to end, não há como repassar as informações pedidas pela Justiça, já que as mensagens (de texto ou voz) são embaralhadas (e indecifráveis) ao sair do telefone da pessoa que as envia e só são decodificadas no telefone de quem as recebe. E assim que isso acontece, as mesmas são apagadas dos servidores. Uma forma de proteção e privacidade para todos os usuários e, em contrapartida, a construção de um ambiente seguro para a comunicação em todas as finalidades. De um grupo de amigos discutindo futebol à organização de um atentado terrorista. Até que ponto o aplicativo tem responsabilidade pelo conteúdo? Até que ponto é aceitável a perda da ampla privacidade? Esta é uma outra (e longa) discussão. 

Aqui cabe analisar a desproporcionalidade e desfunção da decisão em curso. Será que o mesmo juiz teria determinado a suspensão de todas as linhas telefônicas fixas do país caso a operadora se negasse a atender a um determinação judicial? O telefone é historicamente considerado um serviço básico e juiz algum suspenderia o uso em todo o território nacional. Seria uma violação sem precedentes. O detalhe, no entanto, é que hoje existem apenas 43 milhões de linhas fixas no Brasil. E, na nova realidade social, o WhatsApp tornou-se uma forma de comunicação mais popular entre os brasileiros que o antigo telefone fixo. Para muitos, inclusive, tornou-se o principal meio de comunicação e até mesmo uma ferramenta de trabalho. É fundamental que não apenas a Justiça, como todas as instituições do país, não subestimem o WhatsApp e as novas tecnologias de comunicação como algo de menor relevância. Não são. Para o bem ou para o mal.


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