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Crítica: Adoráveis Mulheres aborda amadurecimento e o drama da vida doméstica

Nas mãos de Greta Gerwig, Adoráveis mulheres chega à sétima adaptação para o cinema fazendo algo raro: criar um ar de novidade e explorar nuances narrativas numa obra já tão reiterada. A trama conta a história da jovem Jo March (Saoirse Ronan), que tem como sonho ser escritora. Ela vive com suas três irmãs - Meg (Emma Watson) tem potencial para ser uma grande atriz e quer casar, Amy (Florence Pugh) deseja crescer na pintura e Beth (Eliza Scanlen) é uma pianista virtuosa. Explorando descobertas, amadurecimento e conflitos com as concessões patriarcais em meio à Guerra Civil norte-americana, o longa é um dos lançamentos mais especiais da temporada e mescla com profundidade o “coming of age” (maioridade) ao drama da vida privada.
A abordagem dada à adaptação do clássico livro Little women (Mulherzinhas), de 1868, escrito por Louisa May Alcott, é, de uma certa maneira, uma continuidade do gesto feito por Greta em seu primeiro longa, Lady bird (2017). Se trata de um comentário sobre a transformação pessoal e o despertar artístico de uma jovem que, inserida em um contexto doméstico, busca assumir os riscos de se tornar uma artista. Dentro da direção e da roteirização, assim com Jo March e a protagonista de Lady bird, Gerwig também assume os riscos do fazer artístico, ao optar por uma obra tantas vezes adaptado para o cinema, utilizando uma estrutura narrativa não-cronológica e um elenco de estrelas, que além dos nomes já citados inclui Meryl Streep, Laura Dern, Timothée Chalamet e Louis Garrel. Ao fim, a diretora triunfa tanto ao acertar nas concessões quanto nas nuances afetivas e profundidade dada às personagens, mas fugindo do melodrama.
O sentimento de novidade para o longa não existiria sem a potência de seus jovens atores. Saoirse Ronan dá alma e carisma ao filme, junto com Florence Pugh, Eliza Scanlen e Emma Watson, que conseguem montar atuações bem específicas para cada personagem. Outro destaque entre o jovem elenco é Timothée Chalamet, que tem emplacado em vários papéis de relevância desde Me chame pelo seu nome (2017). Meryl Streep e Laura Dern cumprem as expectativas. Uma das qualidades do filme é o equilíbrio entre a comédia e o drama. Mas também sua capacidade de passar de instâncias de grande magnitude, para microgestos de tensão e afeto. Gerwig cria um filme que vai das dores ordinárias até grandes lutos e perdas. Essa amplitude é uma virtude que ganha respostas positivas com as atuações.
A diretora afirmou em entrevista ao Deadline que já tinha lido a obra original muitas vezes desde sua infância. “Para mim, foi o livro da minha infância em termos de identificação com uma personagem. Eu era ambiciosa, eu queria ser uma escritora, eu era feroz e eu queria ser artista. Tudo que Jo é, eu também era”, declarou. Esse amor e relação passional com livro estão presentes na adaptação, a ponto de existir um embaralhamento de alguns territórios: entre o livro e o filme, entre Greta, L. M. Alcott e Jo March. A protagonista é um alter ego de Alcott, mas se comunica perfeitamente com a obra e história da diretora. Tudo isso está posto através da história familiar, mas do despertar individual dessas mulheres em uma época extremamente conservadora. No final das contas, através de uma poética meta, o filme fala sobre ele enquanto conta as narrativas dessas três mulheres e tantas outras.
A obra
O livro foi traduzido no Brasil como Mulherzinhas. A obra possui um tom autobiográfico e foi publicada pela primeira vez em 1868. Ganhou dezenas de adaptações, desde os filmes silenciosos até uma ópera e um musical da Broadway. Little women foi um sucesso comercial e de crítica imediato, e o público pediu mais histórias sobre os personagens. Alcott escreveu um segundo volume, Good wives, que também foi um sucesso. Desde 1880, os dois volumes são publicados em um único livro. Depois, ganhou duas sequências: Little men (1871) e Jo’s boys (1886).
Adaptações no cinema
1917
Um filme mudo britânico, com Gaiety Girl Ruby Miller interpretando Jo. Hoje, ele se encontra perdido.
1918
A segunda adaptação surgiu apenas um ano depois, sendo essa americana. Foi gravada próxima à casa de Alcott, em Massachusetts. Dorothy Bernard foi a protagonista.
1933
A primeira adaptação com falas. O filme foi estrelado pela célebre Katharine Hepburn, atriz vencedora de quatro Oscar e indicada 12 vezes, sendo a maior premiada de todos os tempos. Foi bem popular entre a crítica e arrecadou grande bilheteria, em um período de dificuldade dos EUA no pós-Grande Depressão. Foi dirigido por George Cukor, responsável por filmes como Minha bela dama (1964) e Nasce uma estrela (1954).
1949
Já em cores, o longa de 1949 era repleto de estrelas. Entre elas June Allyson como Jo March, já famosa pelos filmes da MGM. Janet Leigh, conhecida pela icônica cena do chuveiro em Psicose, interpretou Meg March. Também contou com Elizabeth Taylor, como Amy March.
1994
A obra passou pelas mãos Gillian May Armstrong, primeira mulher a adaptar a obra. O elenco seguiu a tradição de reunir nomes importantes: Winona Ryder (Jo March), Kirsten Dunst (a jovem Amy), Samantha Mathis (Amy adulta), Trini Alvarado (Meg), Claire Danes (Beth) e Susan Sarandon (Marmee). O elenco masculino contou com Christian Bale como Laurie, e Gabriel Byrne foi o professor Bhaer. O longa foi indicado a três Oscar.