alemanha Uma quase eleita e um azarão As eleições legislativas da Alemanha que caminham, neste domingo, para uma nova vitória de Angela Merkel trazem também um lado incomum e bastante curioso

Por: AFP - Agence France-Presse

Publicado em: 24/09/2017 13:26 Atualizado em: 24/09/2017 14:16

Filha de um pastor protestante, a chefe do governo alemão, a conservadora Angela Merkel, chegou ao poder em 2005, contra todos os prognósticos, e agora está perto de conquistar um quarto mandato. A chanceler, que tentará neste domingo uma nova vitória nas eleições legislativas, conheceu três presidentes norte-americanos, quatro franceses e três primeiros-ministros britânicos, e parece não sofrer o desgaste do poder.

Nascida e formada na ex-Alemanha Oriental, a líder conservadora é, às vezes, chamada “a chanceler de ferro”, por sua defesa ferrenha das políticas de austeridade. Mas os alemães também a chamam de Mutti (mamãe), por inspirar uma grande segurança em meio à turbulência europeia. Ela não tem rivais em seu país, porque, como afirmava o filósofo Peter Sloterdijk em 2015, encarna como ninguém “o desejo ardente de normalidade” dos alemães, consequência de uma história convulsionada e de um olhar circunspecto do mundo.

A placidez da líder, que manteve o sobrenome de seu primeiro marido, é apenas uma aparência. Com as sucessivas crises europeias, adquiriu no exterior uma imagem de carrasca dos países endividados, antes de ser apresentada como a “líder do mundo livre” após a eleição de Donald Trump. Até agora, Merkel não conseguiu mudar as decisões do magnata norte-americano em questões fundamentais.

Eleita durante seis anos consecutivos pela revista Forbes como a mulher mais poderosa do mundo, seu lugar na história ainda é incerto. Merkel herdou em grande medida a prosperidade econômica impulsionada pelas reformas impopulares do chanceler social-democrata Gerhard Schröder, mas seus próprios esforços para preparar o futuro são questionáveis. Além de decidir fechar as centrais nucleares de seu país após a catástrofe de Fukushima em 2011, uma medida para satisfazer a opinião pública, a crise migratória foi o principal acontecimento de seus três mandatos e, talvez, o único grande risco que assumiu.

Em setembro de 2015, Merkel decidiu abrir seu país a 900.000 demandantes de asilo. A decisão a fez perder popularidade e ajudou no avanço dos populistas. A chanceler soube reagir, porém, adotando uma série de medidas e negociando um acordo com a Turquia para reduzir de forma considerável a chegada de refugiados à Europa. Com exceção da crise migratória, Merkel sempre soube impor seu estilo atípico, que mescla um profundo conhecimento das relações de poder com um enorme pragmatismo - o que suscita críticas por sua suposta falta de convicções - e uma retórica muito sóbria.
O social-democrata Martin Schulz espera frustrar todas as previsões para as eleições (JOHN MACDOUGALL/AFP)
O social-democrata Martin Schulz espera frustrar todas as previsões para as eleições
Patinadora
Merkel teve uma infância austera na República Democrática Alemã (RDA), onde seu pai se instalou com a família para contribuir para a evangelização do Estado comunista. Aluna aplicada, aprendeu a língua russa na escola e, anos depois, obteve doutorado em física. Quando menina, Angela Dorotea Kasner — a primeira mulher a governar a Alemanha e a primeira desde Margaret Thatcher a comandar um grande país europeu - sonhava um dia se tornar patinadora artística.

Amante da ópera, do vinho tinto francês e das caminhadas nas montanhas italianas, Merkel, que faz as compras por conta própria em um supermercado barato, proclama que seu modelo é a dona de casa alemã, símbolo da austeridade e do autocontrole. E seu marido, o professor de Química Joachim Sauer, com quem Merkel se casou em 1998, é tão tímido que não compareceu à cerimônia de posse da chanceler, em 2005.Seu biógrafo, Gerd Langguth, ressalta que Merkel, apesar de estar sempre sob os holofotes, permanece um enigma. “É uma esfinge” por se manter discreta”, escreveu.  Angela Merkel esperou a queda do Muro de Berlim, no final de 1989, para entrar na política - primeiro como porta-voz do último governo da RDA e, depois, como membro da conservadora União Democrática Cristã (CDU).

Schulz
O social-democrata Martin Schulz espera frustrar todas as previsões para as eleições. Quando foi designado candidato do Partido Social-Democrata em janeiro, a vitória parecia possível.. Meses depois, o trem parece ter ficado sem combustível. Uma pesquisa recente mostra 25% de apoio a Schulz, contra 51% de preferência para Merkel.

DEU O QUE FALAR
Limitar o preço da cerveja, fazer renascer o nudismo, ou defender a sopa de batata. As eleições legislativas alemãs também têm seu lado insólito.

Merkel, batatas e o cosmos
Oito anos depois de revelar ao mundo que um de seus pratos favoritos era sopa de batata, a chanceler Merkel - muito reservada sobre sua vida privada - acaba de revelar sua receita. “Sempre esmago as batatas com um amassador, nunca com um espremedor de batatas, assim, sempre ficam alguns pedaços inteiros”, contou à revista Bunte aquela que muitos consideram a mulher mais poderosa da Europa. Durante uma coletiva de imprensa com crianças, a chanceler revelou alguns elementos insuspeitos de sua personalidade. 

Limitar o preço da cerveja
Die PARTEI (O Partido, em alemão), formação criada em 2004 por iniciativa da revista satírica alemã Titanic, quer frear a inflação do preço da cerveja. Também exige que os tribunais alemães julguem os russos “responsáveis por tudo”, aqueles que “não pagam aluguel” e os “atrasos dos trens”. Em 2014, este partido conseguiu eleger seu fundador, Martin Sonneborn, ao Parlamento Europeu com slogans como “Merkel é boba”, “Merkel é gorda”, ou ainda “Não à Europa, Sim à Europa”.

Sem camisa e também sem calça
Gregor Gysi, um dos líderes da esquerda radical na Alemanha, lamenta que a prática do nudismo esteja em baixa e, como parte de sua campanha, promove o encorajamento desse estilo de vida. “É uma pena que o naturismo perca gradualmente o terreno, já que o #FKK (termo alemão para o nudismo) era uma prática que tinha um toque de classe, e não era realmente erótica”, disse no Twitter. Perguntado se ele próprio ousaria tomar sol nu, Gregor Gysi, saiu pela tangente e desconversou: “Há limites para tudo”.

Hip-hop no Bundestag
Fundado este ano, em Berlim, o partido Die Urbanen (Os Urbanos) tem como objetivo levar a cultura do hip-hop ao Bundestag, alegando que se trata de um “movimento emancipatório global”. Seus princípios são: participação, realização pessoal, competência criativa e crítica ao poder, que devem servir para resolver conflitos políticos de forma “coletiva e não violenta”. O partido espera alcançar, pelo hip-hop, a justiça e a igualdade plena no país.

Regime para emagrecer
O líder dos liberais do FDP, o carismático Christian Lindner, de 38 anos, aparece nos cartazes de campanha de seu partido com uma barba de três dias e um olhar penetrante. Mas antes de se gabar de seu físico, Lindner foi um adolescente obeso, como confessou ao jornal Bild: “Aos 14 anos pesava quase 100 quilos, e tinha 10 centímetros a menos (de altura) do que agora”. Depois de um regime draconiano e de muita corrida, afirmou ter perdido 30 quilos. “Agora, com 1,86 metro, peso 80 quilos”. Nas redes sociais, não faltaram piadas sobre o líder do FDP.