Devedores Idosos assumem dívidas e aumentam estatísticas de inadimplência A quantidade de homens e mulheres entre 85 e 94 anos é a que mais cresce entre os inadimplentes

Por: Correio Braziliense

Publicado em: 23/07/2017 09:01 Atualizado em:

Assim como na maior parte do país, a economia do Distrito Federal começa a dar sinais de melhora. Em todos os meses do primeiro semestre de 2017, tanto o número de inadimplentes quanto o de dívidas em atraso ficaram abaixo da média nacional. Em junho, as quedas foram, respectivamente, de 3,45% e 6,85% em Brasília, em comparação com o mesmo período do ano passado. Os dados, divulgados pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL-DF), ainda dão destaque a um novo perfil de devedores, com aumento de 8,23%, os idosos de 85 a 94 anos. Tudo porque eles estão, segundo especialistas, assumindo as dívidas dos filhos e dos netos.

No começo deste ano, a empresária Bethania Rios, 61 anos, entrou no cheque especial e teve o nome adicionado ao Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). Ela, que há cinco anos morava sozinha em um apartamento na Asa Norte, abriga a filha e o neto desde dezembro. “Ela perdeu o emprego e não pôde mais pagar o aluguel. Então, pediu para morar comigo”, conta Bethania. A empresária passou a arcar com as dívidas dos familiares e perdeu o controle. “Comecei a pegar dinheiro do banco e a usar o cartão de crédito para arcar com mensalidade da escola e algumas dívidas da minha filha. Quando dei por mim, as prestações estavam fora de controle e o meu nome sujou”, lembra.

O professor Roberto Bocaccio Piscitelli, do Departamento de Ciências Contábeis da Universidade de Brasília (UnB), diz que o caso de Bethania explica o motivo de os brasilienses acima de 40 entrarem na lista de devedores. “Os avôs não costumam dizer não a um filho ou a um neto que pede ajuda financeira. Por terem a vida mais estável, os mais velhos servem de suporte para a família. Eles usam a aposentadoria e pensão para ajudar todos, e, muitas vezes, acabam assumindo dívidas por terem maior facilidade em conseguir empréstimos ou crédito”, explica.

Mais consciência
Enquanto os mais velhos entram na lista de devedores, os jovens fazem o caminho contrário. Em junho, houve uma queda de 31,05% no número de inadimplentes de 18 a 24 anos, em comparação com o mesmo período de 2016. O presidente da CLD-DF, José Carlos Magalhães Pinto, afirma que isso vem de uma maior consciência na hora de comprar. “O jovem de hoje tem objetivos diferentes dos de 10 anos atrás. Eles não estão buscando comprar carros ou apartamentos. Querem uma melhor qualidade de vida, e ter dívidas impossibilita isso. Então, em vez de garantir uma grande dívida com a compra de um automóvel, preferem pagar por um Uber ou um táxi ou mesmo se divertirem em casa”, afirma.

Roberto Bocaccio acredita que pelos bancos estarem mais exigentes, isso impede a população de adquirir novas dívidas. O superintendente da CDL-DF, Antônia Xará, tem opinião semelhante. “É importante frisar que o SPC é um regulador de crédito que visa proteger não só o logista, mas também o consumidor, que fica impedido de ter acesso ao crédito e acaba não adquirindo outras dívidas que teria dificuldade em pagar”, completa.

Acima da média
Enquanto a nível nacional o saque das contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é tida por especialistas como principal estimulante da quitação de dívidas, no DF, a grande empregabilidade em serviços públicos seria responsável pelo crescimento acima da média nacional. “Nas outras unidades da Federação, a iniciativa privada é a que mais emprega, e, quando a crise chega, ela é a primeira a fazer cortes, o que deixa a população com novos desempregados, que, na maioria das vezes, ainda tinham dívidas para pagar. No DF, não. Como temos uma grande quantidade de concursados federais e distritais, a população tem mais estabilidade financeira e faz mais compras a prazo porque sabe que terá condições de pagar depois”, argumenta o presidente do CLD-DF.

A publicitária Marília Matos, 23 anos, pretende sair da lista dos devedores até o fim do ano. Recém-formada, conseguiu um emprego há três meses e usou os primeiros salários principalmente para pagar dívidas. “Quando era estagiária, estourei o meu cartão de crédito e o cheque especial, porque o salário era insuficiente para pagar as minhas contas. Agora, reservo 60% do que recebo para pagar as dívidas, porque quero entrar em 2018 no azul, para investir em uma viagem ”, pondera.

A cinco meses do fim do ano, o professor Roberto Bocaccio afirma que ainda há tempo para quem quer encerrar o 2017 no azul. Priorizar os gastos e conhecer melhor o orçamento seriam os primeiros passos. “Não se trata de abrir mão daquilo que se tem desejo de comprar, mas é necessário ter como prioridade liquidar as dívidas, e só depois comprar”, explica. O especialista em economia doméstica ainda alerta para o não comprometimento de grande parte do salário. “Estudos da Confederação Nacional do Comércio mostram que o brasileiro reserva ao menos 30% do que ganha para pagar prestações. Isso é um erro muito grande, ainda mais porque, em longas prestações, acabamos gastando com juros que economizaríamos comprando à vista”, observa.
 
Novo fôlego ao comércio
Contas de água e de luz estão entre as que o brasiliense está mais deixando de pagar. Em junho, o aumento de dívidas no setor foi de 25,12%, comparado ao ano passado. O comércio vem no sentido contrário, com queda de 10,10% no mesmo período. A informação anima os comerciantes, que esperam um fim de ano positivo.

O presidente da Federação do Comércio (Fecomércio-DF), Adelmir Santana, aponta que, desde as comemorações de Páscoa, o setor apresenta uma pequena melhora. “Nossa expectativa é de crescimento em relação a 2016”, afirma. Sobre a diminuição nas dívidas, Adelmir diz que “o brasiliense pode decidir se compra ou não uma roupa ou sapato e, nos momentos de crise, corta esses gastos, mas existem contas como as de água e luz, que não são adiáveis”.

Em um dos principais centros de compra do DF, o Conjunto Nacional, a melhora no setor é sentida desde o começo do ano. Para o segundo semestre, a expectativa é de boas vendas, principalmente na Black Friday e no Natal. “O FGTS deu uma injeção na economia, as pessoas começaram a quitar as dívidas e liberaram parte do salário para fazer compras. Isso vem trazendo maiores possibilidades de contratação de funcionários, trazendo uma maior rotatividade para a economia”, conta a gerente de marketing do shopping, Cláudia Durães.

Segundo ela, os setores de eletroeletrônicos e de telefonia apresentarem maior crescimento no primeiro semestre. “Estamos otimistas. Não chegamos aos patamares de anos atrás, mas começamos a perceber que o consumidor está mais confiante na hora de comprar”, ressalta.

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