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Nem acenos de Fux devem mudar julgamento de Bolsonaro

Ministro votou para abrir ação penal contra ex-presidente e aliados, mas apresentou divergências que alentaram advogados de defesa. Especialistas avaliam que, apesar da postura do magistrado, dificilmente ocorrerão mudanças significativas no trâmite do processo

Expectativa é de que o ministro Luiz Fux acolha, ainda que parcialmente, teses dos réus no julgamento do mérito do processo

Os posicionamentos do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e aliados, acenderam a esperança nas defesas dos réus da trama golpista. O magistrado acompanhou o voto do ministro relator Alexandre de Moraes pela abertura da ação penal, porém, apresentou divergências sobre a apreciação do caso ocorrer na Primeira Turma e questionou a dosimetria de pena para os extremistas do 8 de Janeiro.

Na avaliação de especialistas ouvidos pelo Correio, apesar dos acenos, Fux é voto vencido na Corte, e seus posicionamentos não devem surtir efeito no trâmite ou no resultado do processo.

O advogado e analista político Melillo Dinis destaca que as divergências são parte da força das decisões coletivas. Ele minimiza o entusiasmo da defesa por causa da discordância do magistrado.

"Diante da complexidade do caso submetido à Primeira Turma, é importante que sejam oferecidos todos os pontos de vista jurídicos, entre eles, o do ministro Fux, uma das vozes mais importantes da atual composição da Corte", diz. "Suas ponderações partem de um amplo campo jurídico, que ele descortinou com muita argúcia. É uma linha de condução, e sua magistratura é muito sólida. Fora disso, qualquer avaliação sobre o que ele decidirá é meramente aposta", completa.

O cientista político André César também aponta que, apesar dos acenos, os posicionamentos de Fux não devem alterar o trâmite nem o resultado da ação penal. "No limite, pode atrasar o processo, mas não vai ser mais que isso. No julgamento final, eu não creio que ele vá divergir mais do que isso", conclui.

Por unanimidade, a Primeira Turma do STF transformou em réus o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete aliados por tentativa de golpe de Estado. Integrantes do colegiado, Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin seguiram integralmente o voto de Moraes.

Fux, no entanto, manifestou preocupações sobre a tipificação de delitos definidos pela PGR e a dosimetria das penas que poderão ser aplicadas em caso de condenação. Um dia antes da sessão na Turma, ele suspendeu o julgamento da cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que pichou "perdeu, mané" na estátua A Justiça durante os atos golpistas de 8 de janeiro.

Ela está presa desde 17 de março de 2023, após ser detida durante a Operação Lesa-Pátria. Moraes propôs a pena de 14 anos de prisão.

"Julgamos sob violenta emoção após a verificação da tragédia do 8 de Janeiro. Eu fui ao meu ex-gabinete, que a ministra Rosa (Weber) era minha vice-presidente, vi mesa queimada, papéis queimados. Mas eu acho que os juízes na sua vida têm sempre de refletir dos erros e dos acertos", ponderou Fux.

Delação de Cid

No julgamento, os ministros também comentaram sobre a delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência. Os magistrados concordaram que a validade da colaboração seria discutida após o recebimento da denúncia, durante a ação penal.

No entanto, segundo Fux, era a preliminar mais complexa sob análise, e mostrou ressalvas em relação à delação. "Há uma regra de que quem participa do processo tem que fazer de boa-fé. E delação premiada é algo muito sério. Nove delações representam nenhuma delação. Tanto houve omissão que houve nove delações", disse.

Na sessão, os advogados dos acusados questionaram o fato de o caso ser julgado pela Primeira Turma e não pelo plenário da Corte. O processo ficou no colegiado devido a mudanças internas do STF. Em 2023, foi restabelecida a competência das Turmas para analisar casos penais, ou seja, investigações e processos em que se apura se houve crime. Apenas Fux divergiu dos demais ministros, pois, segundo ele, a dimensão do caso exige a apreciação dos 11 integrantes.

“Essa matéria não é tão pacífica assim, foi mudada e remudada. No meu modo de ver, se fosse tão pacífica… depois da mudança do regimento, dias atrás, fui vencido. Ou estamos julgando pessoas que têm prerrogativa, e o local correto seria o plenário do Supremo Tribunal Federal", frisou, ao votar. "O fato de que há inúmeras ações decorre exatamente de que o número de partes envolvidas é multitudinário.”

Na avaliação do advogado criminalista Henrique Attuch, mesmo apresentando divergências, Fux é voto vencido. “O ministro já sinalizou ter aderido a algumas das bem fundamentadas teses defensivas, embora tenha restado vencido quanto aos pontos que levantou durante a sessão de julgamento relativa ao recebimento da denúncia da PGR”, destaca.

Para a advogada Karolyne Guimarães, especialista em direito penal, todas as divergências do ministro são válidas. "Ele entende que há indícios, mas que é preciso averiguar melhor as circunstâncias para verificar a credibilidade das provas, a comparação de uma prova com outra, a base. Tudo isso para ver se realmente é possível que essa delação seja subsidiada também por outras provas", aponta.

Especialista em direito processual civil, o advogado Wagner Roberto Ferreira Pozzer enfatiza que o integrante da Suprema Corte atua dentro dos limites da lei. "A eventual reavaliação desses aspectos, ainda que possa gerar expectativa entre outros réus, não se confunde com impunidade: reafirma o compromisso do Judiciário com um julgamento justo, mesmo diante de condutas graves", diz.

Próximos passos

Com a instauração da ação penal no Supremo, haverá a fase de produção de provas por parte da acusação e dos advogados de defesa. Nesse momento, serão coletadas materialidades, realizadas oitivas de testemunhas e analisados todos os documentos que possam reforçar ou enfraquecer a acusação.

O primeiro grupo julgado é chamado de “núcleo crucial” na denúncia e abrange a cúpula do governo Bolsonaro. O documento aponta o ex-presidente como o "líder da organização criminosa". Também viraram réus na ação os ex-ministros Walter Braga Netto, Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Anderson Torres; o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Abin; o ex-comandante da Marinha Almir Garnier e Mauro Cid.

No mês passado, a PGR denunciou 34 pessoas, divididas em quatro núcleos, por estimularem e realizarem atos contra os Três Poderes e contra o Estado Democrático de Direito. Segundo o órgão, o ex-chefe do Planalto tinha ciência e participação ativa em uma trama golpista para se manter no poder e impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Também é apontada uma trama para o assassinato de autoridades e o apoio aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 como a última cartada do grupo criminoso.

As informações são do Correio Braziliense.

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