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EXPOSIÇÃO

Pesquisadores desenvolvem dispositivo que aponta níveis de irradiação

Publicado em: 13/01/2020 07:32

 (Foto: Hassan Pasha/Unsplash)
Foto: Hassan Pasha/Unsplash
Imagine descobrir a quantidade e o tipo de luz a que você é exposto durante todo o dia. Esse tipo de análise ainda não é possível, mas está próximo de se tornar realidade. Pesquisadores suíços desenvolvem um dispositivo com potencial para destrinchar a luz recebida por um organismo. O aparelho tem design semelhante ao de um relógio e uso variado, já que pode se tornar uma solução vestível. A nova tecnologia, chamada Spectrace, foi apresentada nas páginas do periódico especializado Current Opinion in Behavioral Sciences. 

O projeto é conduzido por pesquisadores do Laboratório de Desempenho Integrado em Design (LIPID), na Suíça, em parceria com professores e alunos da Escola de Arte e Design de Genebra. O aparelho foi desenhado para ser usado em estado de repouso, apoiado no pescoço, como um par de fones de ouvido, e também para ser acoplado a uma peça de roupa com um pino magnético. Spectrace poderá ser usado o dia inteiro, tanto no trabalho, quanto durante a prática de exercícios físicos e em ambientes sociais.

Para os autores, a possibilidade de ter informações detalhadas sobre esse tipo de exposição tem aplicação em diferentes áreas.

"Nossa percepção visual do mundo - vendo forma e cor ou navegando no ambiente - depende da interação com a luz. A luz tem papel fundamental na regulação dos ritmos da fisiologia e do comportamento, bem como na secreção aguda de hormônios, como a melatonina, e mudanças no estado de alerta. Por isso acreditamos que é essencial monitorá-la", ressaltam no artigo.

Os criadores desenvolveram uma série de sensores de luz que, além de medirem a intensidade e quanto tempo um indivíduo fica exposto, conseguem quantificar o espectro da luz. Essa segunda medição é o diferencial do Spectrace. "Existem vários tipos de sensores de luz no mercado. Mas, nenhum deles pode realmente medir nossa exposição à faixa espectral da luz, isto é, em função do comprimento de onda da luz (todas as suas cores constituintes). É isso que há de novo no nosso protótipo", frisam.

Para realizar essa medição, a equipe usou um espectrômetro - instrumento óptico que mede as propriedades da luz - em miniatura. O equipamento, projetado para a indústria de processamento de alimentos, foi adaptado para a nova função e para ser usado com um dispositivo vestível. Há ainda um sensor UV embutido e um fotômetro, que oferece resultados de análises em menos de um segundo. Em testes iniciais com um protótipo, os cientistas obtiveram resultados positivos. Os planos são de realizar testes em condições reais até 2021.

Impactos fisiológicos

Os autores do estudo destacam que, desde a descoberta da melanopsina, há 20 anos, tem surgido grande interesse em formas de entender como a falta de luz natural e a exposição excessiva à artificial afetam o corpo humano. A melanopsina é um fotopigmento sensível à luz azul encontrado no olho humano que ajuda a manter o relógio interno do corpo "nos trilhos". É responsável por sincronizar todos os ritmos circadianos, e isso tem impacto significativo na saúde, desde a regulação do sono e do ciclo hormonal até a capacidade do sistema imunológico de funcionar adequadamente.

Os criadores da nova tecnologia acreditam que ela poderá ajudar a entender melhor a relação do homem com a luz e contribuir para a área científica e médica com uma série de novos dados. "Passamos muito tempo dentro de casa, o que significa que estamos sofrendo de uma escassez crônica de luz do dia. E estamos olhando as telas o tempo todo, o que tem efeitos especialmente negativos à noite. Na verdade, deveríamos estar recebendo luz abundante, rica em comprimentos de onda azuis durante o dia, para acumular quantidade suficiente. Isso faz as pessoas se sentirem melhor", ilustra Marilyne Andersen, diretora do LIPID e uma das autoras da pesquisa.

Dieta espectral

Para a equipe, a partir do projeto, é possível trabalhar o conceito de dieta espectral. "Desde o início da evolução humana, o marcapasso circadiano segue o seu compasso por meio da luz. Mas o ambiente em que vivemos mudou, nossos horários e nosso estilo de vida, com a exposição à luz artificial, contribuíram para uma grande revolução nesse quesito. Acreditamos que apenas os dados espectrais não são suficientes para entender essa relação, precisamos de informações sobre a temperatura corporal, o horário de sono e outras mais. Porém, acreditamos que contribuiremos bastante com essa nova possibilidade de análise", explicam.

Mário Fabrício Fleury Rosa, doutor em ciências e tecnologias em saúde e professor da Universidade de Brasília (UnB), avalia que o projeto traz dados sobre um tema de extrema importância, que é a interação humana com o ambiente. "Um dos papéis da ciência é descobrir novas possibilidades em gerar benefícios para os seres humanos na interação consigo mesmo e com o meio ambiente, apontando soluções capazes de auxiliar na manutenção da saúde das pessoas", diz.

Para o especialista, a versatilidade da tecnologia chama a atenção. "Um dos pontos mais interessantes é que ela é vestível, ou seja, o equipamento capaz de realizar a filtragem tem condições de ser produzido. Mas é um desafio desenvolver e produzir comercialmente o equipamento", opina.

O professor da UnB acredita que uma das possibilidades a serem exploradas é a criação de aparelhos que, além de medir, consigam controlar a emissão de luz do meio externo para o sistema ocular. "Liberando as ondas de luz em quantidades e medidas certas através de um filtro artificial, conseguiríamos aumentar a qualidade de vida das pessoas", explica. "Já existem os componentes eletrônicos para montar, também, quem sabe, um óculos que auxiliará na realização dessas tarefas."
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