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Revelação de "O Agente Secreto" aos 78 anos, Tânia Maria diz que é uma honra estar entre apostas do Oscar

Atriz e artesã potiguar, Tânia Maria foi apontada pela revista norte-americana Variety como uma das apostas para o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, pelo filme "O Agente Secreto". Sua carreira no cinema começou em 2019, com "Bacurau".

Por Camila Estephania

Tânia Maria durante as gravações do filme "O Agente Secreto".

Cerca de 600 habitantes vivem no povoado de Santo Antônio da Cobra, em Parelhas, no semiárido do Rio Grande do Norte, a mais ilustre entre eles é a artesã e atriz Tânia Maria. Aos 78 anos de idade, ela é uma das apostas da revista norte-americana Variety para o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, pela sua atuação em “O Agente Secreto”, do diretor pernambucano Kleber Mendonça Filho. Entretanto, até pouco tempo atrás, a ausência de salas de cinema perto de onde mora sequer lhe fazia falta.

“Nem de filme eu gostava. Nunca assistia a filmes na televisão, nem nada. Não achava futuro. Mas agora eu assisto e gosto”, disse em entrevista ao Diario. Segundo ela, tudo mudou em 2018, quando o destino bateu à sua porta. Na época, Kleber e Juliano Dornelles procuravam figurantes para “Bacurau”, que seria gravado próximo dali, no povoado de Barra. Na busca, a equipe do filme visitou a casa de Tânia enquanto ela costurava seus tapetes e, ao ouvir uma conversa na sala, ela foi saber do que se tratava. Bastou um “bom dia” e a artesã já foi convidada a gravar.

“Disseram: ‘é dessa voz que eu estou precisando. A senhora vai pra Barra gravar?’. Não sabia nem o que era gravar, mas fiquei contente demais e emocionada”, lembra. A emoção foi ainda maior quando assistiu à sua primeira sessão de cinema, em 2019, com a exibição especial de “Bacurau” em Barra. Na ocasião, foi montada uma tela ao ar livre no campo de futebol do povoado. Pouco depois, viajou 100 quilômetros para ir, pela primeira vez, à sala de cinema mais próxima, em Patos, na Paraíba, onde veria o filme novamente.

Depois dessa experiência, Tânia caiu nas graças dos cineastas por conta da sua naturalidade em frente às câmeras. Em seis anos, atuou em mais cinco filmes. O segundo deles foi “Seu Cavalcanti”, do também pernambucano Leonardo Lacca, responsável pela preparação de elenco de “Bacurau” e “O Agente Secreto”. “Ele ensina muito bem”, diz sobre o cineasta, que considera como um neto. Em seguida, participou de outros títulos que ainda estão sem data de lançamento. São eles: “Delegado”, de Leonardo Lacca e Marcelo Lordello; “Yellow Cake”, de Tiago Melo; e “Almeidinha”, de Gustavo Guedes e Julio Castro.

“É muito bom gravar com Leo, Kleber, Juliano… E agora com Wagner Moura, nem se fala”, lembra com carinho do colega de cena, premiado como Melhor Ator no Festival de Cannes deste ano pelo trabalho em "O Agente Secreto". “Me disseram: ‘vai chegar um ator muito famoso, não vá se emocionar’. Aí quando ele chegou, me perguntaram se eu o conhecia, disse ‘nunca vi’. Ele adorou”, comenta rindo. Ela diz que o baiano foi como um professor e logo se estabeleceu uma afinidade entre os dois, que transparece na tela.

Voando alto

Até trabalhar com cinema, Tânia revela que a única novela que tinha acompanhado foi “Pai Herói”, de 1979. Agora, tem visto de tudo e adora acompanhar o trabalho dos amigos, como o ator recifense Thomás Aquino, que está no elenco de “Vale Tudo” e já contracenou com ela em “Bacurau” e “O Agente Secreto”. Por conta dos novos hobbies e dos compromissos como atriz, a agenda ficou mais apertada, mas ela concilia com o trabalho artesanal de costura de tapetes.

A potiguar diz que chega a produzir cinco conjuntos de tapetes por dia, tendo dado um deles de presente a Wagner Moura. Sua produção mensal abastece dez lojistas, que estão espalhados por cidades como Carnaúba dos Dantas e Natal, no Rio Grande do Norte; e Recife, Paulista e Toritama, em Pernambuco. Quando viaja para as sessões especiais dos filmes que participa, ela adianta a produção. No caso das gravações por temporadas mais longas, ela tira férias da máquina e prioriza o cinema.

Assim, Tânia vem conhecendo o Brasil todo e está disposta a ir até Los Angeles, nos Estados Unidos, caso “O Agente Secreto” concorra ao Oscar. “Só do meu nome estar estampado entre as apostas (do Oscar) já é uma honra. É muita alegria saber que meu trabalho valeu a pena e estão gostando”, avalia.

Independente de prêmios, ela celebra o sucesso do filme em cada sessão que comparece. Uma das mais aguardadas será a pré-estreia do filme pernambucano em Natal, no dia 22 deste mês. Na ocasião, cerca de 60 familiares e amigos de Cobra irão ao cinema vestindo blusas com uma foto da atriz estampada. Mesmo com a fama e os planos de seguir na carreira de atriz, ela adianta que não pretende se afastar deles e se mudar do povoado, onde vive com sua filha, Shyrley, além de genro, neta, e bisneto.

As viagens, no entanto, são mais do que bem-vindas. Desde que parou de fumar recentemente, a atriz está com ânimo renovado para se aventurar pelo mundo afora. Antes, fumava cerca de quarenta cigarros por dia, hábito que manteve por 65 anos e a impediu de ir à premiere mundial de “O Agente Secreto”, no Festival de Cannes. Na época, o médico lhe explicou que ela poderia ter um ataque de pânico sem poder fumar durante muitas horas no voo até a França.

“Agora, pra onde me mandarem, eu vou. Já andei tanto que não sinto nem falta do cigarro”, comemora. Nesse novo ritmo, foi até Brasília, em agosto, para exibir o filme em sessão especial para o presidente Lula. Ao final, Tânia lembra que o governante a abraçou, a parabenizou pelo seu trabalho e perguntou se ela estava precisando de algo. A resposta foi curta: “de filmes", disse a nova apaixonada pelo cinema.