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Construtora na lista suja do trabalho escravo recebeu mais de R$ 467 milhões de contratos públicos em Pernambuco
F.R.F Construções já fechou negócio com Governo do Estado e ainda tem contratos em curso com as prefeituras do Recife, Ipojuca e Paulista
Incluída na lista suja do trabalho escravo em abril, a empresa F.R.F Construções já recebeu mais de R$ 467 milhões de dinheiro público em Pernambuco nos últimos dez anos. O levantamento do Diario de Pernambuco foi feito com base em dados do Tribunal de Contas (TCE-PE).
O balanço também mostra que a F.R.F Construções ainda tem contratos em vigência com as prefeituras de Recife, Paulista e Ipojuca. Esses acordos, que somam R$ 134.561.916,43, foram mantidos mesmo após a ação do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), realizada no ano passado, que resgatou 24 trabalhadores da empresa em situação análoga à escravidão. Os municípios alegam que os contratos são anteriores ao episódio.
A fiscalização do MTE aconteceu nos dias 19 e 20 de agosto de 2024, em alojamentos da construtora em Ipojuca, no Litoral Sul. De acordo com o processo, os funcionários não tinham equipamento de proteção e viviam em recintos lotados, sem água mineral e em condições precárias de higiene.
A empresa assinou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) proposto pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) no mesmo mês. Sediada no Recife, a F.R.F Construções tem o empresário Fernando Correa de Araújo como sócio-administrador, além de Paulo Henrique Correia de Araújo e Rodrigo Pessoa Dias Fernandes como sócios, segundo declaração na Receita Federal.
Atualmente, a F.R.F Construções mantém sete contratos em vigor com órgãos municipais. Cinco deles foram celebrados com a Prefeitura do Recife e têm valor total de R$ 108.221.713,39. Em nota, a gestão João Campos (PSB) afirma que “está verificando uma possível repercussão nos contratos existentes”.
Os serviços são prestados para a Autarquia de Manutenção e Limpeza Urbana do Recife (Emlurb), a Autarquia de Urbanização do Recife (URB) e o Gabinete de Gerenciamento do Programa de Requalificação e Resiliência Urbana em áreas de Vulnerabilidade Socioambiental (Promorar).
No dia 7 de abril, uma das obras realizadas pela empresa a serviço da URB teve as contas julgadas irregulares por auditoria especial do TCE-PE. Após verificar a existência de descarte irregular de resíduos no serviço, a Corte de Contas determinou que a construtora devolvesse R$ 175.169,91 aos cofres públicos.
Já a Prefeitura de Ipojuca, onde os trabalhadores foram resgatados, possui um contrato com a empresa, válido até 23 de dezembro, no valor de R$16.014.246,29. Em Paulista, um serviço com custo de R$ 10.325.956,75 deve ser concluído até o dia 18 de setembro de 2025.
Histórico
Segundo o levantamento, a F.R.F recebeu o total de R$ 435.309.739,67 de municípios e mais R$ 32.615.561,52 do Governo do Estado nos últimos dez anos. Do montante, o maior pagamento foi realizado em 2023 pela gestão municipal de Ipojuca, que desembolsou R$ 10.371.415,07 em obras de drenagem.
Já o governo estadual contratou a F.R.F para 52 serviços no período. O mais caro aconteceu em 2022 e diz respeito à execução das obras de adequação, implantação e pavimentação da Rodovia Vicinal VPE-077 no distrito de Apoti, em Glória do Goitá, na Zona da Mata, que custou R$ 8.529.523,62. A contratação foi solicitada pelo Departamento de Estradas e Rodagens (DER-PE).
O Diario teve acesso aos autos do processo em que constam depoimentos dos trabalhadores resgatados dos alojamentos da construtora. De acordo com eles, os recintos eram superlotados e não dispunham de água mineral. Ventiladores, colchões e eletrodomésticos foram adquiridos pelos próprios funcionários. A empresa não fornecia roupa de cama, travesseiro, papel higiênico e materiais de higiene.
A limpeza era realizada pelos próprios trabalhadores, que não recebiam autorização para higienizar o ambiente durante o expediente. Segundo os relatos, a F.R.F oferecia uma cesta básica com 5 kg de feijão, 5 Kg de arroz, 5 Kg de açúcar, 5 Kg de fubá, um kg de sal, cinco pacotes de macarrão, duas garrafas de óleo, um pacote de café, um pacote de biscoito, uma lata de sardinha e apenas 400 g de charque.
Ao assinar o TAC proposto pelo MPT, a empresa se compromete a fornecer água potável, filtrada e fresca para os trabalhadores, bem como garantir a instalação de alojamentos com cozinha, local para refeição, instalação sanitária, lavanderia e área de lazer.
Ainda segundo o TAC, a F.R.F deve fornecer colchões, lençóis, fronhas, cobertores e travesseiros limpos e higienizados. O acordo prevê ainda o pagamento de indenizações por danos morais coletivos e individuais.
No dia 30 de setembro de 2024, já após o acordo, o MPT instaurou inquérito civil para dar continuidade à apuração das irregularidades denunciadas.
Entes públicos
Por meio de nota, o Governo de Pernambuco e a prefeitura de Paulista alegaram que os contratos foram firmados antes da inclusão da F.R.F na lista suja do trabalho escravo. Por sua vez, a Prefeitura de Ipojuca afirmou que a empresa foi contratada pela antiga gestão mediante processo licitatório.
Já a Prefeitura do Recife confirma que está verificando a possibilidade de rever os contratos em vigor. A administração municipal informou que a avaliação leva em conta as circunstâncias de cada contrato e a legislação em vigor, “observando sempre o direito ao contraditório e à ampla defesa”.
A reportagem tentou contato com a F.R.F Engenharia, por e-mail e telefone, desde o dia 24 de abril. Às 14h48 desta sexta-feira (2), já após a publicação da matéria, a empresa emitiu resposta e negou irregularidade.
Confira as notas na íntegra:
Prefeitura de Paulista:
“A Prefeitura do Paulista, por meio da Secretaria de Licitações, Compras e Contratos, informa que o contrato com a empresa FRF Construções, inscrita no CNPJ 07.693.988/0001-60, foi celebrado no ano de 2023.
Conforme prevê a legislação vigente, a participação de empresas em processos licitatórios está condicionada à apresentação de certidões e documentos que atestem sua regularidade, incluindo a inexistência de impedimentos legais. Caso haja decisão judicial ou administrativa determinando a inabilitação da empresa em razão da prática de trabalho análogo à escravidão, tal impedimento será verificado no momento da análise documental.
Destaca-se que denúncias oriundas do Ministério Público, da Justiça do Trabalho ou da secretaria municipal responsável pela contratação podem resultar na revogação do contrato, desde que haja justa causa comprovada. Em situações como essa, é possível a rescisão contratual com a devida apuração e responsabilização, inclusive com eventual ressarcimento ao erário, se houver prejuízo decorrente da revogação.
A Prefeitura reforça seu compromisso com o respeito aos direitos trabalhistas e repudia qualquer prática que viole a dignidade do trabalhador”.
Prefeitura de Ipojuca:
“A Prefeitura do Ipojuca informa que a empresa FRF Engenharia Ltda. foi contratada pela antiga gestão mediante processo licitatório. Atualmente a empresa tem executado os contratos firmados com o município em conformidade com as cláusulas pactuadas, obedecendo aos critérios de fiscalização e medição dos serviços contratados.
No que diz respeito à informação de que a empresa foi incluída no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravidão, após tomar conhecimento, a administração municipal está tomando as medidas administrativas para apurar os fatos.
Destaca-se, ainda, que é de conhecimento público que a FRF Engenharia mantém contratos vigentes com outras esferas da administração pública, incluindo prefeituras e com o próprio Governo do Estado de Pernambuco.
Nesse cenário, ao tempo em que reconhece a necessidade de respeito ao contraditório e ampla defesa, a Prefeitura do Ipojuca reforça seu compromisso com a legalidade, responsabilidade social e o respeito aos direitos trabalhistas, de sorte que ulteriores contratações estarão condicionadas à análise técnico jurídica dos órgãos competentes,
responsáveis por definir se a licitante reúne as condições necessárias para a pretendida contratação, em observância à legislação vigente”.
Prefeitura do Recife
“A Prefeitura do Recife informa que tomou conhecimento do assunto e está verificando uma possível repercussão nos contratos existentes, levando em conta as circunstâncias de cada um e a legislação em vigor, bem como observando sempre o direito ao contraditório e à ampla defesa”.
Governo de Pernambuco
“A respeito do Relatório de Empenhos Estaduais com a empresa FRF Construções, o Governo de Pernambuco informa que a contratação da empresa pelo Departamento de Estradas de Rodagem de Pernambuco (DER-PE), na atual gestão, ocorreu antes de 2025, ano em que a empresa foi incluída na lista de empregadores que mantêm trabalhadores em condições análogas à escravidão.
O DER-PE informa que dos cinco contratos iniciados entre 2023 e 2024, por meio de processos licitatórios regulares e de acordo com a legislação vigente, três se encontram encerrados e dois em fase encerramento, sem frentes de obras ativas ou novos serviços em execução. Apesar de um dos contratos ir até junho de 2025, as obras já foram totalmente concluídas, restando apenas a etapa de garantia contratual.
Todos os demais contratos que constam na lista encaminhada pela reportagem foram em anos anteriores à atual gestão”.
F.R.F
"A FRF CONSTRUÇÕES LTDA, em atenção à matéria recentemente publicada
e à repercussão dos fatos relacionados à Ação de Fiscalização Mista realizada pelo
Ministério Público do Trabalho (MPT) e pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE),
nos dias 19 e 20 de agosto de 2024, vem a público esclarecer que considera precipitado qualquer julgamento quanto à alegação de submissão de trabalhadores a condições análogas à escravidão. A empresa nega veementemente tal prática, reafirmando que não se verificaram os requisitos legais previstos no artigo 149 do Código Penal Brasileiro para tal enquadramento.
Cabe destacar que, embora a fiscalização tenha ocorrido no âmbito da chamada
operação de combate ao trabalho escravo, em relação à FRF CONSTRUÇÕES LTDA, as constatações limitaram-se a aspectos estruturais e de higiene dos alojamentos, os quais, embora importantes, não caracterizam, sob nenhuma ótica legal ou jurisprudencial, trabalho em condições análogas à escravidão.
Não houve qualquer relato de cerceamento da liberdade de locomoção, jornada
exaustiva, trabalho forçado, servidão por dívida ou quaisquer outras condutas típicas de situações graves dessa natureza.
Ademais, é importante ressaltar que a empresa firmou, de maneira célere e
colaborativa, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) perante o Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho e Emprego, documento este que foi integralmente cumprido. Todas as obrigações nele previstas foram rápida e fielmente executadas, assim como comprovadas documentalmente, demonstrando o comprometimento da empresa com a regularização das condições apontadas.
Dentre as irregularidades apresentadas, o auto de infração que originou de forma
indevida a inclusão da FRF CONSTRUÇÕES LTDA no Cadastro de Empregadores que
Submeteram os Trabalhadores a Situação Análoga à Escravidão, consiste na ausência de decisão que determine a citada inclusão, sendo, portanto, a empresa impedida de exercer o direito ao contraditório e da ampla defesa, estando a empresa no mercado há 20 (vinte) anos, sem, contudo, jamais ter sido notificada de algo sequer semelhante.
A inclusão da empresa no referido cadastro, sem decisão administrativa formal,
sem notificação prévia e sem o devido contraditório, configura-se não apenas ilegal, mas profundamente lesiva à sua reputação, causando impactos irreparáveis à sua reputação e compromissos institucionais, sobretudo por atuar em contratos com o setor público.
Por tais razões, informa que tal celeuma se encontra em discussão na esfera
judicial, a fim de que seja aplicado o que determina a Instrução Interministerial nº
18/2024, nos arts. 6º e 7º, onde consta que, A EMPRESA QUE SE ENCONTRA SOB
TAC, NÃO PODERÁ SER INCLUÍDA EM CADASTRO DE EMPREGADORES
QUE TENHAM SUBMETIDO TRABALHADORES A SITUAÇÃO ANÃLOGA À
ESCRAVIDÃO, e sim, no máximo, constar junto ao CEAC – Cadastro de
Empregadores em Ajuste de Conduta e, mesmo assim, sem qualquer vinculação à
prática de trabalho escravo.
Diante do cumprimento integral do TAC, da ausência de qualquer prática que
configure trabalho análogo à escravidão, e dos vícios formais na inclusão da empresa no referido cadastro, a FRF CONSTRUÇÕES LTDA reforça seu compromisso com o respeito às normas trabalhistas e com a dignidade de seus trabalhadores. Requer, portanto, que os veículos de comunicação atuem com responsabilidade, evitando julgamentos precipitados ou generalizações que possam comprometer a imagem e a sobrevivência de uma empresa que gera mais de 700 empregos diretos e há 20 anos contribui com o desenvolvimento regional".