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Crise na Argentina deve repercutir pouco na economia brasileira

Publicado em: 14/08/2019 07:36

Reprodução/Pixabay

O agravamento da crise na Argentina prejudica o comércio exterior brasileiro, afinal, o país vizinho é o terceiro maior comprador de produtos nacionais. Mas a nação já enfrenta uma longa crise e vem reduzindo as importações das mercadorias no mundo e também do Brasil. Tanto é que a participação argentina encolheu 40% nas exportações nacionais no acumulado de janeiro a julho, em comparação com o mesmo período do ano passado. Para economistas, a piora do cenário gera incertezas e ruídos, mas a expectativa é de que o efeito na economia seja pequeno.


Pelos dados do Ministério da Economia, o Brasil exportou quase US$ 130 bilhões em produtos nos primeiros sete meses do ano, sendo que apenas US$ 5,98 bilhões foram para a Argentina. A participação do país tombou de 7,32% para 4,6% no total de mercadorias comercializadas pelas empresas brasileiras, entre janeiro e julho de 2019.

 

O economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), afirmou que, por hora, o que mais impacta é a volatilidade cambial, que prejudica o comércio exterior. Para ele, as políticas econômicas do presidente da Argentina, Mauricio Macri, não vinham dando sinais favoráveis. “O mercado financeiro fica sempre tenso, porque não é a vitória do candidato preferido, mas o mais importante é ver a relação entre os países. Se houver uma postura pragmática de negociação e de manutenção de relações, a priori não teremos um agravamento da situação”, destacou.

 

A economista Lia Valls Pereira, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), encara esse sobe e desce recente dos mercados “pura especulação” em relação à Argentina, porque não há fundamentos sólidos. “As exportações brasileiras já encolheram 40% de janeiro a julho e, portanto, um agravamento da crise Argentina por conta das eleições não vai afetar um quadro que já está ruim”, destacou.  “O comércio está sendo afetado desde o ano passado, mas o cenário é de piora se as diretrizes do novo governo de esquerda repetirem o que aconteceu no passado”, completou.

 

Apesar disso, Cagnin ressaltou que, se os governos dos países optarem por uma política de afastamento, é possível que as duas nações sejam afetadas e disseminem problemas para o Mercosul. “Independentemente da linha política ou ideológica, é importante ter o pé no chão e posição mercadológica para ver o que é bom economicamente”, defendeu o economista.

Preocupação

A equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, está ciente disso. Com a recuperação econômica ocorrendo de maneira fraca, com o risco do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil ficar negativo novamente no segundo trimestre, a área econômica não quer criar entraves adicionais para o crescimento da atividade. Falta, porém, acertar com o presidente da República, Jair Bolsonaro, que é crítico da ex-presidente da Argentina e candidata a vice-Presidência na chapa favorita, que divide com Alberto Fernández.

 

O chefe do Executivo brasileiro já disse que, caso isso ocorra, será uma relação “conflituosa”. Welber Barral, ex-secretário de comércio exterior e sócio da Barral M Jorge, explica que a Argentina será o país mais afetado com uma possível barreira comercial. “A crise na Argentina não nasceu com o Macri, que fez algumas reformas macroeconômicas importantes, mas não foi ajudado pelo cenário internacional. Agora, a volta do governo de oposição não ajuda, porque, historicamente, são mais intervencionistas, protecionistas e populistas. Isso acaba gerando os problemas que geraram a crise no país”, afirmou.

 

Outra preocupação com uma possível vitória da esquerda argentina, segundo especialistas, são as negociações do acordo do Mercosul com a União Europeia, assinado no fim de julho, que ainda precisa ser ratificado pelos parlamentos e implementado gradualmente. “Os esquerdistas são tradicionalmente mais protecionistas”, afirmou Lia Valls, do Ibre. Ela, no entanto, ameniza o prejuízo, pois a liberdade proposta no acordo é relativa. “Sabemos que o acordo que foi firmado não é essencialmente de livre comércio, mas de comércio administrado, com preservação de vários interesses de ambos os lados”, disse.

 

Analistas do mercado financeiro torcem para que a “lógica dos negócios” fale mais alto do que os atritos políticos para que, tanto a Argentina quanto o Brasil não se prejudiquem ainda mais. A nação vizinha compra produtos de alto valor agregado do país. Dos US$ 5,98 bilhões exportados pelo Brasil, 22% são automóveis para passageiro; 7%, peças para veículos e tratores; e 5%, demais produtos manufaturados.

Castello Branco explica vendas na Petrobras

Em audiência na Comissão de Infraestrutura do Senado, o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, negou nesta terça-feira (13/8) que a venda de ativos da companhia seja um desmonte. Ele explicou que a estatal está focada nas atividades de exploração e produção de petróleo do pré-sal, que garantem retorno de 10% ao ano, enquanto nos segmentos de refinarias, gasodutos e distribuição de combustíveis, os percentuais ficam em torno de 5%. Os desinvestimentos, segundo ele, são para reduzir o endividamento de US$ 101 bilhões, o dobro do que a média das petroleiras concorrentes. “Pagamos US$ 7 bilhões por ano de juros, 35% de tudo o que a empresa produz. Só  com a geração orgânica de caixa não é possível reduzir a dívida”, justificou.


Sem influenciar na taxa de juros

O grande temor em relação à crise da Argentina foi a desvalorização do real ante o dólar. A moeda norte-americana chegou a ser cotada acima de R$ 4 e ainda caminha em patamares próximos da barreira psicológica. Do ponto de vista de política monetária, economistas ressaltam que há ruídos momentâneos nos ativos financeiros, mas que não devem influenciar na definição dos juros brasileiros.

 

Usado para controlar a inflação, a taxa Selic poderia ser afetada com a alta do dólar. O economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Rosa, ressaltou, porém, que o câmbio deve se acomodar e não deve impactar as estimativas para o índice de preços. “Não vejo o Banco Central se preocupar muito com isso, porque essa tensão não deve se traduzir em pressão inflacionária, já que esse efeito é limitado numa economia que se recupera de forma muito lenta”, afirmou.

 

Além disso, o especialista destacou que, apesar de a crise na Argentina ter afetado o risco Brasil, o país tem fundamentos melhores, como inflação e juros baixos, além de balança de pagamentos externos equilibrada. “O impacto na economia brasileira é de curtíssimo prazo. No câmbio, por exemplo, foi relativamente suave. As exportações nacionais já estão caindo de maneira acentuada, principalmente a de automóveis”, disse o economista Mauro Rochlin, professor dos MBAs da Fundação Getulio Vargas (FGV). “No ano passado, mesmo com a disparada do dólar no Brasil, o Copom manteve inalterada a Selic”, lembrou.

 

O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, avalia que o BC deve continuar reduzindo os juros, porque a atividade econômica está fraca. “As projeções para o crescimento do PIB neste ano estão um pouco piores do que do ano passado. Está todo mundo achando que a economia não vai andar e, por isso, o que vai pesar na decisão do Copom para manter os cortes será a atividade”, destacou.

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