Meio Ambiente

Fundo da Amazônia completa uma década e desmatamento aumenta

Nos últimos 10 anos, o fundo recebeu R$ 3,1 bilhões.

Publicado em: 23/07/2018 07:58

Apesar do aporte de R$ 3,1 bilhões realizado nesses 10 anos, desmatamento voltou a crescer na região. Foto: Daniel Nepstad/Divulgação
O Brasil concorria à “motosserra de ouro”, prêmio irônico dado pelo Greenpeace ao país que mais desmatou, em junho de 2008, enquanto o governo federal tentava fazer vingar uma proposta inovadora de financiamento para a preservação ambiental. O Fundo de Proteção para a Amazônia foi então criado para captar investimentos destinados às ações de conservação do bioma. As verbas são geridas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e aplicadas para iniciativas como monitoramento, gestão de florestas públicas e recuperação de áreas desmatadas. Uma década depois, o país assiste ao aumento do desmatamento e arrisca até não atingir metas internacionais.

A empreitada saiu do papel. Com uma população de pouco mais de 5 milhões de habitantes, a Noruega é o maior financiador do Fundo. O país europeu — que sempre esteve entre os 15 maiores produtores de petróleo do mundo — buscava se engajar no combate mundial à emissão desses gases que contribuem para o aquecimento global. Passou, então, a ser grande doador para sistemas de proteção de florestas em países como Indonésia, Guiana, Libéria, Peru e Brasil.

Nos últimos 10 anos, o fundo recebeu R$ 3,1 bilhões. O dinheiro, segundo o BNDES, é aplicado em mais de 100 projetos. Contudo, cientistas e ambientalistas estão preocupados com o futuro da floresta. Uma pesquisa do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáticas (INCT-MC), divulgada na revista especializada Science Advances, concluiu que, atualmente, a área desmatada corresponde a 18% da área total da Amazônia. Se esse índice chegar a 20%, 25% o bioma pode virar cerrado. Outro estudo, do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) publicado na revista especializada internacional Nature Climate Change, classificou a governança ambiental brasileira como “retrocesso gradual”.

O panorama deixa em alerta os defensores do bioma. A preocupação é de que, com os níveis de desmatamento, é difícil cumprir as metas do Acordo de Paris — tratado das Nações Unidas sobre a mudança do clima, que rege medidas de redução de emissão dióxido de carbono, a partir de 2020, para limitar o aquecimento global. O Ministério do Meio Ambiente e o BNDES, órgãos responsáveis pela gestão do projeto, consideram os resultados positivos. Nesse meio tempo, a Noruega chegou a reduzir repasses por conta do aumento do desmatamento (leia Memória).

Retrocessos
Dois aspectos são apontados como fundamentais para o retrocesso no desmatamento da Amazônia: a aprovação do novo Código Florestal, em 2012, e a pressão da bancada ruralista, em 2016, para a aprovação de projetos, assinatura de medidas provisórias e a publicação de decretos. Essas intervenções diminuíram as exigências para o licenciamento ambiental, suspenderam a demarcação de terras indígenas e facilitaram que grileiros se beneficiem dos recursos de áreas desmatadas ilegalmente. Com isso, as estimativas para 2025 não são positivas. Até lá, as perdas anuais serão de 27 mil quilômetros quadrados (Km2) de matas na Amazônia.

Paulo Barreto, pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), é categórico: o desmatamento está acima do que era esperado e as áreas desmatadas estão relativamente elevadas. “A meta era chegar 2020 a 3,8 quilômetros quadrados. No último ano, foram quase 7 mil Km2. E, em 2012, foram 4,8 mil Km2. Os números mostram que avançamos, mas depois regredimos”, critica. Ele destaca que a situação atual é de instabilidade. “Temos o vai e vem de políticas públicas, com dependência de quem será eleito e das intenções do Congresso, que continuará tendo uma alta presença de ruralistas”, explica.

Para Luiz Mourão, integrante do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), o Fundo de Proteção é parte do caminho que o Brasil deve percorrer para preservar as matas. “A sensação que tenho é de que o governo, efetivamente, não tem tido impulso para essa área. Há soluços momentâneos. Tivemos vários ministros, várias políticas, mas só isso não basta. Só o Fundo não vai proteger a floresta. É preciso mais fiscalização, gestão, políticas públicas. O que temos hoje não é suficiente. É preciso também vontade política, que não existe”, critica.

César Vítor, superintendente da Fundação Pró-Natureza, avalia que não houve apenas retrocessos, mas destaca a necessidade da continuidade de políticas de preservação. “Considerando esses 10 anos, houve avanços, não só no combate, mas também na implementação de unidades de preservação que possibilita melhor proteção das áreas. Agora, realmente, a flexibilização da legislação e a pressão da bancada ruralista do Congresso causam problemas e alguns reflexos já estão aparecendo, como o aumento de área desmatada. Precisamos continuar com os projetos de preservação para atingir as metas internacionais e não deixar haver retrocessos”, defende.
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