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Cuidado Querer exageradamente o outro pode ser limerência A ideia de ter alguém louco por você pode até parecer romântica, mas pode se tornar perigoso

Por: Portal Uai - Associados

Publicado em: 09/06/2015 11:29 Atualizado em: 09/06/2015 11:34

Limerência é quando o relacionamento se transforma em transtorno obsessivo compulsivo e vício. Foto: CB/D.A. Press
Limerência é quando o relacionamento se transforma em transtorno obsessivo compulsivo e vício. Foto: CB/D.A. Press

A sensação de estar apaixonado envolve um turbilhão de emoções aparentemente dissonantes, mas que fazem total sentido para quem está envolvido. O início do relacionamento é frenético: de repente, a realidade não tem mais graça sem a presença da pessoa amada. A simples visão do ser amado desencadeia tremedeira, mãos suadas, coração palpitante e as famosas “borboletas no estômago”. Ao mesmo tempo em que o ser amado causa imensa felicidade e prazer, há também angústia, variações de humor, saudade, sentimento de posse e ciúme. Quando a turbulência emocional não passa, quando estar longe do companheiro causa desespero, a paixão dá lugar à limerência — estado obsessivo que pode evoluir para problemas mais sérios e destruir qualquer possibilidade de amor.

O apaixonado sofre com a distância: se pudesse, daria um jeito de fundir o próprio corpo ao do objeto de desejo, só para não ter que conviver com a inconveniência da regra básica da física que determina que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar simultaneamente. A paixão, todavia, não dura para sempre. Após cerca de 18 a 48 meses, de acordo com alguns estudos científicos, o estado mental alterado pelos hormônios esvanece. O fogo esfria e dá lugar a outro sentimento — que tanto pode tanto ser amor quanto obsessão. A limerência, termo cunhado em 1979 pela psicóloga Dorothy Tennov em seu livro Love and limerence: the experience of being in love (Amor e limerência: a experiência de estar apaixonado, em tradução livre), é justamente o estado patológico de paixão: limitante, absorvente e perigoso para os envolvidos.

De acordo com Albert Wakin, professor de psicologia na Sacred Heart University (EUA) e especialista em limerência, o estado pode ser definido como um casamento entre transtorno obsessivo compulsivo (TOC) e vício. “O TOC diz respeito ao fato de o indivíduo pensar na outro 95% do tempo. E, ao contrário do vício em substâncias, a pessoa está constantemente preocupada se o outro está disponível e se não encontrou alguém melhor”, detalha.

Diferenciar uma paixão avassaladora de um estado de limerência não é fácil. Para descobrir, o único jeito é esperar e pagar para ver. Em relacionamentos saudáveis, Wakin frisa que, após os quatro ou seis primeiros meses, os picos de euforia dão lugar a uma relação estável emocionalmente. “Na limerência, as necessidades se intensificam e há uma necessidade insaciável por validação e reciprocidade”, descreve. “Ela geralmente dura cerca de dois a três anos, mas pode durar vários anos e mesmo décadas.”

David Sack, psiquiatra norte-americano especialista em dependência psiquiátrica, está à frente da Elements Behavioral Health, uma rede de programas criados para o tratamento de dependências emocionais e sexuais nos Estados Unidos. Segundo ele, alguns especialistas até consideram a limerência como um estado normal do início da paixão. O problema é quando o foco deixa de ser o casal e passa a ser individual, transformando-se em uma espécie de egoísmo sentimental. “Alguém em um estado constante de limerência está essencialmente focado apenas em suas próprias necessidades”, explica. “Se a pessoa está mais preocupada em garantir o afeto do outro do que com o próprio bem-estar do ser amado; se a afeição mais sufoca que satisfaz, então isto é limerência.”

Tiago Lopes Lino, psicólogo clínico e mestre em sexualidade humana pela Faculdade de Medicina de Lisboa, reforça que há uma linha tênue entre paixão saudável e a limerência. “Esse estado dá origem a um elevado receio de perder o objeto amoroso”, completa. “A imaginação, a fantasia e o delírio passam a dominar o receio de perder o ser amado, e intensifica-se a necessidade de proteger a relação, potencializando o ciúme.”

A fixação amorosa é democrática e imprevisível. Qualquer um está propenso — e nada garante que passar por isso uma vez deixará o apaixonado imune a recaídas. Indivíduos com personalidade sedutora estão mais propensos a desenvolver a limerência, de acordo com Tiago Lino. “Indivíduos com traços de psicopatia também estão vulneráveis”, alerta. Além da obsessão e da vigília constante, o limerente pode partir para abordagens mais graves. A desvalorização do outro, com humilhações, xingamentos e até agressão física, é um exemplo. “O objetivo é que o ser amado se sinta incapaz e impotente”, esclarece o especialista.

O ciúme, explica o especialista, aparece em forma de flashes, ou seja, em episódios pontuais (nem sempre justificáveis). Com o tempo, o sentimento se converte em uma espécie de delírio (“você está olhando para quem? Com quem está trocando mensagens?”). A soma de insegurança e ciúme é explosiva. Em casos graves, segundo Tiago Lino, o ciúme doentio desemboca em violência doméstica, comportamentos de stalking (invasão persistente da privacidade do outro), vício em sexo e sociopatia.

Aconselhamento e terapia comportamental podem ajudar aqueles que lutam contra o exagero sentimental. Além de identificar os padrões comportamentais destrutivos, o objetivo principal é que os pacientes os substituam por formas saudáveis de pensamento sobre si mesmo e sobre o parceiro. “Todavia, o indivíduo em limerência dificilmente admite esse estado e, grande parte das vezes, não procura ajuda”, reconhece Tiago Lino.

O relógio do amor

Há muito tempo, a ciência tenta encontrar o tempo exato que dura a paixão. Uma pesquisa feita por cientistas da Universidade de Pisa (Itália), em 2006, chegou à conclusão de que a paixão teria prazo de validade de 48 meses. A partir do estudo dos hormônios de um casal durante o relacionamento, os pesquisadores analisaram que as substâncias relacionadas ao desejo — como a neutrofina e a noradrenalina — diminuíram drasticamente (ou até mesmo desapareceram) após dois anos do início do relacionamento. Em compensação, a ocitocina, considerada o hormônio do amor, passou a circular com mais intensidade no corpo dos entrevistados.

Ficou na dúvida?

Veja os principais sintomas de uma pessoa passando por um processo de limerência

Idealização de tudo que diz respeito ao outro;
- Ciúme injustificado: receio constante de perder o parceiro amoroso sem causa aparente;
- Vigilância constante: controle dos passos da pessoa amada, com a exigência de estar sempre informado(a) do que se passa com ela;
- Restrição de contatos: isolamento da pessoa amada de tudo e de todos, para neutralizar qualquer ameaça à relação (partindo do pressuposto de que, se a pessoa não se relacionar com ninguém, menores as chances de ir embora);
- Desvalorização do outro, com uso de ameaças ou insultos. O objetivo é humilhar e desprezar o objeto amado, para que este se sinta incapaz e impotente;
- Perda de controle dos pensamentos. Ele ou ela está sempre na sua cabeça;
- Confusão quando se está próximo do objeto de desejo;
- Gagueira, tremores, rubor, fraqueza ou palpitações cardíacas;
- Tentativa de “ler” a pessoa: analisar cada palavra, cada encontro, cada gesto do outro.

Fonte: David Sack, psiquiatra norte-americano especialista em dependência psiquiátrica e vícios; Tiago Lopes Lino, psicólogo clínico e mestre em sexualidade humana


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