Observatório econômico Exemplo Nacional: IMPA

Publicado em: 05/06/2016 08:00 Atualizado em: 03/06/2016 19:48

Por Tiago Cavalcanti (*)

Tiago Cavalcanti é economista, Professor da Universidade de Cambridge e da FGV-SP. Foto: Paulo Paiva/DP
Tiago Cavalcanti é economista, Professor da Universidade de Cambridge e da FGV-SP. Foto: Paulo Paiva/DP
Com tantas notícias ruins no Brasil, resolvi escrever sobre algo positivo e propositivo. Em 2014, Artur Avila, matemático brasileiro, recebeu a medalha Fields. Prêmio de maior prestígio desta disciplina e para muitos mais difícil de ganhar do que o prêmio Nobel. Ao contrário do Nobel, há um limite de idade (até 40 anos) e o prêmio é anunciado a cada quatro anos para um máximo de 4 pesquisadores. Em 2018, os próximos medalhistas serão anunciados no Brasil no Congresso Internacional de Matemática, que pela primeira vez será na América Latina. Artur Avila é um produto nacional! Recebeu o doutorado do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) aos 21 anos e depois virou pesquisador e professor do mesmo Instituto. Divide seu tempo entre o Rio de Janeiro e Paris, onde também é pesquisador.


Apesar de Artur Avila ser um gênio, é importante destacar o papel do IMPA, que é apontado por especialistas na área como um dos melhores departamentos de matemática do mundo. O objetivo do IMPA é contratar os melhores, indepedentemente da nacionalidade. O IMPA recebe recursos públicos, mas tem independência na gestão desses. O IMPA recebe também doações privadas. A Cátedra que Artur Avila ocupa no IMPA tem como título o nome de quem a patrocinou: O ex-presidente do Banco Central, o economista Armínio Fraga, apreciador desta ciência pura e conhecedor da importância da matemática para todas as ciências.  

Existe um abismo gigantesco entre o IMPA e as universidades públicas brasileiras. Nas universidades públicas a forma de contratação é baseada em concursos públicos arcaicos, que dependem de ordens de Brasília, não se pode pagar professores de forma diferente, as promoções são rígidas e não há autonomia na gestão dos recursos. Há rigidez para gastar os recursos e, por exemplo, é quase impossível um professor de uma universidade pública ter também um emprego em uma universidade estrangeira, dividindo seu tempo em dois lugares, como acontece com Artur Avila, contribuindo para a inserção internacional das universidades e fato comum na academia internacional. Além disso, os reitores são eleitos a partir de uma eleição que se assemelha a uma disputa partidária para um cargo político, sem nenhuma avaliação da capacidade de gestão dos candidatos. Nas principais universidades do mundo, o processo de contratação de um reitor é similar a contratação de executivos de grandes organizações. É requerido ter alguns atributos mínimos, como, por exemplo, boa oratória, conhecimento da língua inglesa e experiência na área de gestão.

Um dos problemas centrais da economia brasileira é a falta de competitividade de alguns setores e sua baixa produtividade. Por exemplo, de acordo com relatório da Organização Mundial de Propriedade Intelectual, o Brasil tem um número de patentes válidas inferior ao da África do Sul e cerca de 6% do número de patentes válidas da Coreia do Sul. Ora, dada a baixa produtividade da economia brasileira, deveríamos estar profundamente preocupados com quem vai gerar tecnologia e inovação no país e como vamos atrair talentos para formar bons profissionais. Pode ser que o modelo do IMPA não possa ser reproduzido em larga escala, mas poderíamos pensar em expandir o modelo institucional desse instituto nas áreas de genética, engenharia de materiais, farmácia, energia e também na área de ciências sociais, que forma o pensamento crítico de nossa sociedade. Como na matemática, o retorno de tal investimento não é necessariamente imediato e difícil de mensurar. Contudo, se o Brasil quiser aumentar sua produtividade e competir no mercado de tecnologia e inovação, aproveitando, por exemplo, sua biodiversidade, precisa seriamente mudar a política universitária atual, que é extremamente custosa e ineficiente. Por exemplo, artigo recente da revista científica Nature mostra que o Brasil gasta cerca de 15 vezes mais em ciência e tecnologia que o Chile e tem uma produção científica menor do que a do Chile. O IMPA, produto nacional, nos trás importantes lições.

(*) Economista, Professor da Universidade de Cambridge e da FGV-SP.

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