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Avenida Norte, celeiro de memórias

Há 40 anos, o aposentado Fernando José dos Santos, 67, admira, sentado em uma cadeira de balanço, o fluxo de carros e pessoas na Praça de Sítio Grande, na Avenida Norte. Os dias e horários são certos: de segunda a sexta-feira, sempre das 5h às 17h. Fernando nasceu e cresceu em Nova Descoberta, um dos bairros às margens da avenida, uma das mais importantes do Recife. Seus nove quilômetros de extensão cortam sete bairros e margeiam outros cinco.
“Antes de me aposentar eu lavava carros no entorno dessa praça. Passei a minha juventude vendo pessoas indo e vindo por essa avenida. Aquilo me cativou de um jeito que jamais pensei em sair daqui. Sigo marcando presença nessa grande Avenida Norte”, conta Fernando dos Santos.
A Avenida Norte é um celeiro de memórias. O traçado segue a extinta linha férrea Great Western, que ia até à cidade de Limoeiro, na Mata Norte do estado, e desativada na primeira metade do século 20. A via liga o bairro da Macaxeira ao de Santo Amaro e ao do Recife, pela Ponte do Limoeiro. Passa ainda pelo Torreão, Encruzilhada, Rosarinho, Tamarineira e Casa Amarela.
Parte do corredor da avenida é considerada mista, formada por residências e pontos comerciais que dividem o mesmo espaço. O corredor também margeia praças como a Castro Alves, a do Rosarinho e a do Trabalho. Próximo à BR-101, onde ela termina, fica o Parque Urbano da Macaxeira.
Edson Gomes, 78, mora há 50 anos em uma casa deixada de herança pelo pai, na Praça Largo Dom Luiz, sentido Terminal da Macaxeira. A avenida - além da casa - é, para ele, uma herança imensurável. “Recordo que papai falava muito dessa avenida. Era privilégio, na época, morar em uma avenida que fornecesse acesso fácil a qualquer coisa. Entre conversas e confraternizações em bares na avenida, fiz muitos amigos que já se foram, mas ainda estou aqui para contar história. Daqui só saio se for para o Cemitério de Casa Amarela”, conta Edson, que chegou à avenida quando ainda fazer possível ver a linha ferroviária que passava pelo corredor.
Se engana quem pensa que a avenida desperta sentimentos apenas em nativos. O argentino Carlos Ezequiel Vannone, 57, chegou ao Recife em 1988 a trabalho. “Cheguei a morar nas Graças, passei por Casa Forte e, por fim, Avenida Norte. Não há melhor lugar para se morar. A diversidade é muito grande. Daqui não saio”, diz.
Por cortar bairros populares, muitos ciclistas costumam utilizar as duas faixas da via para ir e voltar do trabalho. Próximo ao cruzamento que liga a Avenida Norte a um trecho do bairro de Casa Amarela está a residência de Adalgisa Rodrigues Silva, 85. Ela conta que saiu do Morro da Conceição, local onde morava, para uma casinha próxima ao corredor. “Parei aqui por acaso. A minha casa desabou junto com uma barreira no morro e, depois disso, não retornei. Aprendi a amar essa avenida com todo o meu coração e não escondo isso de ninguém.” Para quem vive a Avenida Norte de perto, morar nela é como estar no coração do Recife.