Diario de Pernambuco
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A custo de quê?

Maria Paula Cruz
Gestora Escolar do Colégio Madre de Deus

Publicado em: 08/04/2024 03:00 Atualizado em: 05/04/2024 22:38

Hora do almoço dos finais de semana, restaurantes pela cidade cheios, mesas e mais mesas repletas de famílias. Pais, mães, filhos e parentes se misturam de maneira dinâmica. Que excelente atividade para a socialização e o estreitamento de laços familiares, não? O grande problema me parece ser, ao chegar mais perto desses núcleos, a falta de palavras, olhares e toques. Em muitas mesas, as conversas são trocas de memes, compartilhamentos por mensagens entre adultos e adolescentes, e crianças fixadas em telas, seja de celulares ou tablets, sem qualquer envolvimento com o que está ao seu redor.

Não posso negar que, de fato, celulares hoje em dia parecem uma extensão dos nossos corpos e que, muitas vezes, involuntariamente, olhamos para suas telas. E como não olhar, se esse tipo de dispositivo, suas notificações e programações foram feitos para nos deixar conectados? Como não avaliar também a dificuldade de tantas famílias realizarem atividades corriqueiras enquanto cuidam de suas crianças?

Pergunto-me, todavia, em que ponto perdemos a mão. Em que momento passamos a normalizar a falta de interação de uma família em uma mesa, em função de aparelhos tecnológicos? Em que momento passamos a achar normal crianças na frente de tablets sem receberem outros estímulos? Desde quando realmente achamos que o ser e estar digital é o normal aceitável?

Em uma geração de pais que muitas vezes pensam que tudo pode ser atingido e conquistado pelo digital, é esquecido, e muitas vezes não se sabe, da importância dos estímulos na primeira infância. Estímulos esses mais diversos, de linguagem, motores, lógicos, emocionais etc. Ao mesmo tempo em que um adulto consegue, em pouco tempo, dominar as ferramentas de uma rede social, uma criança exposta a telas no lugar de estímulos perde oportunidades preciosas de desenvolvimento, que não voltarão da mesma forma. Não é à toa que nas escolas recebemos mais e mais alunos com atrasos no desenvolvimento da linguagem e da comunicação, no desenvolvimento de habilidades físicas, com obesidade infantil, com problemas de sono e diversos problemas mentais, cada vez mais cedo.

O custo de crianças em silêncio e com bom comportamento durante o uso desses dispositivos passa a atingir diretamente seu desenvolvimento, oportunidades e futuro, trazendo consequências a curto, médio e longo prazo. Como Aristóteles diria, ‘o sábio duvida e o sensato reflete’. Então, será que não nos vale a pena desacelerar e pensar, de maneira crítica e embasada, se esse é realmente o custo que queremos arcar?”

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