Observatório econômico A tempestade perfeita

Publicado em: 02/07/2016 08:00 Atualizado em: 01/07/2016 20:15

Por Fernando Dias (*)

Fernando Dias é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
Fernando Dias é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
Uma leitura que pode ser feita a partir dos indicadores recentes é que o paciente parece que vem parando de piorar, e mostra alguns sinais que pode começar a melhorar.


Uma pergunta que certamente está presente na mente de quase todos os brasileiros hoje é: “até onde vai esta crise? ”, e isto é algo realmente difícil de responder. Em verdade o Brasil passa hoje por uma tempestade perfeita onde a maior crise econômica da Era Republicana se encontrou com os maiores escândalos políticos conhecidos, e se juntando à miríade de problemas brasileiros que vão da infraestrutura à saúde e à educação formaram um cenário calamitoso. A situação atual é tão grave que só poderia ser pior se fôssemos devastados por uma tragédia natural como o Haiti, ou por uma guerra sem fim, como na Síria. Mas uma luz tênue surge no fim do túnel.

Todos os indicadores socioeconômicos que vem sendo divulgados são ruins. A taxa de desemprego só aumenta, o PIB continua caindo, a inflação está em alta e isto sem falar nos indicadores de infraestrutura, saúde e educação que nacionalmente e internacionalmente só nos desfavorecem. E a luz? Em verdade, a luz tênue é porque eles pararam de piorar e ou estão estáveis, ou estão ruins, mas com tendência de melhora. Não é muito, mas já é alguma coisa.

Vamos considerar os indicadores do PIB, por exemplo. De acordo com o levantamento do Banco Central as previsões de queda para o PIB deste ano estão menos otimistas, e para o próximo ano estão um pouco mais otimistas para uma alta pequena. Em relação ao câmbio, as previsões, também do levantamento do Banco Central, indicam menos oscilação e valores mais próximos dos praticados no mercado. E a inflação? Este ano ela parece ainda oscilar com o cenário político, porém as previsões para 2015 apontam para queda dentro da meta, e já se fala em 2018 no centro da meta.

Dentro do cenário político, resta cenário de emprego, o que dizer dele? Bem, ele anda bem mal atualmente, isto é um fato inegável. Não só o último índice do IBGE registrou novo aumento da taxa de desocupação, quanto os dados setoriais do Ministério do Trabalho mostram que nos últimos 18 meses praticamente todos os setores registraram redução de vagas continuamente. É certo que construção civil e comércio varejista são responsáveis por quase metade de todas as vagas fechadas, mas o cenário é negativo de forma generalizada. Há alguma luz aqui também? Na verdade, sim, o ritmo de queda parece que vem perdendo força.

Uma leitura que pode ser feita a partir dos indicadores recentes é que o paciente parece que vem parando de piorar, e mostra alguns sinais que pode começar a melhorar. Ele se recupera logo? Aparentemente não, um processo longo ao que tudo indica é o mais provável e alguns motivos podem ser facilmente listados. A origem do repique da inflação e da recessão atual tem origem no agravamento do déficit público, via uma política insustentável de crescimento. Como o Estado não tem mais como bancar a expansão do consumo ou da oferta, não há que se esperar nenhum choque na economia que faça ele despertar mais cedo. Adicionalmente, qualquer tentativa “miraculosa” de fazê-lo irá passar por expansão da dívida/elevação da carga tributária, juros mais altos e inflação mais elevada, ou seja, ele vai se autoconsumir.

Olhando agora para o setor privado não se vislumbra nenhum elemento que sirva como grande motor de crescimento mesmo no médio prazo, muito pelo contrário, o setor privado no Brasil padece de juros escorchantes, baixa produtividade e burocracia digna de revista em quadrinho. A dinâmica de crescimento, quando retomada, deverá ser em média baixa destarte um ou outro setor se destacarem de forma mais visível. Impulso externo então? Improvável pois além da voracidade do crescimento chinês estar ficando mais contida temos agora o Brexit, a saída da Inglaterra da União Europeia, que promete bagunçar o cenário econômico pelos próximos meses. O mundo continua crescendo, mas muito comedidamente. Ao que tudo indica o paciente Brasil vai se recuperar aos poucos, torcendo para que os trancos e barrancos provocados por nossos políticos não prolongue ainda mais a convalescência do paciente.

(*) Professor do Departamento de Economia da UFPE.

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