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Editorial: As mulheres e a medicina

Publicado em: 28/02/2016 11:46 Atualizado em:

Na linha de frente do combate aos problemas causados pelo mosquito Aedes aegypti, médicos pernambucanos se destacam na pesquisa e também pelo atendimento imediato às vítimas da dengue, do zika vírus e da chikungunya, com o surgimento de casos correlacionados de microcefalia e da síndrome de Guillain-Barré. Elogio neste sentido foi feito em público pela diretora-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Margareth Chan, em visita ao Instituto Materno Infantil de Pernambuco (Imip), na última quarta-feira. Chan estava companhada pela diretora da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), Carissa Etienne. As duas falaram para muitas profissionais de saúde como elas, colegas de jaleco e de sonhos que, no Brasil, devem muito a uma pioneira.

No dia 18 de abril deste ano serão completados 70 anos da morte de Maria Augusta Generoso Estrella, a primeira médica brasileira. Aos 22 anos de idade, a filha de portugueses regressava ao Brasil em 1882 como uma pioneira. Era oficialmente a primeira médica do Império, com diploma do New York Medical College and Hospital for Women, nos Estados Unidos, uma vez que no país as mulheres não tinham ainda esta oportunidade.

Seu retorno foi anunciado no Diario de Pernambuco do dia 5 de março daquele ano. O jornal reproduziu, por sua vez, texto de O Paiz, do Rio de Janeiro, então capital do Império, onde um parágrafo destacava que “tendo a mulher por missão especial os labores do lar doméstico, não impede essa missão que ela cultive as letras e as sciencias”.

A façanha de Maria Augusta – escolhida como oradora da turma e agraciada com medalha de ouro – tornou-a uma estrela na Corte. Cinco anos antes, em 1877, quando conseguiu ser admitida na faculdade em Nova York mesmo tendo a idade abaixo do exigido, ela conseguiu um inédito apoio financeiro determinado por D. Pedro II, que considerou-a “Bolsista do Império”.

Na volta ao Rio de Janeiro, a agora médica foi recebida oficialmente no palácio. Seu exemplo e as notícias do seu sucesso nos Estados Unidos contribuíram para que as brasileiras pudessem finalmente ter acesso às faculdades de medicina, através da Reforma Leoncio de Carvalho, a partir de 1879.

Em Pernambuco, a primeira admissão de mulheres na área médica se deu em 1840, quando o então governador Francisco do Rego Barros (posteriormente Conde da Boa Vista), criou uma Cadeira de Arte Obstétrica, privativa para elas. Na verdade, tratava-se de disciplinar o exercício profissional das parteiras, passando a se exigir o registro.

A Faculdade de Medicina de Pernambuco, que funcionou inicialmente no Derby, formou 31 turmas, o equivalente a 2.704 profissionais, no período de 21 de abril de 1927, quando foi inaugurada, até 19 de janeiro de 1958, quando foi transferida para o campus da Universidade Federal de Pernambuco. Neste 31 anos, apenas 295 dos novos profissionais eram do sexo feminino.

Atualmente, as mulheres são maioria nas turmas que formam novos médicos em instituições públicas e privadas. Uma vitória para a sociedade, que se reflete em situações onde o exercício da medicina ganha mais visibilidade, como nos dias de hoje.

Integrante da Academia de Medicina de São Paulo, patrona da cadeira 64, Maria Augusta Generoso Estrella clinicou até o fim da vida, aos 86 anos. Uma vocação que começou bem cedo, por ocasião da colisão entre dois navios. Uma história de vida para não ser esquecida. Na verdade, lembrada quando Chan, Etienne e sobrenomes brasileiros (e pernambucanos) são citados nas páginas de jornais pelo seu trabalho em salvar vidas. Como aqui e agora, neste Diario de 190 anos.

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