PAC não possui recursos para adaptação às mudanças climáticas, diz especialista
Para Natalie Unterstell, às vésperas da COP-30, PAC está "colocando dinheiro na infraestrutura de uma clima que não existe mais"
Publicado: 31/05/2025 às 14:14

Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa (Reginaldo Pimenta)
Marília Parente
Enviada especial ao Rio de Janeiro (RJ)
De acordo com Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa e mestre em administração pública pela Universidade de Harvard, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não possui recursos para adaptação às mudanças climáticas. Segundo a especialista, às vésperas da COP-30, o país investe em infraestrutura para “um clima que não existe mais”, ao focalizar sua atuação em medidas de mitigação, voltadas para redução e prevenção de impactos ambientais, e não na adaptação ao novo cenário que está posto.
“Ignorar a mudança do clima está saindo muito caro. Será que falta dinheiro? A minha hipótese é a de que não. A gente está colocando dinheiro na infraestrutura de um clima que não existe mais. No ano passado, só o que houve de aporte do Governo Federal para o Rio Grande do Sul equivale a mais ou menos 75% do que o ministro [Fernando] Haddad prometeu de ajuste fiscal”, afirmou Unterstell.
A especialista em mudanças climáticas palestrou durante os seminários preparatórios para a COP-30 no Hotel Prodigy do Centro do Rio de Janeiro, que também sediou o II Fórum de Finanças Climáticas e de Natureza, organizado por sete organizações voltadas à pauta ambiental nos dias 26 e 27 de maio. O evento discutiu caminhos para a arrecadação de U$ 1,3 trilhão até 2035 para mitigação, adaptação e compensação por perdas relacionadas às mudanças climáticas, meta estabelecida durante a 29ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP29), promovida em Baku, no Azerbaijão.
“O PAC tem a pretensão de mobilizar R$ 1,7 trilhão até 2027 e o que eu quero destacar é que hoje a gente não tem nenhuma obra de adaptação contabilizada no programa. Esse dinheiro não está sendo mobilizado para o clima em que a gente vive, então não adianta apenas colocar ‘cidade resiliente’ no nome do projeto”, alerta.
Para a pesquisadora, investir em adaptação às mudanças climáticas “não é apenas necessário, mas inteligente”. “Existem vários estudos que já nos dão uma noção do retorno desse tipo de investimento. Vou citar um deles, que foi feito pelo Banco Mundial da América Latina para Transportes, que estimou que a cada dólar investido na adaptação da infraestrutura em transporte você economiza US$ 12 em perdas e danos. Se investirmos R$ 100 milhões em adaptação, pode ser que economizemos R$ 1 trilhão em perdas e danos”, completa.
Engajamento
Para Josué Tanaka, professor visitante da London School of Economics e fundador do Banco Europeu para Reconstrução e Desenvolvimento, com a meta de R$ 1,3 trilhão fixada na COP-29, o mundo finalmente passou a discutir um montante à altura dos desafios impostos pelas mudanças climáticas. “O número parece grande, mas há recursos para isso. Somente a soma dos ativos dos bancos no mundo é de US$ 140 trilhões”, destaca.
O especialista aponta os bancos multilaterais e os bancos de desenvolvimento como atores importantes desse processo. “É no setor privado, no entanto, que estão as maiores fontes, como o mercado de capital e o bond market [mercado de títulos] dos bancos privados. Então é claro que, para muitos, a gente nunca vai chegar a esse valor sem um investimento muito forte do setor privado”, acrescenta.

