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Observatório econômico Supersalários

Publicado em: 18/12/2016 08:00 Atualizado em: 16/12/2016 20:49

Por Marcelo Eduardo Alves da Silva (*)

Marcelo Eduardo Alves da Silva é professor de Economia da UFPE. Foto: Paulo Paiva/DP
Marcelo Eduardo Alves da Silva é professor de Economia da UFPE. Foto: Paulo Paiva/DP
Em um momento em que o Brasil passa por uma de suas crises mais profundas, temos a oportunidade de discutir privilégios a certas castas do serviço público.


Na última terça, o Senado aprovou um projeto que tenta coibir os chamados “supersalários” no serviço público. Esses são aqueles que ficam acima do teto constitucional de R$ 33.763 por mês, que corresponde ao vencimento de um ministro do STF. Embora a Constituição proíba salários acima do teto, não são poucos os casos de servidores públicos que recebem acima deste. Considerando todos os poderes, de acordo com dados da RAIS para 2015, mais de 13 mil servidores públicos receberam acima do teto. A aprovação de medidas mais restritivas visam coibir a possibilidade de se utilizar “contabilidade criativa” para furar o teto. Não irei discutir as motivações do Senado (se boas ou ruins), o ponto crucial é entender que não há como se justificar moralmente alguém recebendo acima do teto constitucional, fica ainda mais difícil entender como alguém que recebe mais de R$ 30 mil por mês, ainda precise de auxílio moradia, auxílio paletó, auxílio isto ou aquilo. Pode até ser legal, mas, no mínimo, é imoral.

Voltando à lógica econômica, num mundo ideal, quando os trabalhadores são remunerados de acordo com sua produtividade marginal (o quanto cada um é capaz de agregar à produção de bens e serviços), a existência de um setor público que produz bens e serviços não causa necessariamente nenhuma distorção ou no economês “má-alocação de recursos”. Afinal, governos existem para prover bens públicos, mas devem fazê-lo a custos mais baixos do que seriam fornecidos pela iniciativa privada. Há outras funções, é verdade, mas uma delas não é enriquecer servidores públicos.  No entanto, como mostram os dados não é bem assim no mundo real. O fato é que mesmo se desconsiderarmos os casos dos supersalários, alguns segmentos do serviço público recebem salários muito mais altos e possuem privilégios que não existem na iniciativa privada (estabilidade do emprego e regime de aposentadoria diferenciado são apenas dois exemplos). Quais as implicações disto?

A resposta é simples: quando os fatores de produção não são remunerados de acordo com sua produtividade marginal isto gera uma má-alocação de recursos. Jovens talentosos, que seriam ótimos engenheiros, cientistas, professores, etc. decidem “estudar para concurso”. Conversando com jovens, a resposta mais frequente que recebo sobre o que querem ser quando “crescer” é o desejo de entrar na elite da burocracia brasileira.  Talentos são desperdiçados e com isso a economia como  um todo perde potencial de crescimento. Considerando que um dos motores do crescimento econômico é inovação e empreendedorismo, quanto mais de nossos jovens migrarem para os berços do leviatã brasileiro, mais pobres continuaremos sendo.

Acabar com os supersalários no serviço público é uma questão moral de primeira ordem, mas acabar com os diferenciais entre setor público e privado no Brasil é uma questão econômica de primeira ordem. O Senado deu o primeiro passo, creio que a crise fiscal e o “teto dos gastos” nos forçarão a seguir adiante. Nada mais oportuno.

(*) Professor de Economia da UFPE.

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