Observatório econômico PEC do juízo final

Publicado em: 13/10/2016 08:00 Atualizado em: 11/10/2016 21:02

Por Fernando Dias (*)
 

Fernando Dias é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
Fernando Dias é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
Assunto do momento nas rodas e redes sociais a PEC 241 foi aprovada na última segunda-feira por ampla maioria na Câmara dos Deputados e segue para o Senado com todas as condições de ser aprovada sem maiores dificuldades. Oriunda de uma tentativa do atual governo de sinalizar para o mercado a sua disposição em, de fato, levar a frente um ajuste fiscal, algo que todos os governos prometeram desde a Nova República e nenhum fez, a PEC 241 suscita amor e ódio por onde passa e talvez seja hoje mais polêmica que o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff meses atrás.

A PEC, que trata do congelamento do gasto público pelos próximos em 20 anos, vem sendo tratada como sendo a salvação nacional ou o dispositivo que nos levará ao fim do Brasil e a destruição de nossa sociedade. Descartando os exageros sem sentido, mesmo porque uma PEC não vai resolver o Brasil nem muito menos afundá-lo, cabe comentar alguns pontos relevantes acerca da tese mais destrutiva que advoga o armageddon dos serviços públicos no Brasil. Inicialmente temos que a PEC não reduz, a priori, nenhum gasto, ela apenas limita o crescimento dos mesmos à variação da inflação (congela em termos reais). Tendo isto em mente, temos que, como a União hoje já gasta muito mais que arrecada, ela pode continuar a fazer isto ainda por um bom tempo com esta PEC.

Mas qual a vantagem da PEC então? Como se espera que o Brasil volte a crescer deveremos ter ao longo dos próximos anos crescimento real da arrecadação, assim a receita real futura cresce e o gasto real futuro permanece o mesmo. E faz o quê com o que sobra? Paga as dívidas que foram contraídas, e ao fazer isso a parcela do orçamento que iria pagar juros cai e com isso sobra recurso para ser redistribuído para outras áreas, inclusive saúde, educação e investimentos. E por que não fazer isto negociando o orçamento anualmente? Poderia ser feito assim, porém a sinalização dada nas últimas décadas é que a União não faz assim, economistas renomados da esquerda insistem em dizer que não precisa fazer assim, e há grande força política em se dizer que não vai se fazer assim. A retomada do investimento privado necessita de alguma sinalização mais forte, e a PEC do gasto foi uma maneira de fazer isso.

E o que o investimento privado tem a ver com esta história? Ao longo das últimas décadas, o Estado brasileiro vem dando mostras cada vez mais claras que é insustentável um modelo de crescimento onde apenas ele investe e/ou orienta o investimento. Isto vem sendo tentado desde os anos de 1950 e, destarte os resultados positivos colhidos, ainda somos subdesenvolvidos e ainda estamos há quilômetros do nível de renda das nações de referência. Como qualquer país do mundo precisamos do investimento privado, principalmente no momento atual. Mas então por que do IPEA à PGR, passando por vários especialistas, vem sendo divulgado que a PEC fulminará a educação e a saúde nos próximos anos?

Isto não é necessariamente verdade, é mais uma possibilidade remota. A grande questão, e que afeta não somente saúde e educação, mas sim todas as áreas, é que as despesas relevantes que vem crescendo acima da inflação precisam parar de crescer (em termos reais) para acomodar as outras áreas. E desta lista duas se destacam muito mais que as outras, previdência social e gasto com funcionalismo. Porém, isto leva a duas grandes discussões a serem travadas com a sociedade. Frear a previdência significará mudar as regras, o que pode incluir a política do salário mínimo aplicada aos benefícios. Frear o crescimento do gasto com funcionalismo significa na prática frear a concessão de ganhos reais e frear a expansão da máquina pública. Em ambos os casos amplos setores da sociedade são contrários e a gritaria em torno da PEC é mais que esperada. A PEC vai funcionar? Depende da disposição da União em vencer estas batalhas, pois a PEC por si só é uma declaração de intenções e sem vitórias nas reformas seguintes ela será simplesmente esquecida, mais uma lembrança das eternas promessas de ajuste.

(*) Professor do Departamento de Economia da UFPE.



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