Apesar de uma recepção inicial mista, o terror slasher Os estranhos, lançado em 2008, foi um grande sucesso comercial e acabou se tornando ao longo do tempo uma referência contemporânea no subgênero de assassinos mascarados. Descrito como inspirado em uma história real, o filme dirigido por Bryan Bertino (sua estreia em longa-metragem) tratava de um casal passando por uma noite difícil após o namorado (Scott Speedman) pedir em casamento a namorada (Liv Tyler) e ela não aceitar. Chegando à casa de veraneio para descansar, os dois são surpreendidos por um trio de psicopatas que passa a tentar entrar na casa.
Em 2018 foi lançada uma sequência sem ligação direta e sob o comando de Johanes Roberts, Os estranhos: caçada noturna, que repensava o clima carregado do original a partir de uma chave de slasher oitentista, com perseguições abertas, uso intenso de trilha musical e citações claras a outros filmes do gênero. E agora a franquia lança um plano inusitado de trilogia, com os três gravados simultaneamente e o primeiro, Os estranhos: capítulo 1 entrando em cartaz hoje nos cinemas.
O casal da vez é interpretado por Froy Gutierrez e Madelaine Petsch, dois jovens que estão comemorando seus cinco anos de namoro e embarcam numa viagem de carro. Em um vilarejo desconhecido, o veículo quebra e eles precisam ficar instalados em um Airbnb - e rapidamente o pesadelo começa, para os personagens e para o espectador.
Nos primeiros 15 minutos, mesmo com uma aparência genérica, dá pra sentir o filme ensaiando uma contextualização mínima daquele ambiente e de algo que supostamente seria (ou será) desenvolvido nos próximos filmes. Quando algumas referências passam a se amontoar e o filme entra na cabana, porém, Renny Harlin (famoso por dirigir continuações como Duro de matar 2, A hora do pesadelo 4, Exorcista: O início) basicamente refaz o filme original só que sem atmosfera de perigo, sem qualquer ideia visual interessante que dê alguma cara ao filme, sem nenhum interesse pela violência/brutalidade da situação e tampouco em transformar aquilo tudo numa sátira (o que seria um caminho fácil, mas ao menos seria um caminho).
O casal se esforça bem pra dar credibilidade aos personagens e reagir ao terror, mas tudo o que o primeiro filme tinha de econômico no drama de Liv Tyler e Scott Speedman esse só faz enrolar porque basicamente não faz a menor ideia do que fazer com os vilões. Na falta dessa ideia, ele fica nesse jogo de referências ao original (as perguntas por Tamara, o celular que some, o tiro errado, a caminhonete dos mascarados, o clímax com as cadeiras amarradas) e é incapaz de tomar qualquer decisão arriscada ou explorar alguma possibilidade nova.
Assistir ao filme de 2008 e a sequência autônoma e subestimada de 2018 é um exercício interessante porque eles partem da mesma premissa para, no primeiro, trabalhar com o terror psicológico do home invasion e, no segundo, criar um jogo de gato e rato à John Carpenter assumindo o slasher de vez. O filme de 2018, aliás, era um bom exemplo de como pegar uma ideia e brincar com ela sem abandonar o conceito central. Todo o terceiro ato daquele filme sozinho tinha mais ideias, tensão e divertimento do que qualquer coisa dessa refilmagem de Harlin.
Com todos os seus incontáveis problemas, O exorcista: O devoto, de David Gordon Green, outro péssimo começo de trilogia, ao menos tinha algumas tentativas claras - nenhuma funcionava e o resultado era uma bagunça, mas existia um esforço ali, um caos de temas e possibilidades formais. Aqui em Os estranhos: capítulo 1 não há quase nada, nem mesmo um gancho verdadeiro para a sequência, a ser lançada supostamente ainda esse ano.
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