Há solução para as Fake News?

Maurício Rands
Advogado formado pela FDR da UFPE, PhD pela Universidade Oxford
twitter: @RandsMauricio

Publicado em: 08/04/2019 03:00 Atualizado em: 08/04/2019 09:12

A Bíblia (‘A verdade vos libertará’), os sistemas éticos (‘os imperativos categóricos de Kant’) e algumas ideologias (‘a verdade é revolucionária’) proclamam apreço pela verdade. Um dos maiores saltos tecnológicos da civilização foi a internet. E um de seus subprodutos, a postagem falsa, ameaça esses sistemas ao se chocar com a verdade. Ameaça também a democracia e o jornalismo, estratégicos para o desenvolvimento. Algumas soluções começam a ser experimentadas. Elas  podem ser agrupadas em cinco modalidades, como fez a BBC em recente programa em sua rádio.

1. Etiquetar postagens potencialmente falsas. O Facebook tem sido criticado por permitir a proliferação das fake news. Sob pressão, listou verificadores de fatos independentes que podem ser acionados pelos usuários do Face nos Estados Unidos e na Alemanha. Existem redes de verificadores, como a IFCN (Rede Internacional de Verificadores de Fatos), que agrupam respeitáveis órgãos de mídia como o Washington Post. O usuário do Face pode acionar a IFCN, que recorre ao seus órgãos afiliados para checar a postagem. Apurada a falsidade, a matéria pode continuar a circular na rede, mas com um alerta (‘tag’ ou ‘flag). Novo alerta aparece na telinha quando o usuário pretende compartilhá-la. Essa etiqueta de alerta vai afetar negativamente o escore do ‘post’ no algoritmo do Facebook.

2. Etiquetar o inteiro site. Como fez o Le Monde, unidades especializadas de verificação de fatos disponibilizam ferramentas para apurar a falsidade de certos sites. O usuário que baixa a ferramenta recebe um alerta e pode acessar a análise sobre a confiabilidade do site em questão.

3. Usar os algoritmos para combater os algoritmos propulsores das fake news.  Os algoritmos são decisivos para espalhar as fake news. São usados pelos softwares das redes sociais para impulsionar as que se tornam populares. Por isso, deveriam ser programados de modo a identificar o que é potencialmente falso. Ao final do dia, a programação de algoritmos para a verificação dos fatos pode ter a influência do viés do programador. Essa solução, portanto, tem que combinar as ferramentas de checagem automática, inclusive as de inteligência artificial, com o olhar constante de seres humanos reais.

4. Ampliar a educação digital da população. Os currículos escolares podem ter disciplinas de educação digital, como propõe o senador Bill Dodd, da Califórnia. Ele sugere que se estudem os órgãos de mídia confiáveis. A educação digital pode ajudar as pessoas a saber da diferença entre uma postagem da BBC, do New York Times, da Folha de SP ou do Diário de Pernambuco e uma outra de fonte anônima, sem história e sem compromissos editoriais. Assim, as pessoas desenvolvem a capacidade de identificar a falsa informação. A própria elevação da qualidade da educação e da cultura cívica contribui para diminuir o problema.

5. Eliminar os incentivos econômicos e políticos dos criadores e divulgadores das notícias falsas. As postagens falsas tendem a explorar a natural atração humana pelo inusitado, sensacional ou conspiracional. As teorias conspiratórias instilam o sentimento de que o leitor está ‘entendendo’ algo que está por trás das aparências. Um sentimento de que está descobrindo uma verdade não percebida pelos demais. Ao lado do grotesco e do espetáculo, esse tipo de post facilmente viraliza. A audiência exponencial gera muito dinheiro e influência política.  Por isso, uma linha de solução para o problema é forçar as plataformas a proibir propaganda em matérias consideradas fake news. E, assim, diminuir-lhes os lucros. Mais ainda, trata-se de punir os autores desses falsos posts. Multando as pessoas físicas e jurídicas. As pessoas, mas também as plataformas. Até mesmo com penas privativas de liberdade dos responsáveis. ‘Seguir o dinheiro’ e punir quem lucra com as fake news, inclusive as plataformas como Google e Facebook, pode ser um caminho promissor.  Atualizar o direito eleitoral para punir os candidatos beneficiários das fake news também passa a ser um desafio.

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