Observatório econômico

Incentivos ou desincentivos fiscais?

Publicado em: 22/01/2018 08:00 | Atualizado em: 23/01/2018 16:18

Por Fernando Dias (*)

Fernando Dias é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
A década de 1950 é emblemática para o Nordeste porque foi nesta época que as duas maiores instituições de fomento da Região surgiram, o Banco do Nordeste em 1952 e a SUDENE em 1959. Embora as razões originais para a criação de ambas não sejam necessariamente as mesmas, ambas convergiram ao longo dos anos para direcionar a política de desenvolvimento do Nordeste. Esta política se norteou inicialmente pelo pensamento de Celso Furtado e pelas indicações do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), e hoje segue linhas não tão distintas do objetivo inicial.


E por que criar tais instituições? Porque o Nordeste era uma Região extremamente pobre, de base econômica agrícola voltada para produtos primários de exportação e muito sujeita aos efeitos sazonais das secas. A medida que o Brasil se industrializava nos anos 1940 e 1950 o Nordeste ficava para trás e, como bem observa Furtado, “as estimativas de renda, referentes a 1948 e 1956 [...] indicam [...] que a participação do Nordeste se reduziu [...] de 15,5% para 13,4% da renda total do país.  Nessa conformidade, a renda per capita do nordestino que, em 1948, alcançava 37,3 % da do habitante do Centro-Sul, descera a 32%, em 1956 ”.

Em resposta este drama social que se formava o governo federal bancou uma ampla análise da economia Nordestina através do GTDN e isto culminou com a SUDENE, que coordena uma ampla rede de incentivos voltados a industrialização da economia da Região. Em paralelo, o BNB opera linhas de crédito favorecidas para investimentos que completam a teia de incentivos federais que, em tese, reorientariam a trajetória de crescimento Nordestina no longo prazo. E isto faz quase 60 anos.

Funcionou? É uma resposta controversa. Por um lado, é visível que o mix da economia nordestina foi bastante expandido, com a industrialização da economia ocorrendo de fato mesmo que ainda concentrada nas faixas metropolitanas. Por outro lado, não só ainda somos a Região mais pobre como as disparidades encontradas por Furtado na década de 1950 essencialmente permanecem as mesmas ainda hoje. Em outras palavras, apesar de termos crescido e nos industrializado a convergência da renda com o Centro-Sul não andou um passo ao longo de seis décadas.

Uma possível razão é a forma como se propôs industrializar o Nordeste, via incentivo fiscal e financiamento subsidiado. Do ponto de vista do industrial o que se percebe é que as vantagens locacionais do Centro-Sul (infraestrutura, qualificação, etc.) são compensadas por menos impostos e dinheiro barato, e ele então migra. Ocorre que quando o processo começa o local que perde o investimento reage, e também passa a oferecer incentivos outros que compensem os primeiros, e se institui a guerra fiscal. Depois que ela começa a melhor estratégia para todos é oferecer incentivos, que tendem a neutralizar em parte o efeito locacional. É claro que a União é mais forte que os Estados nesta batalha, e empresas vieram para o Nordeste, porém na medida do possível mantiveram estruturas no Centro-Sul para se beneficiar de ambos os lados.

No cenário atual, dado que os aspectos de mercado pouco mudaram a atração do Centro-Sul em relação ao Nordeste para a localização de novos empreendimentos, um bom projeto por aqui é algo em que a prefeitura oferece o terreno e abdica do IPTU, que o governo do Estado abra mão do ICMS, que a SUDENE conceda benefícios para os tributos federais e BNB e/ou BNDES emprestem a taxas favorecidas do investimento inicial ao capital de giro. Quando qualquer elemento desta cadeia é fragilizado a saúde financeira do empreendimento fica comprometida, e isto é inaceitável após seis décadas programas de incentivo. Um leigo pode achar que ao invés de programas de incentivo fiscal o que se fez no Nordeste foram programas de desincentivo a competitividade. Começo a achar que talvez este leigo tenha razão.

(*) Professor do Departamento de Economia da UFPE.
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