LUTO
Bye bye, Cacá: Brasil se despede de um de seus maiores cineastas
Viver relembra trajetória e impacto da obra do diretor de 'Bye Bye Brasil', 'Xica da Silva' e 'Deus é Brasileiro', entre outros clássicos do cinema nacional
Por: André Guerra
Publicado em: 15/02/2025 06:00
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Globo/Divulgação |
Ontem o Brasil já acordou se despedindo de uma lenda da sétima arte que produziu ao longo de grandes ciclos da história do cinema brasileiro. Considerado um dos fundadores do Cinema Novo, o mais famoso e influente movimento cinematográfico do país, Cacá Diegues se foi, aos 84 anos, no Rio de Janeiro, em decorrência de complicações cardiovasculares durante uma cirurgia, deixando dois filhos vivos (do primeiro casamento, com Nara Leão) e sua esposa, a produtora Renata Almeida Magalhães (com quem teve uma filha, falecida aos 34 anos, em 2019).
O diretor chegou a rodar no Recife, em Brasília Teimosa, várias cenas de Deus é Brasileiro (2002), um de seus trabalhos de maior sucesso e cuja continuação, Deus Ainda é Brasileiro, estava sendo finalizada por ele e com previsão de lançamento para o segundo semestre deste ano.
Nascido em Maceió, o cineasta Carlos José Fontes Diegues se mudou para o Rio de Janeiro ainda criança com a família, e na cidade maravilhosa, anos mais tarde, estabeleceria a sua influência ao lado de outros nomes lendários como Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirszman, Paulo Cesar Saraceni e Walter Lima Jr, que mudaram para sempre a linguagem do audiovisual brasileiro e a força dos temas políticos e sociais abordados no cinema nacional.
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'Bye Bye Brasil' (1979) é um dos trabalhos mais conhecidos da obra de Cacá. |
Entre os filmes marcantes do começo da carreira de Cacá, destacam-se Cinco Vezes Favela (1962), do qual ele dirigiu o segmento Escola de Samba Alegria de Viver, A Grande Cidade (1966) e Quando o Carnaval Chegar (1969), escrito em parceria com Chico Buarque. Eternizando o nome da atriz Zezé Motta, ele lançou Xica da Silva em 1976, um dos grandes clássicos brasileiros, seguido pelo multi-premiado Chuvas de Verão (1977) e pela comédia antológica Bye Bye Brasil (1979), com as atuações inesquecíveis de José Wilker e Betty Faria.
O último filme do diretor a ganhar as telas foi o drama de época O Grande Circo Místico (2018), escolhido como representante brasileiro daquele ano na disputa pelo Oscar.
Kleber Mendonça Filho, parceiro de vários trabalhos de Cacá, se manifestou, destacando a honra de ter o nome do mestre nos créditos de dois de seus filmes. “Cacá era o mais forte elo entre a geração do Cinema Novo e as novas gerações que fazem o cinema brasileiro. O interesse, a curiosidade e a militância sempre a favor dos filmes feitos no Brasil se juntam à sua filmografia marcante. Bye Bye Brasil é uma fonte de inspiração enorme para mim. Que alegria imensa tê-lo nos créditos de Aquarius e Bacurau como produtor associado”.
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'Xica da Silva' eternizou Zezé Motta nos cinemas (Divulgação) |
Outros cineastas pernambucanos se manifestam sobre perda. “O mestre partiu para a eternidade. Cacá era um homem extremamente doce e gentil, sobretudo, com as novas gerações. Vai fazer muita falta. Deixa uma saudade tamanha que será preenchida com os seus grandes filmes”, lamentou Lírio Ferreira (Baile Perfumado).
Marcelo Gomes (Cinema, Aspirinas e Urubus) reafirma a importância histórica do diretor alagoano. “O cinema do Cacá é um cinema preocupado em retratar a alma brasileira, com todos suas contradições, desejos, sonhos. Acho que posso dizer que o Cacá era o cineasta da alma brasileira por excelência. Uma perda irreparável para o cinema e para a nossa cultura”, enaltece.
"Foi um grande privilégio termos contado com Cacá Diegues na história do cinema brasileiro. Esse dia que a gente perde um mestre como ele é um dia para refletirmos sobre nosso cinema como um todo, porque o tipo de produção que ele seus colegas da época instauraram aqui foi de enorme importância artística, que buscava uma conscientização social. Eram filmes ativistas, que pensavam a sociedade através do cinema", pontua ainda a diretora Renata Pinheiro (Carro Rei).
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'Deus é Brasileiro' teve diversas cenas rodadas no Recife, em Brasília Teimosa (Divulgação) |
“É muito triste e repentina essa notícia principalmente porque Cacá era um diretor extraordinário que estava em atividade e me interessava demais saber o que ele estava preparando. Seus filmes e personagens estão cravados como grandes provocadores da cinematografia brasileira. Suas cenas e personagens transformaram a iconografia brasileira e marcaram gerações. Assistir Xica da Silva e Bye Bye Brasil me emociona imensamente ainda hoje”, afirma a Letícia Simões (cineasta de A Vida Secreta de Meus Três Homens).
"Cacá participou ativamente de atividades cineclubista. Abraçou a capital carioca como sua cidade do coração e de lá construiu uma filmografia sólida composta ainda pelos projetos coletivos e outros como ator e produtor. Soube retratar a diversidade brasileira em obras marcantes e deixa um legado dos mais inspiradores para as novas gerações. Ele que sempre teve um grande amor por nosso país e por nossa cultura", reafirma ainda o crítico de cinema Marden Machado.