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Observatório econômico Todos querem nosso dinheiro

Publicado em: 10/07/2016 08:00 Atualizado em: 08/07/2016 20:30

Por Fernando Dias (*)

Fernando Dias é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
Fernando Dias é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
Sabendo que todos querem nosso dinheiro, vamos nos aproveitar disso e usar o mercado para nosso benefício ao invés de ficar só criticando o mesmo e viver na esperança do maná dos céus.


Os economistas aprendem desde cedo que o que faz a grandeza do mercado é o grau de inter-relacionamento que ele gera na sociedade, e também aprendem que o que permite as pessoas se relacionarem de forma irrestrita é a figura da moeda. Elemento comum em nossas vidas, visto geralmente como um mero meio que permite a troca, a moeda em verdade permite que o orçamento de cada pessoa seja disputado em todos os mercados.

A razão é bem simples, como todos os bens são trocados através de um sistema de preços marcado em moeda a posse da mesma por qualquer pessoa permite comprar qualquer bem. É tudo uma questão da quantidade (e do crédito) que se possui. Neste ambiente em que tudo potencialmente pode ser comprado por todos é que os economistas pressupõem a figura representativa do homo economicus. Esta emblemática criatura é a forma representativa do ser humano no mercado, sempre pensando em si mesmo e agindo em busca de seu próprio interesse. Basicamente toda a teoria econômica, ao menos a parte não exótica dela, deriva desta combinação entre o homo economicus e o mercado com moeda onde todos disputam nosso orçamento.

Esta representação funciona? Sim, mas não perfeitamente. Contando com uma ciência que tenta prever o comportamento da interação conjunta de seres humanos quase imprevisíveis, os economistas conseguem alguns bons resultados. Por exemplo, como as interações dependem de circulação da moeda, quanto mais monetizada uma economia mais interações teremos e mais ela cresce e não faz tanto tempo que os programas sociais de caráter monetário, particularmente o Bolsa Família, deram um enorme impulso nas economias locais dos interiores nordestinos. Mais que o programa em si, o chamado multiplicador monetário é que explica a maior parte da geração de riqueza.

O homo economicus é também tido como racional, ela pensa logicamente e estrategicamente sempre pensando em seu bem-estar. Para falar a verdade esta é a hipótese que define o tal do liberalismo que tantos criticam, mas muitos sequer sabem o que é. Visão inadequada? O mundo real exibe no dia as provas de que não, de diversas formas. Um exemplo pode ser visto no centro histórico de Recife, para não ir longe, onde um grupo desejoso de preservar o patrimônio arquitetônico da cidade criou regras que dificultam severamente o uso das edificações. Longe de verem seus ativos perderem todo o valor, os proprietários vislumbram uma estratégia, escorar as paredes externas e deixar interior desabar. Estratégia vitoriosa com até um estacionamento com fachada colonial, tudo dentro da legalidade e do esperado pois, afinal o homo economicus não nasceu para ficar olhando seu patrimônio se perder.

Mas a representação do brasileiro não é mais próxima do homem-cordial, tão bem descrito por Sérgio Buarque de Holanda e tão querida dos intelectuais brasileiros? Longe disso, dos escândalos políticos envolvendo aqueles que historicamente defenderam a bandeira da lisura ao comportamento do dia a dia onde a Lei de Gerson é lugar comum, a representação clássica da economia representa o Brasileiro tão bem quanto em qualquer outro país. Ao que tudo indica não existe este tal homem-cordial e muito menos o homem-jabuticaba que dizem estar por aqui, somos uma economia com pessoas iguais as de qualquer outro lugar. Sabendo disso, e sabendo que todos querem nosso dinheiro, vamos nos aproveitar disso e usar o mercado para nosso benefício ao invés de ficar só criticando o mesmo e viver na esperança do maná dos céus (do Estado).

(*) Professor de economia da UFPE.

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