Observatório econômico Cortar o inútil

Publicado em: 03/09/2017 08:00 Atualizado em: 01/09/2017 17:34

Por Carlos Magno Lopes (*)

Carlos Magno Lopes é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
Carlos Magno Lopes é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
Muitas pessoas possuem o hábito de acumular em casa bugigangas, que nada mais são do que pequenas inutilidades que algum dia esperam que venham a ter importância crítica para solucionarem problemas. Com o passar do tempo, essas “coisinhas” somadas e cuidadosamente selecionadas, passam a ocupar espaços cada vez maiores, fazendo com que o trajeto do dormitório até a sala exija a habilidade de um alpinista tal o amontoado de cacarecos. A residência transforma-se em um depósito de quinquilharias sem finalidade nem propósitos conhecidos, resultando em verdadeiro estorvo. Governos também gostam de ter suas tralhas, pois acreditam que se fortalecem com elas.

Do ponto de vista teórico, a gestão de empresas estatais pode atingir níveis de competência comparáveis aos de empresas privadas, ainda que tenham objetivos distintos. Na grande maioria das vezes, contudo, não é isso que acontece. Com efeito, é a partir da acentuada diferença entre a cultura e a governança corporativa entre esses tipos de empresas que surgem os descaminhos, sobretudo no tocante ao que se denomina de “accountability” (imputabilidade ou prestação de contas) e ao funcionamento da controladoria. Será que alguém acredita que a Petrobras teria sido saqueada se fosse uma empresa privada? Por que será que a única petroleira que concluiu que Pasadena era um negócio da China foi a Petrobras? Como explicar que a Petrobras tenha acreditado que plantar mamona no Nordeste para produzir biodiesel era a descoberta mais inteligente do mundo? O que dizer do endividamento da Petrobras? Nenhuma das grandes petroleiras do mundo erraria tanto em tão pouco tempo, à exceção, claro, da bolivariana PDVESA. A fragilidade de empresas estatais emerge com mais clareza quando governos se apropriam de ativos do Estado para implantarem seus projetos de poder, sempre com o apoio do corporativismo de seus burocratas, que demagogicamente alegam defenderem os interesses do povo, não do conjunto de seus acionistas, a quem devem satisfações. O Estado, que as controlam, deveria ser o mais exigente quanto aos resultados que apresentam, mas, costumeiramente, é o mais relapso. Tudo isso sem avaliar se as atividades que exercem exigem, de fato, a presença do Estado.

É importante lembrar que o setor privado nacional e internacional, há tempo, demonstra interesse em investir pesadamente em infraestrutura no Brasil, o que não se concretizou devido à falta de disposição de sucessivos governos ou devido à ausência de marco legal que garanta a segurança jurídica dos negócios. Nesse contexto é que deveria ser interpretada a decisão de privatizar a Eletrobras, bem como a concessão de rodovias e aeroportos ora em andamento. A mensagem do leitor com tendências literárias para o Estado é: “Inutilia truncat (corte o inútil). Assim, caberia ao Estado se especializar na solução de problemas na educação, saúde, meio ambiente e segurança pública, dentre outros, que não poucos, e demandam urgentes e eficientes ações.

(*) Professor do Departamento de Economia da UFPE.

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