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Primeiro filme da Netflix vencedor do Oscar é provocante e perigosa denúncia sobre doping nos esportes
Documentário Ícaro revela bastidores do esquema responsável por banir a Rússia da Olimpíada

O ciclista amador, produtor e cineasta Bryan Fogel tinha uma interessante premissa para o primeiro documentário da carreira: pretendia burlar os exames antidoping e melhorar sensivelmente o desempenho no Haute Route, exigente circuito para ciclistas amadores realizada ao longo de setes dias nos Alpes Franceses, e expor o quão falho é o sistema de controle. Por ironia do destino, o argumento inicial não atingiu seu ápice, mas os desdobramentos puseram Ícaro, o primeiro filme da Netflix a vencer o Oscar de Melhor Documentário, no epicentro de uma perigosa e importante denúncia do esquema de doping atribuído à Rússia - o governo nega veementemente.
Os primeiros trechos da obra são dedicados ao projeto pessoal de Fogel, em parceria com Mark Monroe. Ele entrou em contato com o cientista norte-americano Don Catlin, fundador do Laboratório Olímpico da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), para elaborar um plano com as drogas necessárias para alavancar sua colocação da décima quarta posição, conquistada com muito esforço em 2014???, para uma marca superior no ano seguinte, mas sob orientação técnica capaz de fazê-lo passar incólume nos testes. O especialista declinou, temeroso da reação negativa do documentário, mas indicou para a delicada missão o chefe do laboratório antidoping da Rússia, Grigory Rodchenkov, suspensa pela Agência Mundial Antidoping (Wada) em 2015.
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Muitas conversas por aplicativos de chamadas, injeções e revelações confessadas com uma leveza quase ingênua, incompatível com a gravidade dos fatos, depois, o espectador é levado a acompanhar a cansativa maratona. Fogel falha, termina em vigésimo quarto lugar, e a premissa de Ícaro parece desmoronar, após mais de um ano de filmagens e investimento até então independente.
À reviravolta, atribui-se o melhor do filme, a partir de então centrado no hilário e caricato Rodchenkov, responsável por algumas risadas no decorrer do filme, enquanto confessa crimes diantes das câmeras. Em meio às gravações, estouram as primeiras suspeitas e denúncias sobre a promoção de trocas de amostras de urinas nos Jogos Olímpicos de Inverno de 2014, em Sochi, na Rússia. Com o agravamento da crise russa, na qual estão diretamente envolvidos o presidente Vladimir Putin e o ministro dos Esportes, Vitaly Mutko, posteriormente promovido a vice-primeiro ministro.
A postura inacreditavelmente despreocupada de Rodchenkov aos poucos é encoberta pela preocupação diante das denúncias. O otimismo risonho de quem cria plenamente na impunidade dá lugar à preocupação. Com nuances de thriller, ele suplica por uma passagem para os Estados Unidos e viaja sob medo de um ataque. Em solo norte-americano, ele entrega ao governo e ao jornal The New York times relatórios com datas e nomes de atletas e autoridades envolvidos no esquema patrocinado pelo governo desde a década de 1980, garante ele.
Um dos nomes por trás das históricas conquistas da Rússia em Olimpíadas, Rodchenkov se tornou, a partir das revelações, peça-chave na investigação dos escândalos responsáveis por levar o Comitê Olímpico Internacional a banir a equipe de atletismo da Olimpíada do Rio de Janeiro, em 2016, e o país das Olimpíada de Inverno de Pyeongchang, realizada em fevereiro deste ano, na Coreia do Sul. O preço pago foi alto: inserido no programa de proteção à testemunha dos EUA, não pode ver a família ou mesmo comparecer à cerimônia de premiação do Oscar.
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