Unlimited Love marca a volta de Frusciante e da magia nostálgica dos Red Hot Chili Peppers
Primeiramente, o leitor tem o direito de saber: o jornalista que assina este texto é parcial quando o assunto é Red Hot Chili Peppers. Tem o símbolo da banda (o famoso asterisco) tatuado no braço direito, todos os CDs, a maioria dos DVDs e livros, um guarda-roupa abarrotado de camisas do grupo de rock californiano e o canhoto de quatro ingressos de memoráveis shows no Brasil. Madrugou na sexta-feira à espera de Unlimited love nas plataformas de streaming e, logo após escrever estas linhas, peregrinou para ampliar a coleção com o lançamento.
É o 12° álbum de estúdio dos RHCP e o sexto com o guitarrista John Frusciante, cuja celebrada volta no lugar do seu pupilo, Josh Klinghoffer, ocorreu no fim de 2019, exatos dez anos após a sua segunda saída - John já tinha ficado ausente de 1992 a 1998, sendo substituído por Dave Navarro (do Jane's Addiction) no excelente One hot minute (1995). A pandemia retardou o retorno de fato, mas rendeu um bom tempo de imersão e gravações com o quarteto mais importante da trajetória de quase 40 anos do grupo: John, o vocalista Anthony Kiedis, o baixista Flea e o baterista Chad Smith.
Nos estúdios, retornou também a mítica figura de Rick Rubin, cuja discografia marcou era do hip hop ao metal e aqui nem cabe o tanto de trabalhos lendários. Rick e John estiveram juntos no Blood sugar sex magik (1991), Californication (1999), By the way (2002) e Stadium Arcadium (2006). O que, para quem conhece, já justifica toda a ansiedade acerca deste novo trabalho - além do hiato de quase seis anos desde o último disco do grupo, The getaway.
A volta de Frusciante, por si só, justifica ouvir os 73 minutos, divididos em 13 faixas, de Unlimited love em volume máximo e com bom fone de ouvido - consulte um otorrino, em caso de incômodo. A guitarra está visceral, especialmente em músicas como The heavy wing, The great apes, Black summer e These are the ways. Tem ainda uma pegada eletrônica, estilo do qual John vinha se aprofundando na carreira solo (que, por sinal, merece atenção).
Essas duas últimas canções, inclusive, são acompanhadas de ótimos videoclipes, marca registrada da banda. Black summer foi o primeiro single do disco e tem ares de Californication. O vídeo foi dirigido por Deborah Chow (da série The mandalorian e do filme Obi-Wan Kenobi, ambos do universo Star Wars). Já o clipe de These are the ways, dirigido por Malia James, foi lançado na sexta. Ele traz uma fuga da polícia com um quê de parkour de Anthony Kiedis e tem participações hilariantes de Flea e sua esposa, a estilista Melody Ehsani.
O vocalista, com 59 anos, mostra uma vitalidade invejável nos clipes e também no disco, com timbres bem marcantes e melódicos. Há até o desafio de como Kiedis irá decorar a letra de Poster child, com seus 5 minutos em versos não repetidos - ele que, em shows, costuma ter uns deslizes de memória.
Flea dispensa comentários. Mas se nos discos com Josh ele precisou colocar o baixo sempre em evidência, marcando cada início de canção, com John a história é diferente. É um entrosamento %u201Cde milhões%u201D, como diz a gíria, num alinhamento musical e de almas. E Chad Smith, na bateria, mostra toda sua versatilidade, de músicas pauleiras como Here ever after, ritmadas como Aquatic mouth dance e suaves como Not the one. Um conselho: não deixe de ouvir em modo repeat She%u2019s a lover, candidata a hit.
Muitos acharam o disco um compilado de vários momentos da banda. As três primeiras músicas lançadas, de fato, deram essa pista (principalmente Poster child, bem similar a Walkabout, do One hot minute). Mas Unlimited love vai muito além. Foge do atual mainstream e traz características e sons singulares, mas também resgata o funk-rock do qual se tornaram precursores e toda a magia vintage e um tanto %u201Cmoleque%u201D de quatro, antes de tudo, amigos. A volta de John é como uma volta pra casa, com o acolhimento de quem nem reparou o quanto o tempo passou.
CALÇADA DA FAMA
Na última quinta-feira, um dia antes do lançamento, a banda foi imortalizada com uma estrela na Calçada da Fama, o famoso passeio de Hollywood. Na sexta, além do álbum e videoclipe, o grupo performou no programas de Jimmy Fallon e Jimmy Kimmel.
A turnê da volta de Frusciante, adiada pela pandemia, começa agora, e com um setlist bem diferente do planejado para o retorno. Brasil? Ainda não há data para show no país. Mas este jornalista que vos escreve e até conseguiu ser um pouquinho imparcial na avaliação (ah, vai, dá um crédito%u2026) e uma legião de fãs aguardam com ansiedade.