Programa Sem dinheiro, governo atrasa pagamentos e segura reajustes Aumento do Bolsa Família foi suspenso e muitos pagamentos devem ficar para o ano que vem

Por: Rosana Hessel - Correio Braziliense

Por: Hamilton Ferrari - Correio Braziliense

Publicado em: 06/07/2017 08:42 Atualizado em:

Gil Castello Branco: despesas obrigatórias crescem e receitas diminuem. Foto: Contas Abertas/Divulgação
Gil Castello Branco: despesas obrigatórias crescem e receitas diminuem. Foto: Contas Abertas/Divulgação


A situação das contas públicas é tão grave que o governo está deixando de honrar despesas com fornecedores de forma generalizada. A falta de dinheiro para a emissão de passaporte pela Polícia Federal e a suspensão de serviços da Polícia Rodoviária Federal (PRF) são apenas a pontinha do iceberg que afetou até o Bolsa Família. O reajuste do programa prometido para este ano, de 4,6%, foi cancelado, e, para piorar, a União adiou repasses a estatais, como Telebras, Serpro e Dataprev.

Com esses desequilíbrios, em meio a um contingenciamento de R$ 40 bilhões, o presidente Michel Temer tenta convencer o mercado de que conseguirá cumprir a meta fiscal deste ano, de rombo de até R$ 139 bilhões, para não cometer o mesmo crime que derrubou a ex-presidente Dilma Rousseff. Especialistas, no entanto, avisam que está cada vez mais difícil que isso ocorra, principalmente, porque o governo já anunciou que deverá cortar a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano, atualmente, em 0,5%. Essa medida implicará queda maior na arrecadação que precisará ser compensada por receitas extraordinárias ou aumento de impostos.

Pelos cálculos do economista Simão David Silber, professor da Universidade de São Paulo (USP), se a redução da expansão do PIB for de 0,5% para 0,3%, haverá um buraco de mais R$ 25 bilhões para não estourar o teto fiscal. “Para conseguir cumprir a meta, o governo vai adiar ao máximo as despesas e deixar um volume considerável de restos a pagar para o ano que vem”, apostou.

“Temer não terá apoio do Congresso para aumentar imposto”, avisou. “A meta está a cada dia mais distante. O problema é que as despesas obrigatórias crescem em ritmo acima da inflação, enquanto a receita diminui. Para cumprir a meta, o governo dependerá de uma enxurrada de receitas extraordinárias que ninguém, em sã consciência, pode garantir que acontecerá”, avisou Gil Castello Branco, fundador e secretário-geral da ONG Contas.

Na contramão dos cortes de gastos, o governo abriu a porteira das emendas impositivas para agradar a base aliada desde maio, quando a crise política se agravou com a delação dos irmãos Batista. Um levantamento feito pela Contas Abertas mostra que o total de emendas liberadas no primeiro semestre foi de R$ 1,5 bilhão, dos quais R$ 1 bilhão desembolsado apenas entre maio e junho. Na semana passada, o governo adiou, por decreto, o pagamento de restos a pagar, de cerca de R$ 3,2 bilhões, e liberou emendas parlamentares. Os órgãos responsáveis não comentaram o cancelamento do reajuste do Bolsa Família.

A diretora-presidente do Serpro, Glória Guimarães, confirmou os atrasos e contou que eles estão atrapalhando o fluxo de caixa da estatal. “Qualquer atraso tem um descasamento, causa um impacto, porque a conta fica apertada para pagar os fornecedores. Apesar disso, a empresa busca novas formas de conseguir quitar as pendências”, disse. A Dataprev e a Telebras não comentaram o assunto até o fechamento desta edição.

Impacto pequeno

Pelas contas de Fernando Montero, economista-chefe da Tullett Prebon Brasil, o cancelamento do reajuste de 4,6% do programa Bolsa Família terá impacto muito pequeno nas despesas do governo, de apenas R$ 800 milhões. “Isso dá ideia de quanto o quadro está apertado”, disse. Para ele, o governo pode até cumprir a meta fiscal, mas o espaço de manobra é muito pequeno. Na opinião de Montero, para isso acontecer, é preciso que as contas melhorem bastante no segundo semestre, se não, em outubro, o deficit acumulado poderá superar R$ 230 bilhões em 12 meses.


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