Vida Urbana

Pré-vestibular para transexuais e travestis abre portas à população marginalizada

Projeto Educar é Transformar tem como intuito democratizar acesso ao ensino superior para pessoas LGBTTI

Primeira aula do curso pré-vestibular voltado para pessoas trans. Foto: Marlon Diego/Esp.DP

Entre agressões de colegas de sala e preconceito dos professores e dirigentes, Shanaya Rayssa, 24, mulher trans e negra, conseguiu concluir o ensino médio em uma escola pública do Recife. Depois de receber o diploma, ela tentou prestar vestibular duas vezes, mas desistiu em ambas por não conseguir conciliar os estudos com o emprego, a prioridade. “Eu precisava sobreviver e não conseguia estudar e trabalhar ao mesmo tempo, então acabava sempre escolhendo o emprego”, lamenta ela. A falta de perspectiva de Shanaya começou a ser revertida neste sábado (12), com a aula inaugural do projeto Educar é Transformar, curso pré-vestibular gratuito, do qual ela agora faz parte, destinado prioritariamente a transexuais, travestis, gays, lésbicas, bissexuais e pessoas de baixa renda da capital pernambucana.

 

A ação é organizada pelo Movimento Rua - Juventude Anti-capitalista do estado, que recebeu inscrições de aproximadamente 60 alunos e quase 100 professores voluntários, organizados para lecionar assuntos-chave do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) dentro dos tópicos linguagens, matemática, ciências humanas e da natureza, além da redação. O curso se estenderá até novembro - com encontros aos sábados, das 13h às 17h, no Demec (R. do Hospício, 762) -, e também se preocupa com o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja), que permite que pessoas que deixaram os estudos concluam o ensino médio. "O projeto é fundamental visto que a população de baixa renda, de negros e negras e a população LGBT, sobretudo de trans e travestis, já sofre um processo de marginalização dentro do próprio ambiente escolar. Evasão, inclusive, das pessoas trans e travestis não é necessariamente por livre escolha. Ocorre compulsoriamente devido ao processo de bullying, de preconceito, sofrido na escola, que é só mais um ambiente de opressão", detalha Igor Andrade, um dos idealizadores da iniciativa. Diferentemente do caso de Shanaya, que trocou o desejo de cursar administração por ciências sociais por medo de sofrer preconceito, as escolas brasileiras registram evasão de 82% de travestis e transexuais, de acordo com a Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Os números alarmantes são reflexo dos ambientes hostis proporcionados pela discriminação de alunos e funcionários, situação que leva essas pessoas a buscar outras fontes de renda, como a prostituição. 

Dante Chacon, de 16 anos, foi agredido ao tentar usar banheiro masculino. Foto: Marlon Diego/Esp.DP

Perlla Martins, 33, se submeterá à prova para valer e espera conquistar uma vaga no curso de farmácia. Ela esclarece que, “felizmente”, nunca recorreu à prostituição para sobreviver, mas já vendeu bolsas, sapatos, atuou como cabeleireira e atualmente trabalha no setor administrativo de uma unidade de saúde, experiência que motivou a escolha profissional. “Precisei abandonar meus estudos, não tive mais como. Surgiu essa oportunidade agora e espero resgatar o que ficou para trás”, diz ela. Para pessoas como Shanaya, Dante e Perlla, a informação não é apenas a melhor arma contra o preconceito, como diz o ditado, mas se mostra como a principal saída da marginalidade e do esquecimento histórico. 

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