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Possibilidades tributárias no pós Covid-19

Diógenes Teófilo
Advogado tributarista e professor. Mestre e doutorando (PUC/SP)

Publicado em: 27/04/2020 03:00 Atualizado em: 27/04/2020 07:07

Superada a primeira quinzena, desde o início do isolamento social recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), com que se pretende evitar a propagação do coronavírus, que provoca a doença Covid-19, é iniciada a fase de discussões acerca das relações entre a tributação e a denominada “pós-Covid-19”. Para tanto, é necessário considerar: o quando, o onde e o como.

O primeiro parâmetro pode ser colhido a partir da experiência chinesa, onde se deu o primeiro foco de disseminação do vírus. Decorreram 76 dias.

O isolamento social, no Brasil iniciou nos Estados entre 15 e 27 de março. Em Pernambuco, o regime foi iniciado em 18 de março. Os dados se referem às datas dos decretos estaduais que disciplinam a quarentena, já que não existe uma medida nacional que assim disponha.

É possível estimar uma data para interrupção do regime de quarentena: 11 de junho de 2020. Com essa hipótese, não se pretende prever o futuro, afinal, o comportamento de cada um é importante para contribuir com a redução ou aumento do prazo.

Cumpre ainda considerar que o Brasil tem dimensões continentais e a questão depende também da evolução do caso nos parceiros internacionais. Com isso se afirma que o Brasil não é uma comunidade homogênea e que a realidade nacional é causa e consequência de outros agentes (EUA, China, bloco europeu e Árabe, por exemplo).

O onde é o Brasil, extremamente diverso e amplo social, jurídico e economicamente. Desse intercâmbio, decorrem trocas comerciais ensejadas por interesses diversos: afetivos, empresariais, trabalhistas, acadêmicos e assim por diante. Isso sem ignorar as cinco ordens normativas: nacional, federal, estadual e municipal, como entes políticos; e das pessoas jurídicas.

Como a experiência brasileira tem particularidades, se comparada com outras realidades, deve-se voltar atenções para a chamada “curva” de isolamento social. Ela considera o número dos isolados nos centros urbanos e nas comunidades rurais. Esse dado deve ser comparado a uma segunda “curva”, a dos infectados e de mortes em face do tempo.

As autoridades sanitárias têm recomendado um índice de isolamento social de aproximadamente 70% da população. Desse percentual, são excluídos os trabalhadores que atuam nas chamadas atividades essenciais. Elas são informadas por decretos produzidos pelos entes políticos. Em regra, referem-se a abastecimento de alimentos, remédios, infraestrutura logística e outras atividades que as viabilizem.

O modo de traspassar a crise, já adentrando ao como, deve considerar desde as medidas decorrentes da capacidade de autogestão das famílias e empresas até a intervenção do Estado.

A autogestão é sinônimo de “cultura de poupança”. Isto é, economizar uma parte dos ganhos para ter dinheiro suficiente a fim custear as despesas fixas durante determinado período no futuro. Regra geral, de três a quatro meses.

Se, entretanto, os ganhos cessam, precisa-se de crédito, que será prestado por bancos, cooperativas de crédito e pelo Estado. Ao lado dessas medidas, constam as renegociações dos débitos e da moratória, também chamada de prorrogação das datas dos vencimentos.

Essa prorrogação tem sido aplicada no âmbito dos débitos de prestações continuadas, como é o caso dos impostos, aluguéis, energia elétrica, assim por diante. Por último, verifica-se o socorro público, mediante a transferência direta de renda em favor dos grupos sociais mais vulneráveis à crise.

Então quais as perspectivas tributárias para o fim das medidas de isolamento social?

A tributação acompanha os fatos de riqueza praticados pelos agentes econômicos. Reduzindo a riqueza, também será reduzida a tributação. Reduzindo a tributação, de menos recursos disporá a Administração Pública para custear salários de trabalhadores da saúde, medicamentos e demais insumos, cuja demanda aumenta neste momento e tende a manter-se no pós-Covid-19.

Como a tributação nacional é baseada no consumo (mercadorias, industrialização e serviços), as medidas de isolamento repercutiram imediatamente na capacidade de produção de receita tributária. Daí, decorrem as sugestões de extinção dos fundos públicos e de gastos do dinheiro público “poupado” pelo Estado, normalmente utilizados promoção do socorro e assistência social.

Os fundos têm receitas dedicadas a finalidades específicas. O gasto social, por seu turno, está submetido aos rígidos parâmetros jurídicos, constantes na Lei de Responsabilidade Fiscal. Nesse momento, há que pensar pragmático: recuperar, reduzir e promover.

Recuperar valores pagos a maior, a título de tributos, a partir de auditoria. Por meio do planejamento tributário, reduzir gastos não essenciais com o objetivo de compor reservas para suportar uma eventual prorrogação da quarentena e custear gastos urgentes. Promover novo design operacional e jurídico das atividades. O contexto cobra adaptação e flexibilidade.

No Pós-Covid-19, não se conta com o aumento de tributos, que já são insuportáveis. A capacidade de pagamento do brasileiro, com a crise, foi reduzida.

Parcelamentos tributários, com ou sem redução de encargos (Refis) são esperados. Resultados de julgamentos no Supremo Tribunal Federal interessam aos contribuintes. Não há ambiente para reforma tributária, que tende a sair de pauta por um tempo. Contratos de trabalho com redução de encargos marcam a tendência.

Tributação mais eficiente das economias digital e colaborativa pode ser um importante caminho no pós-Covid-19, no Brasil, que ocupa o nono lugar no ranking internacional. Elas despontaram durante o isolamento social e se alojaram na cultura das famílias e empresas, irreversivelmente.

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