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Opinião: Novo abolicionismo, velho desafio
(...) continuam presentes em nosso cenário social os mesmos elementos que caracterizavam as relações entre senhores e escravos, tais como o latifúndio, as situações autoritárias de poder, a desigualdade social, regional e racial
Publicado: 19/11/2015 às 07:20
Por Tiago Muniz Cavalcanti
Procurador do Trabalho
Joaquim Nabuco definia o abolicionismo como um movimento político que almejava “reconstruir o Brasil sobre o trabalho livre e a união das raças na liberdade”. Para o notável pernambucano, a verdadeira alforria exigia não apenas a emancipação jurídica da escravidão, mas sobretudo a implementação de reformas sociais que viabilizassem a verdadeira reconstrução do país.
Como sabemos, o primeiro objetivo foi alcançado no dia 13 de maio de 1988, com a assinatura da Lei Áurea. O segundo, no entanto, não foi atingido: continuam presentes em nosso cenário social os mesmos elementos que caracterizavam as relações entre senhores e escravos, tais como o latifúndio, as situações autoritárias de poder, a desigualdade social, regional e racial. E é aqui que repousam as pretensões do novo abolicionismo: promover as mudanças sociais esquecidas no final do século XIX, transformando o País numa nação livre de injustiças sociais e revertendo o triste legado de séculos de opressão e impunidade.
Esse velho desafio exige o enfrentamento da escravidão contemporânea tanto no aspecto preventivo quanto no repressivo, o que invariavelmente encontra idêntica resistência de outrora: o reacionarismo dos escravagistas, detentores do poder econômico que possuem enorme capacidade de mobilização política e inegável influência sobre a opinião pública. Não são poucos os exemplos recentes dessa resistência patronal, e o mais grave, sem dúvidas, é a tentativa de desconstrução do conceito legal de trabalho escravo, condicionando sua ocorrência à restrição da liberdade de ir e vir, ou seja, ao cárcere privado. A intenção é muito clara: chamar de escravo apenas quem esteja acorrentado, não importando as condições subumanas das vítimas, exploradas de sol a sol e que habitam com animais, com eles compartilhando bebida e comida.
Não à toa, o relator do projeto de lei 432/2013, que visa ao referido retrocesso, é um estreito aliado da bancada ruralista no Congresso Nacional, o senador Romero Jucá, desvelando os interesses conservadores acaçapados. Esse ataque ao arcabouço normativo que protege o trabalhador e confere o sustentáculo do novo abolicionismo merece a atenção da sociedade. Por isso, todos os atores públicos e privados comprometidos com suas causas estão alertas e assim permanecerão.
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