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Disputa política aumenta pressão para eleições antecipadas na Itália

Publicado em: 19/08/2019 09:50

Matteo Salvini, ministro do Interior e vice-premiê. Foto: Eliano Imperato/AFP
Depois de apenas 14 meses desde a formação do atual governo, a Itália pode estar às portas de uma eleição legislativa antecipada ou de um impasse político mais prolongado — ambas as possibilidades resultantes da fragmentação partidária, que dificulta a composição de maioria no parlamento. Amanhã, o ministro do Interior e vice-premiê, Matteo Salvini, considerado o homem forte da atual coalizão, deve submeter um voto de desconfiança ao gabinete de coalizão do premiê Giuseppe Conte — um independente.

Salvini, líder da Liga, de ultradireita, alega divergências com o parceiro, o Movimento Cinco Estrelas (M5S), legenda de protesto criada pelo comediante Beppe Grillo, que tem como líder parlamentar o também vice-premiê Luigi di Maio, titular da pasta do Desenvolvimento Econômico. À parte as diferenças reais, o chefe da Liga faz uma aposta pelo poder. Se o M5S elegeu a maior bancada em 2018, a ultradireita venceu as eleições europeias de maio e hoje lidera as pesquisas de opinião, com cerca de um terço das intenções de voto.

“Por que, então, não se demite?”, questionou uma terceira parte interessada na crise. O ex-premiê Matteo Renzi, do Partido Democrático (PD, centro-esquerda), joga com a possibilidade de unir-se a Di Maio no apoio a uma nova maioria, ou a um governo “técnico” que evite a convocação imediata de eleições. Atento à disputa cada vez mais ácida entre os (ainda) parceiros de coalizão, bem como ao desconforto do premiê, Renzi reviu o veto assumido no ano passado e iniciou contatos com o M5S.

Embora Salvini tenha invocado inicialmente o veto ao projeto de uma autoestrada, a colisão frontal com Conte se deu em torno da imigração. O ministro do Interior desautorizou o premiê e vetou o acesso a um porto da Sicília de um navio da ONG espanhola Open Arms com 140 estrangeiros. Conte, que havia negociado com parceiros europeus, recorreu a uma carta aberta para condenar a “deslealdade” do vice-premiê — “pela enésima vez, o que não posso aceitar”. Também criticou, com ironia, a “obsessão de reduzir o tema da imigração à fórmula dos ‘portos fechados’”.

O líder da Liga não economizou veneno na resposta, também pública, à “cartinha” do premiê, e começou por desafiar “o gentil presidente do Conselho (de Ministros)” a “dizer cara a cara” o que tinha escrito. “Os italianos me pagam não para fazer o papel da boa alma, mas para defender as fronteiras e garantir a segurança — essa é a minha obsessão”, prosseguiu Salvini.

No sábado, ele autorizou o desembarque de 27 menores de idade a bordo do navio humanitário, mas o possível recuo não parecia ter qualquer efeito possível na crise de gabinete. Luigi di Maio, o líder do M5S, já em tratativas com Matteo Renzi para um possível acordo com o PD, considerou tardios os acenos a uma recomposição. “Agora, ele já quebrou os ovos. Cada um é artífice do próprio destino. Boa sorte”, afirmou.

Múltipla escolha
O líder direitista joga com a carta das eleições animado pelas férias de verão passadas na Sicília, onde foi assediado na praia para selfies com um público que deu vitória estrondosa para a Liga nas eleições europeias — justamente pelo impacto sofrido na ilha com o desembarque de milhares de imigrantes. Mas a convocação antecipada dos italianos às urnas é apenas uma das opções para o presidente Sergio Mattarella, a quem o parlamentarismo italiano dá a primazia para resolver a crise.

O próprio premiê pode se antecipar ao voto de desconfiança e apresentar a demissão. Nesse caso, o chefe de Estado tem autoridade para convidá-lo a tentar recompor a maioria. Ainda que Conte seja derrubado, Mattarella assume as rédeas da situação. Antes de tomar uma decisão, tem a prerrogativa de consultar os líderes partidários para sondar as possibilidades de o parlamento eleger um novo gabinete. É um processo que pode se estender por algumas semanas.

O atual parlamento foi eleito com a expectativa de elaborar e aprovar uma reforma do sistema político-eleitoral capaz de sanar a instabilidade crônica no país. Em nome de cumprir essa missão, ou ao menos de garantir o orçamento para o próximo ano fiscal, o presidente pode ainda recorrer à formação de um governo “técnico” encarregado de conduzir o processo até 2022. Apenas se nenhuma outra solução se mostrar viável restará ao chefe de Estado a saída de manter Conte à frente de um gabinete demissionário para tocar os assuntos cotidianos até uma nova eleição, mais provavelmente no fim de outubro.
 
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