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'Avatar: Fogo e Cinzas' compensa falta de novidade com urgência do espetáculo

Terceiro filme da saga 'Avatar' estreou no Recife nesta quinta-feira (18)

Por Andre Guerra

Para todo o sucesso inequívoco de Avatar e Avatar: O Caminho da Água, respectivamente lançados em 2009 e 2022, o público frequentemente se divide entre o deslumbramento irrestrito ao universo criado por James Cameron e a rejeição aos seus excessos (sejam de duração ou de sentimentalismo). Já em cartaz nos cinemas, Avatar: Fogo e Cinzas não deve mudar esse cenário de reações à saga de Pandora, pelo contrário: chega para consolidá-las de vez.

Neste terceiro filme, a família Sully, liderada por Jake (Sam Worthington) e Neytiri (Zoë Saldaña), segue de luto pela perda do filho mais velho. Ao tentar atravessar uma região perigosa para resolver um impasse, eles são brutalmente atacados pelo Povo das Cinzas, seguidores da sanguinária Varang (Oona Chaplin), obcecada pelo poder do fogo. O grupo violento forma uma aliança com o Coronel Miles Quaritch (Stephen Lang), já ocupando o corpo de um Na’vi desde o longa anterior — o que coloca não apenas os Sully, mas todo o planeta, em um risco nunca antes visto.

São várias as razões pelas quais Fogo e Cinzas não deve converter os desfavoráveis à experiência de Avatar, mas a principal delas é a simplicidade do texto. Vencedor do Oscar por Titanic e responsável por três das cinco maiores bilheterias da história do cinema, James Cameron é um devotado da narrativa clássica romântica. Sua lealdade à estrutura tradicional da jornada do herói só perde para seu perfeccionismo visual, que aqui se mostra tão superlativo quanto se espera.

Os protagonistas são cheios de sentimentos íntegros e personalidades bem delineadas — com destaque para a caracterização e fisicalidade de Oona Chaplin como Varang —, mas seguem seus arquétipos (o pai protetor em conflito, a mãe enlutada e mergulhada na raiva, o filho que se sente culpado pela perda do irmão, a filha com conexões místicas misteriosas) de maneira quase inflexível. Os personagens humanos, desde o último filme, são propositalmente insípidos, funcionando como uma massa corporificada por armas, máquinas e aeronaves.

Como sempre, a beleza do trabalho de Cameron não está na subversão dessas tradições, mas no rigor com que harmoniza todas elas a partir de um espetáculo que se basta por si mesmo. Fogo e Cinzas, nesse sentido, perde algum frescor na comparação com O Caminho da Água, já que vários cenários e situações aqui não soam apenas clássicos, mas também repetidos. 

 

É de uma inocência quase infantil — ainda que claramente consciente — a maneira como vilões estão sempre voltando e reproduzindo as mesmas falas "malvadas". Em tempos de cinismo e autoconsciência nos grandes blockbusters norte-americanos, Avatar é aqui o sumo da obra e das preocupações de Cameron com um cinema de fascínio puro e ingênuo com a natureza. E o impacto sensorial da catarse das grandes batalhas, filmadas com a clareza e riqueza de detalhes tipicamente virtuosa do diretor, se mantém com uma energia quase maníaca dessa vez.

Dificilmente aqueles que um dia se apaixonaram pela iconografia de Pandora — sua natureza cristalina e suas luzes fosforescentes — vão abandonar o navio neste derradeiro capítulo da jornada dos Sully. Igualmente improvável, porém, é que aqueles que nunca compraram a psicodelia assumidamente cafona de Avatar passem a fazê-lo a partir de agora.