Entrevista

"O Sebrae passa por uma transformação", diz diretor superintendente do Sebrae/PE

Na visão do diretor-superintendente da instituição no estado, Oswaldo Ramos, os microempresários precisam olhar a tecnologia como aliada

Publicado em: 03/06/2018 14:00

Foto: Sebrae/PE/Divulgacao (Foto: Sebrae/PE/Divulgacao)
Foto: Sebrae/PE/Divulgacao (Foto: Sebrae/PE/Divulgacao)
O mundo vem passando por uma acelerada revolução tecnológica. As ferramentas e os conceitos de modelo de negócios estão em constante mutação e ignorá-los pode ser o primeiro passo para fracassar. O Sebrae/PE encarou o desafio e, em vez de nadar contra a maré, decidiu que teria de ser uma mola propulsora para os empreendedores pernambucanos. Na visão do diretor-superintendente da instituição no estado, Oswaldo Ramos, os microempresários precisam olhar a tecnologia como aliada. O órgão promete fazer sua parte, investindo em capacitação.  “Estamos em processo de licitação para construir o nosso centro de educação já com esse novo formato de atendimento ao cliente e debates. Não serão mais cadeiras, deve ser mesa onde possa ter grupos. Essa transformação é de R$ 1,2 milhão. Esperamos entregar este ano”, comenta.

Modelo de negócio
Estamos mudando a forma dos cursos oferecidos no Sebrae. A demanda por presencial já não é tão grande. Quando lançamos uma programação mais convergente com essa dinâmica digital, a gente consegue um público mais interessante. Hoje, o hábito de consumo dos nossos clientes tem mudado em função do acesso às novas tecnologias. Isso é em qualquer setor. As pesquisas são feitas pelo equipamento, não na loja. Na loja, ele vai experimentar e vivenciar essa nova realidade. Isso está acontecendo no mundo todo, inclusive na micro e pequena empresa. A MPE está sendo impactada ainda com a necessidade de rever suas tecnologias, suas estratégias e abordagem ao mercado. As empresas migram do e-commerce para redes sociais porque no e-commerce tradicional eu só dialogo com os clientes cadastrados. A sua estratégia de divulgação é limitada. Se você fica de fora dessa dinâmica, ou desse novo hábito de consumo, você se distancia cada vez mais dos clientes. Isso acontece também no Sebrae. Percebemos que cada vez mais nós aumentamos o esforço de captação, de promoção, divulgação e mobilização do público-alvo com essas metodologias. As pessoas querem coisas novas, que não tenham acesso na internet. Exemplo: nossos cursos são 75% exposição teórica. Esse não é mais o formato. Tem que ser o inverso. Tem que ser mais prático e a parte teórica tem que ser mais remota. O que eles vêm buscar no Sebrae é principalmente estabelecer redes de contato, trocar experiência, é o networking. Então, além de nacionalmente estamos criando uma plataforma robusta que vai sustentar todas as operações, estamos revendo todas as metodologias de cursos, de palestras, seminários, consultorias. Essa transição vem desde o ano passado. É uma transformação digital do sistema. Entregaremos até o final do ano. Comandado pelo Porto Digital. Pelo menos cinco ou seis soluções robustas vão dar esse atendimento remoto aos clientes.

Interiorização
O interior passa por momento de transformação muito grande. A chegada das universidades para o interior é uma mudança radical porque é muito conhecimento circulando. Pessoas que inclusive vêm de fora. Aumenta o nível cultural e de escolaridade do território. O que precisa ser feito são estratégias de retenção desse pessoal para não vir para o litoral. Que seja usado o esforço da academia para dar suporte ao desenvolvimento daquela economia. O aeroporto é outro equipamento importante. Serra Talhada, por exemplo, tem um polo médico grande e, com a chegada do aeroporto, vai dar vida a uma região que de certa forma era vazia. Salgueiro teve o impulso, mas parou com a transnordestina. Araripina tem o gesso. Com certeza, nós temos muito potencial.

Forma de consumo
O ato de consumo mudou muito. Na minha geração os jovens queriam gastar. Hoje, não. As pessoas estão revendo, discutindo, pesquisando antes de adquirir. Isso impacta diretamente nos negócios. O polo de confecções do estado precisa trazer essa discussão de tecnologia para a região porque em três ou quatro anos dificilmente uma pessoa vai lá presencialmente comprar. Eles já sentem isso. As empresas estão se especializando na área de serviços. Elas estão se organizando, inclusive, com sistemas de startup. As pessoas acham que fizeram por 50 anos da mesma forma e vão permanecer, mas não vão.   

SerTão criativo
Convênio com AD Diper trabalhando a preparação das pessoas artistas, empreendedores de Serra Talhada para que eles se tornem empreendedores. Criamos o projeto no ano passado e fizemos, recentemente, um grande evento lá e parece que conseguimos sensibilizar as pessoas. Eles precisam de um incentivo. Fazer rodada de negócios, incentivar o networking. Estamos organizando um evento aqui no Recife.

Tecnologia
Para a micro e pequena empresa, a  tecnologia ainda não é aliada devido à falta do hábito de consumo. O uso das tecnologias ainda é muito baixo na microempresa. Ainda não usa na gestão. Uma das soluções tecnológicas que o Sebrae está lançando é um aplicativo que vai ajudar essas empresas a tomarem decisão. É uma plataforma que vai não só receber os dados da empresa, como também ter uma base de informação, de dados que vai ajudar ao gestor, empresário a tomar as decisões, calculando os caminhos críticos, as variáveis que têm que ser observadas e comparando o desempenho com o mercado. Então, isso pode dar um norte. Tudo automatizado. Eles usam algumas tecnologias, têm alguma experiência, mas não na gestão. O Sebrae usa muito estratégia de indicadores de desempenho, ajudamos muito as empresas a entender esses indicadores para tomar as decisões em função disso. É isso que falta ser incorporado.

Mortalidade
Ainda é alta entre as MPEs, mas já foi bem mais. Está entre 40% e 50% nos dois primeiros anos, mas já foi de 80%. Eu acredito que a causa é a motivação de abrir o negócio. Em alguns casos é por vocação, e aí as chances de dar certo são bem maiores, e outra é por necessidade. Quando se tem momento crítico como esse da nossa economia, com milhões de desempregados, elas têm que sobreviver. Então, buscam alguma atividade, muitas vezes sem planejamento, sem vocação, sem estudo... Isso não tem sustentabilidade. Pernambuco é um caso muito específico. Estamos com economia, como se esperava, crescendo acima da média do Brasil, mas, por outro lado, tem o maior índice de desemprego do país. O que justifica isso é que temos uma economia dinâmica. Temos uma base tecnológica das indústrias que permite, mesmo não impactando nos empregos, aumentar a produção, o PIB, o desempenho econômico do estado. Isso tem que ser articulado. Saímos de uma história de plantação de cana, com baixa escolaridade, para uma indústria tecnológica avançada. A MPE ainda é um grande fator de desenvolvimento social.

Crescimento
No ano passado, a micro e pequena empresa fechou o estoque de empregos (diferença entre gerados e demissões) em 58 mil. A grande e média empresa fechou no negativo. Então, é um grande instrumento de emprego, renda e desenvolvimento local.  São três fatores que precisam de muita atenção, mas não é suficiente para absorver todo mundo. Existe necessidade de investimento. O acesso aos financiamentos ainda é baixo, apesar de já ter outras opções no mercado que vão além do banco.

Fintechs
É um projeto que estamos pensando. Até julho, pegaremos parte de recursos que estavam sendo operados pelos bancos, que é um recurso destinado a aportar aval aos empréstimos, e vai investir nessas fintechs. Isso é um diferencial: ter uma conta sem nenhum custo. Os bancos também terão que fazer essa revolução, senão terão que ser perder.

Crise
O comércio em si foi muito impactadado com a crise. O que aconteceu em Pernambuco é que a crise coincidiu com a conclusão de obras que empregavam muita gente. Suape mesmo parou as construções e pessoas não migraram para outras atividades produtivas. Então, o poder de compra dessas famílias caiu muito e isso impacta diretamente o comércio. O nosso comércio ainda sofre. Por isso que Pernambuco ainda não tem o emprego estabilizado. Em março fechamos com -919 empregos na micro e pequena empresa. Na grande, -2.811. Isso tem variado mês a mês. No ano, temos três meses no negativo na MPE e na grande empresa temos oito meses no negativo. Eu acredito que temos um perfil de capacidade das empresas diferenciada.  Temos uma capacidade de sair da crise mais rápido do que os demais estados. Dá para ser otimista, mas precisamos fazer o dever de casa. A necessidade do perfil do trabalhador para atender as empresas modernas não é o que tínhamos. Precisa de mais capacitação, especialização. Investimento forte em educação. Estamos nesse dilema, nesse desafio.

Franquias
Esse ano, teremos a Feira do Empreendedor no Recife, onde vamos trazer as oportunidades de negócios. Decidimos focar muito nas franquias. Hoje tem microfranquias e é algo que tem uma experiência interessante porque não exige experiência do empreendedor. O que vemos como franquia é que ela também passa pelo processo de transformação porque antes era um modelo muito associado a shoppings. Então, infraestrutura tem que ser outra dinâmica. Terão que mudar. Antes, franquia era competência de gestão e a marca. Franquia é algo bom, com cliente cativo, marca forte e com essa questão da microfranquia é uma transformação interessante, porque atua em mercados mais periféricos.

Empreendedorismo
A novidade do empreender passa pela tecnologia. Antigamente, a empresa passava dois, três anos fazendo o planejamento. Hoje o modelo não é esse. As startups fazem e entregam. Esse modelo de pensar e atuar empresarialmente é o que vai influenciar as empresas do futuro. As empresas têm que ter esse pensamento. Antigamente, os empresários eram referência. Hoje, tem que ser estrategista, um gerenciador de equipe. Tem que agir muito mais rápido. Não tem a história de só lançar quando tiver perfeito. Lança o que é possível e vai agregando valor. É preciso sair do modelo analógico para o digital.

MEI
O Microempreendedor Individual (MEI) já é 66% das MPEs do estado. O que precisamos entender é se o crescimento foi muito em função do desemprego ou se foi um movimento de formalização do empreendedorismo. Observamos movimentação de microempresas se transformando para MEI e muita gente que entra como MEI e continua pagando previdência social, em uma opção de necessidade de empreender. São esse números que precisamos nos aprofundar e acompanhar o crescimento do modelo. 
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