"É hora de buscar estratégias de alegria", diz Denise Fraga após ano intenso no cinema e no teatro
Em entrevista ao Diario, Denise Fraga comenta sobre como os trabalhos de 2025 dialogam com suas ideias mais profundas
Dezenas de filmes e montagens teatrais compõem o enorme currículo de Denise Fraga, que viveu, em 2025, um ano transformativo. Não por acaso, seus últimos lançamentos refletiram vários dos seus sentimentos mais profundos e existenciais, além da sua própria necessidade de canalizá-los.
Em agosto, a atriz carioca lançou, no 53º Festival de Cinema de Gramado, a polêmica comédia dramática Sonhar com Leões, dirigida por Paolo Marinou-Blanco, na qual interpreta uma mulher com câncer terminal em uma desesperada busca por eutanásia. Já em dezembro, entrou em cartaz o seu poético drama Livros Restantes, dirigido por Marcia Paraiso (ainda em cartaz no Recife), em que vive uma professora decidida a devolver livros com dedicatórias às pessoas que lhe presentearam com eles.
Ainda este ano, ela seguiu com seus famosos espetáculos Eu de Você, um monólogo com narrativa e poesia, e O que Sabemos Juntos, um dueto com Tony Ramos e interações com a plateia — ambas desenvolvidas em parceria com o produtor José Maria e o diretor Luiz Villaça.
Em entrevista exclusiva ao Diario, Denise descreve como sua percepção sobre a vida está, de certa maneira, entrelaçada nas obras que escolhe para trabalhar. Ela destaca especificamente como o prazer e a felicidade se tornaram prioridade em sua agenda.
Entrevista com Denise Fraga:
Como 2025 te ajuda a enxergar o atual momento da sua carreira e da sua vida pessoal, se é que, neste caso, é possível separar as duas coisas?
Desde que fiz 60 anos, em 2024, tenho vivenciado um momento de reinauguração pessoal e tenho dito que 2025 foi o ano em que vivenciei o primeiro ano do resto da minha vida. Coincidentemente, essa fase começou junto com a decadência física da minha mãe e, quando eu a perdi, passei a querer falar ainda mais sobre a vida, sobre a importância de ser feliz, de, sobretudo, viver como se fôssemos morrer. E acho que vivemos muito como se não fôssemos. Esses projetos que abracei têm bastante a ver com isso.
Sonhar com Leões tem muitas coisas em comum nesse diálogo com a valorização de cada instante e sobretudo dos afetos, não é?
Com certeza, porque é um filme que enfatiza como a gente precisa falar de finitude para falar da vida e da urgência da felicidade nesta vida inventada que a gente resolveu topar. Acho estranho que tenhamos embarcado tanto na ideia de que prosperidade e sucesso não devem vir junto com felicidade. É hora, inclusive, de tirar projetos antigos da gaveta e buscar estratégias de alegria. Claro que o ganha-pão é um fiel da balança, mas não é a única coisa que existe.
Com essa premissa de devolver os livros, o Livros Restantes acaba falando de vários assuntos mais gerais do Brasil. Como você acha que ele conversa com a suas próprias ideias sobre a vida e sobre o país?
Acho que chega um ponto na carreira em que a gente decide fazer aquilo que faz sentido para nós. No caso do Livros Restantes, uma das camadas que eu mais gosto é sobre esse tema da memória. O Brasil tem muita dificuldade com esse assunto. Você precisa entender quem você é para se fortalecer. Não é um filme que fala diretamente do país, mas, através dessa protagonista, Marcia [diretora], acaba comentando sobre a importância de olharmos para nós mesmos e para o nosso passado até para poder avaliar quais ancestralidades que queremos levar adiante. Elas são uma herança, sim, mas não uma condenação.
Quais as principais reflexões que ficaram com você a partir desses projetos em que se envolveu no teatro e no cinema?
Tanto essas temporadas das peças quanto os filmes que tenho feito dialogam, às vezes de forma mais sutil ou mais direta, com a ideia do preconceito. Vivemos em um turbilhão tão louco de informações nesse tribunal digital da internet que a vida exige de nós cada vez mais um tempo para reflexão. E por isso defendo tanto que o teatro seja ensinado e incentivado nas escolas, porque ele ensina a se colocar na pele do outro. A coisa mais linda é ver alguém que não é ator tentando encontrar um personagem, ou seja, exercitando a empatia, tentando acionar aquilo que não é dele. A arte faz a gente entrar em contato com esse mundo tão desigual. Acho que esses trabalhos de 2025 me fizeram me reconectar com todas essas ideias de forma muito intensa.