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"O modelo escolar que vigora não privilegia a criatividade", diz Murilo Gun

Publicado em: 05/05/2019 11:00 | Atualizado em: 05/05/2019 09:07

Foto: Murilo Gun/Divulgacao (Foto: Murilo Gun/Divulgacao)
Foto: Murilo Gun/Divulgacao (Foto: Murilo Gun/Divulgacao)
Aos 14 anos ele criou um site que o deixou milionário. Isso em uma época que a internet ainda era discada. “Eu ganhei prêmio, fui ao Jô Soares e meu site era um dos mais acessados da internet naquele momento. Eu peguei essa oportunidade, que me colocou na crista da onda, e criei uma empresa desenvolvedora de sites, a partir de investidores com interesse em apostar seus recursos em projetos com potencial multimilionário”. É assim que o empreendedor e palestrante Murilo Gun relata o início de sua carreira. Do site, surgiu uma empresa, o Peça Comida (uma espécie de iFood para os dias atuais), que não funcionou enquanto negócio, mas que garantiu um aporte de 1 milhão de dólares para a empresa. Desde então, entre erros e acertos, ele se tornou um case de sucesso passando, inclusive, pela Universidade do Google, conquistando uma importante certificação do trabalho. Em recente passagem pela capital pernambucana, onde participou de uma palestra na Federação das Indústrias de Pernambuco (Fiepe), Gun conversou com exclusividade com o Diario de Pernambuco, onde falou um pouco sobre educação e empreendedorismo.

Como alinhar o conhecimento adquirido na Universidade do Google à sua principal característica que é o humor?
Foram mais de 10 anos trabalhando com internet. Na colação de grau na Universidade de Pernambuco (UPE), ao qual eu cursei administração, eu fiz um discurso engraçado e, nessa mesma época, estava surgindo o stand-up comedy no Brasil. Assim como tive um bom time no começo da internet e um time ruim com relação ao Peça Comida, eu tive, de novo, um time bom com relação ao stand-up comedy e me aproximei dessa profissão, que chegou a durar quase 10 anos também de estrada. Até que eu vim me interessar por essa escola, em que as pessoas chamavam de Universidade do Google, porque, inicialmente, era bancada pela multinacional. Podemos dizer que é uma escola do futuro e eu fiquei interessado naquilo e resolvi tentar uma vaga lá, que eram apenas 80 vagas ao ano. Eu submeti meu portfólio de comediante, que tinha uma história empreendedora, e, na busca pela diversidade, eles me selecionaram. Posso dizer que foi o divisor de águas da minha carreira porque eu percebi que o humor não era o produto final, mas a forma de pensar de maneira criativa. É tanto que eu voltei de lá com a validação de que o pensamento do comediante é o grande exemplo do pensamento criativo, e isso não deve ser uma atribuição dada apenas aos artistas. Foi quando eu senti a necessidade de deixar a comédia para focar na educação.

Quais dicas para os empreendedores se manterem criativos?
Na verdade, a dica para que todos os seres humanos se mantenham criativos é não permitir a passividade, agir e observar as oportunidades, tomando a iniciativa, sendo imaginativo e não se limitando ao jeito que sempre foi. Não é simplesmente mostrar uma ideia ao chefe, e ele não aceitar, e ficar por isso mesmo. É saber/entender se a ideia foi vendida ou meramente apresentada. O empreendedor tem que ter planejamento em relação às pessoas e aos projetos, e seduzir as pessoas com relação as suas ideias. Eu brinco que a maior dica para se manter criativo é fazer o meu curso online ‘Reaprendizagem Criativa’, mas é verdade. É um curso bem desenhado, testado, com mais de dez mil alunos inscritos, e que busca resgatar a criatividade. Outra dica é ativar o interesse por assuntos dos mais diversos temas, porque toda solução criativa vem de uma combinação de referenciais que você compila no seu banco de dados mental. Nada vem no nada, e isso tem a ver com o não se limitar. Mesmo que seja de forma genérica ou superficial, é buscar o conhecimento da maneira mais genuína, no seu dia a dia, na relação com as pessoas.  Isso é aprendizagem.

Quando esse modelo educacional que você combate foi implementado no país e qual foi o objetivo?
É importante deixar claro que a educação não é somente escola, ele nasce na família. O sistema educacional é complexo, difícil de mudar, é semelhante às grandes organizações – que exigem uma administração eficiente e atenta aos resultados. Portanto, quando se fala em mudanças em sistemas complexos, é preciso ter cautela e análise porque é mais difícil do que se imagina. Já a educação familiar, é mais simples. Por isso que, nos meus trabalhos, a minha busca tem sido pelo viés mais parental. Os pais acham que estão biologicamente prontos para educar, mas não estão preparados para mudar a sua visão de mundo e acompanhar a evolução dos temas e debates. O modelo escolar do passado, que vigora até hoje e que não privilegia a criatividade e sim a decoreba (sic), virou os padrões das famílias. E é isso que proponho nessa reflexão.

Na sua visão, qual o desafio da educação no país?
O grande desafio da educação no Brasil é que os adultos do presente têm que aprender as coisas do futuro para as crianças. Não adianta querer transformar o outro sem nos despertar da consciência de que nós precisamos aprender também. A curiosidade, a imaginação e a coragem são os três pilares que considero essenciais para mudar a educação.

E qual o desafio de empreender?
É verdade que existem algumas especificidades, que todo mundo sabe, como as questões tributárias, a dificuldade para o financiamento, entre outros. O que todos não sabem – e isso não é só no Brasil – é que o empreender deve partir de você e não do campo externo, em que se limitou a criar apenas soluções para resolver os problemas da humanidade. Essa etapa é importante, mas, e se começamos a responder quem nós somos e quais potencias temos para entregar ao planeta? Uma vez que identifico isso, olho para o mundo e vejo do que ele está mais carente; e é nesse momento que eu observo bem onde eu quero empreender. 

Como monetizar um negócio como este que você apostou?
Essa questão do dinheiro, da monetização, é interessante. No entanto, existe um fenômeno que é mágico de quando a gente se conecta com as pessoas que estão na mesma vibração que a nossa, na mesma frequência, e se predispõem a investir nas nossas ideias. Tem muita gente no Brasil com o capital, querendo fazer coisas diferentes, mas tem uma coisa que costumo dizer que é: os projetos têm que ter o tinder de querer encontrar as pessoas e o match para oportunizar os valores. A gente tem a oportunidade de empreender com poucos recursos, e, como recomendação a essa nova era, vale a pena a leitura do livro A Startup enxuta, que ensina justamente formas de inovações compactas e bem sucedidas.
Em seus vídeos você fala muito em ruptura de um modelo educacional vigente que molda as crianças e inibe seus talentos criativos. Como quebrar esse sistema?
A mudança do sistema educacional é uma mudança que tem que ocorrer do Ministério da Educação, das secretarias estaduais e do professor. Com criatividade, o professor pode fazer muita coisa, sem precisar dizer que as políticas de governo são impeditivas. Se cada um transformar sua realidade pequena em grandes mudanças, e, nesse processo, se as famílias contribuírem, poderemos ter rupturas interessantes no futuro breve.  Eu tenho um curso chamado CriCriCri (Criando Crianças Criativas) ao qual eu direciono os pais e as mães a aprenderem mais sobre a missão de cada um, afinal gerar filhos não é só colocar no mundo, é se responsabilizar pela maneira como as crianças estão sendo educadas. Teoricamente, eu costumo dizer que todo adulto deveria se capacitar para ser pai e mãe, pelo menos, o mesmo tempo em que precisou para se dedicar a sua profissão.

Essa geração está perdida?
Se acharmos que essa geração está perdida, o mundo estará perdido também. Não gosto de pensar assim. Para que esses pensamentos não acabem virando realidade, acho mais interessante acreditarmos na evolução da nossa espécie e discutirmos projetos que embasem e ajudem o futuro das crianças, e o presente dos seus pais ou responsáveis.

O que você pode deixar como mensagem para quem quer, de fato, mudar de vida?
Uma mensagem simples que eu diria para quem quer mudar de vida é: comece a mudar as conversas com as pessoas. Reflita sobre como mudar, pelo menos, 50% dos conteúdos das conversas, falar a respeito das próprias vulnerabilidades e sobre o que você acha do mundo. Posso confessar que não há melhor forma de autoconhecimento, capaz até de provocar mudanças significativas de hábitos e rentáveis para o nosso novo estilo de vida.
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