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O bem-vindo fim de uma era

Entre novas demandas sociais e com imagem fragilizada por escândalos, Victoria%u2019s Secret cancela tradicional desfile e abre espaço a novos referenciais de beleza

Publicado em: 30/11/2019 09:00

Desfile da Victoria%u2019s Secret é considerado um dos mais populares nos últimos 20 anos (Angela Weiss / AFP)
Desfile da Victoria%u2019s Secret é considerado um dos mais populares nos últimos 20 anos (Angela Weiss / AFP)

O fim de uma era se confirmou na moda com o cancelamento do tradicional desfile da Victoria’s Secret, um dos mais populares nos últimos 20 anos. As demandas sociais por maior diversidade nas passarelas, fortalecidas por pautas em favor da desconstrução de padrões, além do envolvimento da marca no escândalo #MeToo, teriam acelerado o desgaste do evento – fragilizado, ainda, pela situação econômica da empresa. A decisão de descontinuar a performance, anunciada na última semana pela L Brans, responsável pela Victoria’s Secret, estava em debate há meses, em função da queda progressiva de audiência em torno das chamadas Angels (como são chamadas as modelos da grife): unânimes nos anos 1990, elas atraíram a atenção de nove milhões de telespectadores americanos em 2014 e engajaram somente 3,3 milhões em 2018. Nos últimos anos, o público exigia um reposicionamento da marca a partir de mudanças em seu casting – o que jamais chegou a ocorrer. Significativo, o cancelamento da apresentação de nova coleção do selo sublinha uma revolução em curso no mundo da moda.

“Estamos vivendo um momento importantíssimo. É o momento de ver beleza em quem somos, sem padrões. Vejo essa decisão como um resguardo da Victoria’s Secret. Eles investem milhões de dólares nesse desfile. Querem vender, não querem levantar polêmica. Estão se resguardando. E, no futuro, o evento pode até voltar a acontecer. Remodelado. Ou não. Porque, diante de uma moda mais democrática, cada marca pode optar por se dedicar a determinado nicho. E tudo bem. Mas vão precisar se posicionar quanto a isso”, avalia a pernambucana Danielle Steffanello, consultora de imagem e estilo. Para ela, a busca por conforto e diversidade na moda é um movimento definitivo. No ano passado, a Victoria’s Secret, expoente do padrão de magreza que dominou as últimas décadas, sinalizava uma tentativa de acompanhar as mudanças: levou às passarelas um casting mais cosmopolita, mas deu alguns passos atrás quando seu diretor de marketing, Ed Razek, declarou estar descartada a possibilidade de integrar modelos transgênero ou mulheres “curvilíneas” ao time. Razek chegou, inclusive, a se desculpar publicamente por suas declarações, orientadas na contramão das demandas das ruas.

“Vamos nos comunicar com nossos clientes, mas nada similar ao desfile em magnitude”, disse o diretor financeiro, Stuart Burgdoerfer, que anunciou o cancelamento da tradicional apresentação de coleção. Em teleconferência entre dirigentes da casa L Brands e analistas financeiros sobre os maus resultados trimestrais da marca, foi confirmado que a Victoria’s Secret não consegue se recuperar, apesar de várias mudanças em sua direção. De acordo com a empresa, as vendas superaram o 1,1 bilhão de dólares no terceiro trimestre de 2019, uma baixa de 7% em relação ao mesmo período de 2018. E, somente neste ano, cerca de trinta lojas da marca fecharam as portas. Nos últimos meses, como agravante, a marca foi associada ao escândalo do investidor nova-iorquino Jeffrey Epstein, que morreu na prisão após ser acusado de agredir sexualmente menores de idade durante anos. Epstein foi amigo e funcionário de Leslie Wexner, chefe da L Brands, embora Wexner assegure ter rompido relações com ele há mais de dez anos. A associação de defesa de modelos Model Alliance, que comemorou no Twitter o cancelamento do desfile, destacou que mais de cem modelos assinaram uma carta pedindo à Victoria’s Secret que adotasse seu programa Respect, que busca garantir condições de trabalho igualitárias e prevenir agressões sexuais.

O desgaste do selo, antes responsável por levar nomes como Gisele Bündchen e Naomi Campbell às suas passarelas, abre caminho para outras marcas de moda e beleza – mais atuais e democráticas. “Muitas marcas vêm buscando se adaptar e ampliar a grade de numerações, movidas também por uma crise comercial, ampliando as possibilidades de produtos e, consequentemente, aumentando seu público. Recentemente, conheci em Nova York uma marca de sutiãs com 76 formatos diferentes. É fantástico, mas oneroso também. Até que ponto uma marca assim consegue se manter? Por isso, os nichos não deixarão de existir. Com esse movimento, a própria Victoria’s Secret pode estar querendo dizer: já que estamos falando em democratização, por que não posso escolher meu nicho e vestir modelos de determinado manequim?”, diz Danielle Steffanello. “A moda atende a mais pessoas.É um movimento sem volta”.

Poderosa

Savage x Fenty, nova estrela da lingerie

Enquanto isso, a nova estrela do mundo da lingerie é a cantora Rihanna, com sua marca Savage x Fenty. Sua proposta é exatamente a contrária da Victoria’s Secret: a diversidade é sua prioridade e, nelas, as mulheres parecem dominar seu corpo e seus desejos, assumindo suas formas sem se preocupar com os olhares masculinos. Hoje, as estrelas preferem ir aos desfiles de Rihanna e é usando Savage que desfilam as modelos mais famosas, como Gigi e Bella Hadid ou Cara Delevingne, que participaram em seu desfile em Nova York em setembro. “Foi a primeira vez que me senti realmente sexy numa passarela”, disse recentemente Bella Hadid à revista Elle. “Nunca tinha me sentido tão poderosa”. (AFP)
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