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Pernambucano

Estilista de Santa Cruz do Capibaribe se destaca no cenário nacional

Jorge Feitosa quebra as barreiras do preconceito e mostra que não há limites para uma moda masculina conceitual e futurista

Publicado em: 08/01/2018 12:00 | Atualizado em: 08/01/2018 08:01

A coleção Sulanca desmistifica que roupa de feira é de má qualidade. Foto: Marialu Bezerra/Divulgação

Natural da cidade de Santa Cruz do Capibaribe, no Agreste pernambucano, Jorge Feitosa, 38 anos, cresceu no maior polo de confecções do estado. Na infância, os brinquedos misturavam-se aos retalhos que caiam no chão, enquanto sua mãe costurava peças que seriam vendidas na Feira da Sulanca. Aos seis anos, as agulhas e linhas passaram a ser uma nova distração. Saquinhos para colocar o carvão que iria na caçamba de seu pequeno caminhão e roupas para as bonecas de sua irmã iam sendo produzidos pela criança, que até então, sonhava em levar alegria para as pessoas como  palhaço.

Mesmo vivendo numa família e localidade onde a confecção era a principal fonte de renda, Jorge passou pelo “típico” preconceito do menino que costura e que se interessa por roupas diferentes. “Eu escutei muito: ‘não pode! Isso é coisa de menina!’. Eu costurava escondido da minha mãe, pois ela não gostava. Mas com o passar do tempo, essa proibição foi perdendo o sentido, porque eu mostrava habilidade nessa área. Além disso, eu comecei a atuar profissionalmente na moda com mais de 20 anos. Nessa época, eu já estava casado e independente. Não houve mais pressão ou não dei ouvidos para isso”, relembra.

Antes de se debruçar em sua carreira no mundo fashion, o pernambucano se aventurou numa outra paixão, a de ensinar. Em 1996, cursou o magistério e fez Licenciatura Plena em História na Faculdade de Formação de Professores de Belo Jardim (FABEJA). Mas foi em 2005, que o universo de Jorge Feitosa se abriu para novas possibilidades, após mudar-se para São Paulo e fazer a qualificação em Vitrinismo no Senai. Desde então, ele não parou mais. Cursou o técnico em vestuário e uma pós-graduação em Design de Moda, além de tantas outras qualificações que o ajudaram a focar em seu dom de criar.

“Fui para a capital paulista em 2006, a convite de Tony Barros, da marca de moda masculina, By Mee. Até netão, eu não havia pensado na possibilidade de sair de Santa Cruz, principalmente por conta do meu trabalho. Eu estava me estabelecendo como estilista da Rota do Mar.  Mas vi essa proposta, como uma possibilidade de experimentar e aprender coisas novas. Tudo isso despertou a vontade de começar minha própria marca”, conta.

Um ano após se jogar nessa nova estrada, Jorge se viu desempregado e sem perspectiva de conseguir um outro trabalho. Foi numa conversa com João Lourenço Filho, que o fashion designer resolveu unir forças com o amigo e eles criaram o selo Homens Trabalhando. Jorge passou a desenvolver peças e expor na feira “Como Assim?!”, que é realizada aos domingos, no Shopping Center 3, na Avenida Paulista.

“Investimos nisso até 2013. Nos primeiros seis meses, mal vedemos seis produtos. Foi muito difícil. Mas ao mesmo tempo, tive a ajuda de verdadeiros anjos, que me emprestaram suas máquinas de costura e espaços de trabalho para que eu pudesse produzir o que tentava vender. Costurava muito de madrugada, pois geralmente era o horário que as máquinas estavam disponíveis. Tenho esse primeiro momento, como um verdadeiro laboratório. Percebi que gostavam do meu desenho e das formas, mas não gostavam das cores que eu utilizava, achavam tudo muito colorido. Também observei que o meu público não era jovem, como eu havia pensado. O meu produto atraía mais os caras de 40 anos. Aos poucos fui entendendo meu público e adequando o que eu gostava de fazer ao que as pessoas queriam consumir”, revela.

Mesmo sem obter um bom retorno financeiro, o santa-cruzense investiu em seus primeiros equipamentos de trabalho.   “A partir daí, tudo começou a fluir. Eu trabalhava em uma empresa de moda feminina durante o dia, fazia um curso a noite e costurava minhas peças na madrugada. Minha meta era ter um modelo novo todo final de semana no nosso estande. Em 2009, passei a me dedicar apenas à nossa produção e em 2010 comecei a usar meu nome como marca. Aprendi durante esse período, que experiência não é tempo corrido, é tempo trabalhado”, crava.

O estilista pernambucano trabalhou como assistente do mineiro Ronaldo Fraga em uma das edições do Senai Brasil Fashion. Foto: Arquivo Pessoal
Atualmente, Jorge serve de inspiração para estilistas de sua cidade e de várias outras localidades do país. O pernambucano ganhou notoriedade no cenário nacional após participar das edições de 2014, 2015 e 2016 do projeto Senai Brasil Fashion, transmitido no canal fechado, Lifetime. Em uma das oportunidades o fashion disigner foi assistente do estilista mineiro Ronaldo Fraga. “Poder estar perto de profissionais como Alexandre Herchcovitch, Lino Villaventura e Ronaldo Fraga foi uma oportunidade sem igual. Além disso, pude aprender com três estilistas que possuem olhares e concepções totalmente diferentes. Não há dinheiro no mundo que pague essa experiência”, revela.

No ano passado, Feitosa participou da primeira temporada do programa do GNT, Caixa de Costura, onde saiu como vencedor do episódio que tinha as rendas como tema. Em outubro, o pernambucano voltou para sua terra natal para participar do Estilo Moda Pernambuco, que em sua segunda edição, mostrou que está se firmando como a semana de moda do Agreste. Na oportunidade, Jorge apresentou na passarela dois desfiles conceituais Sulanca e o Caso da Torres, que fez o público ficar de pé para aplaudi-lo.

Jorge Feitosa irá abrir seu ateliê ao público a partir do próximo dia 20. Foto: Lud Lower/Divulgação

Com suas modelagens amplas e cortes abstratos, Jorge Feitosa imprime em suas peças traços de ficção científica, o que nos leva a ano-luz na moda. No entanto, as roupas não são apenas para a passarela. Elas podem ir perfeitamente para à rua. “Vejo o que produzo, como peças que não necessariamente, estão ligadas a uma tendência da estação. Gosto de pensar que são peças atemporais, roupas que não tenham prazo de validade, que possam ser usadas quando e como quiserem. Já em relação a parte técnica, costumo trabalhar com recortes, ou estampas, mistura de texturas, e mesmo que nos acabamentos internos, um toque de cor sempre aparece, seja em um forro de bolso, cós, viés, pesponto, ou em qualquer outro lugar. O que eu desenvolvo é casual, roupa do dia a dia, pois entendo que uma roupa é para ser usada. Ela não tem sentido num cabide”, descreve.

Para sua grife, o estilista investe em roupas masculinas e esporadicamente desenvolve  peças femininas sob encomenda. “Minha mãe, fazia questão de me vestir de calça social cinza e camisa polo. Isso era uma tortura. Por volta dos dez anos, passei a fazer algumas peças de roupas para mim, aprendi a costurar e copiar moldes com a minha tia Graça Dunda. Acho que querer fazer roupas para mim, influenciou de alguma forma o meu gosto pela moda masculina. Agora percebo que a influência da minha mãe, Dona Helena, foi mais forte e saudável que isso, pois ela sempre trabalhou produzindo produtos para esse segmento. E basicamente, meu trabalho é fundamentado nessa história. Sou louco por moda masculina! Lembro muito bem da minha mãe, me colocando ao lado dela e mostrando como ela fazia cada parte de sua produção, desde cortar o tecido, estampar as peças com silk screen, costurar, dar acabamento, até ir para feira”, detalha.

No próximo dia 20, o fashion designer irá fazer o abre do Fabrico Jorge Feitosa. O nome do espaço refere-se às pequenas fábricas de Santa Cruz. O ateliê ficará localizado na Rua Diamente Preto, 292 D, na capital de São Paulo. No mês de maio, o pernambucano lançará sua nova coleção. “O tema desse novo projeto está ligado com a questão do uso e do desperdício da matéria prima consumida pelas indústrias do setor de moda e vestuário”, finaliza.

Fast fashion com Jorge Feitosa
-Moda para você é? Uma possibilidade de mudança, de sair da inércia.
-Um lugar? O backstage de um desfile de moda.  
-Um livro? O que pretendo escrever.
-Um filme? A viagem (Cloud Atlas).
-Um ícone da moda? Ronaldo Fraga.
-Família? É quem cuida da gente e também deixa ser cuidado.
-Um sonho? Viajar para o Japão.
-Uma frase? Caso, hoje não consiga chegar ao topo, caminhe até a borda.
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