Conjuntura Taxa média do cartão de crédito sobe para 347,5% Mesmo com a economia à beira da recessão, juros continuam subindo. No cheque especial, o percentual de 226% em abril foi o maior em 20 anos

Por: Rosana Hessel -

Publicado em: 28/05/2015 10:57 Atualizado em:

A economia pode estar à beira da recessão, mas o brasileiro continua pagando juros como nunca, principalmente, os do cartão de crédito e os do cheque especial, que estão na estratosfera. Dados divulgados ontem pelo Banco Central revelam que a taxa média cobrada pelo mercado financeiro para a pessoa física no rotativo, em abril, atingiu o maior nível da série histórica revisada que começa em março de 2011: 347,5% ao ano, 1,7 ponto percentual acima dos 345,8% do mês anterior. Em 12 meses, a alta acumulada é de 42,5 pontos percentuais. Os juros anuais do cheque especial também estão nas alturas. Passaram de 224%, em março, para 226,0%, em abril. Esse é o patamar mais alto desde dezembro de 1995. Não à toa, em dezembro passado, o jornal norte-americano The New York Times publicou reportagem  na qual dizia que “os juros do Brasil faziam qualquer agiota americano sentir vergonha”.

Apesar do alerta dos especialistas para que as pessoas evitem as duas modalidades de crédito, elas continuam sendo muito utilizadas. No caso do cheque especial, o volume de recursos tomado pelos correntistas cresceu 0,8% em abril, na comparação com o mês anterior, para R$ 27,4 bilhões. Já o saldo do rotativo saltou 2,5% no mesmo período, para R$ 37,3 bilhões. 

A auxiliar de limpeza Eliane Fernandes, 28 anos, ficou com o nome sujo ao perder o controle dos gastos com o cartão de crédito. “Fui comprando coisas supérfluas e, quando percebi, não conseguia mais pagar”, disse. Com a cobrança dos juros, a dívida, contraída há quase um ano, passou de R$ 300 para cerca de R$ 1.200. Para quem recebe salário mínimo, como ela, é impossível quitar o débito do rotativo de uma só vez. Eliane pretende buscar uma forma de negociar o valor.

Foi o que fez o protético dentário Paulo César de Paula, 57, que também teve problemas com o cartão. Há mais de cinco anos acumulando juros, o que começou com um gasto por volta dos R$ 800 virou uma dívida de seis dígitos. “Fui deixando de pagar e, agora, estou negociando com o banco, porque é impossível arcar com o valor cobrado”, contou. Com os juros cada vez mais altos e o desemprego em elevação, a inadimplência no mercado financeiro voltou a crescer depois de três meses de estabilidade. A taxa passou de 2,8%, em março, para 3%, em abril, na média de todas as linhas de crédito. Já no cheque especial, o calote é maior, de 7,6%, para os atrasos de 15 a 90 dias de pessoas físicas, e de 14,8%, no caso de pessoas jurídicas. 

Com os empréstimos mais caros e a inadimplência em alta, os bancos ficaram mais seletivos na concessão de recursos. Com isso, o saldo total de crédito do sistema financeiro, incluindo as operações com recursos livres e direcionados (financiamento imobiliário e de bancos públicos), cresceu apenas 0,1% na comparação mensal, embora ainda registre elevação de 10,5% em 12 meses, totalizando R$ 3,061 trilhões. Apesar desse avanço discreto, as concessões de crédito em abril encolheram 6,6% em relação ao mês anterior, sendo que o volume emprestado para as empresas caiu mais (8,3%) do que para as pessoas físicas (5,5%). “Em linhas gerais, o crescimento do crédito arrefeceu”, resumiu o chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Tulio Maciel. 

Piora
Nesse ambiente de restrição, a participação do crédito no Produto Interno Bruto (PIB) encolheu de 54,8% para 54,5%, conforme dados do BC. “Isso reflete a piora no cenário econômico. Os indicadores ruins não vão desaparecer nos próximos meses. A inflação permanecerá elevada e os juros continuarão subindo”, disse Miguel José Ribeiro de Oliveira, vice-presidente da Associação nacional dos Executivos de Finanças (Anefac). Para ele, o recente aumento da alíquota de Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) dos bancos, de 15% para 20%, deverá estar embutido nos próximos aumentos das taxas dos empréstimos.

Na avaliação de Oliveira, os dados do mercado de crédito do BC vieram muito ruins e a tendência é de piora nos próximos meses, lembrando que o spread bancário, que é a diferença entre as taxas de captação e de empréstimo, voltou a crescer. De acordo com dados da autoridade monetária, ele passou de 23,4 pontos percentuais em março para 26,4 pontos em abril, no caso das linhas de crédito para pessoas físicas. “Os juros estão mais altos, a oferta está encolhendo, o spread está subindo e os dados só não foram piores porque os bancos públicos continuaram emprestando”, destacou.

O chefe da Divisão Econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas Gomes, considera temerário juros tão altos em uma economia enfraquecida. “A inadimplência está aumentando e há previsões do mercado que já indicam queda do Produto Interno Bruto (PIB) de 2% este ano”, diz ele, lembrando que a oferta de crédito vem caindo diante da expectativa de contração da economia.


Piora para veículos e investimentos 
Dois dados mostram com clareza a tendência de retração da atividade econômica. O volume de financiamento para a aquisição de veículos encolheu 1,1% em abril na comparação com março, passando de R$ 179,6 bilhões para R$ 177,6 bilhões. Na comparação com o mesmo período de 2014, a queda foi de 6%, de acordo com o Banco Central. Já os empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) encolheram 30% em abril em relação a março, para R$ 8,3 bilhões. Em 12 meses, a queda foi de 27,6%.


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