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Espetáculo 'Avós' explora ancestralidade e memória no Festival Recife de Teatro

Avós, monólogo da atriz recifense Olga Ferrario que investiga a ancestralidade feminina, chega ao Teatro do Parque nesta quinta-feira, como parte da grade do Festival Recife do Teatro Nacional

Por Allan Lopes

'Avós' compõe programação do Festival Recife do Teatro Nacional

Revisitar as memórias das nossas avós é um exercício de afeto. Na saudade, reconhecemos o acolhimento, o carinho e os ensinamentos que, no ritmo acelerado da vida, nem sempre soubemos valorizar no momento certo. Afinal, será que ouvimos, de verdade, a voz das nossas avós? É dessa inquietação, nem tão solitária, que nasce o espetáculo Avós, da atriz e autora recifense Olga Ferrario.

Movida pelo desejo de buscar dentro de si as mulheres que a precederam, ela convida o público a fazer essa mesma jornada nesta quinta-feira, no Teatro Hermilo Borba Filho, às 19h, integrando a programação do Festival Recife do Teatro Nacional, realizado pela Prefeitura do Recife através da Secretaria de Cultura (Secult).


Nesta busca íntima, Olga não está sozinha. Apoiada pelas contribuições fundamentais da atriz Lívia Falcão (sua mãe), da cineasta Dea Ferraz e da artista Sílvia Góes na narrativa, o monólogo se transforma em um universo de sentimentos, sensações, aprendizados, nascimentos e mortes. “Eu mergulho na minha história, nesse lugar da escuta e dos fragmentos de memória, entrelaçando meu percurso com o das minhas avós e das mulheres que montaram o espetáculo comigo”, diz a atriz, em conversa com o Viver.


A montagem veio ao mundo no formato virtual durante a pandemia, período marcado pela partida de tantas avós, conferindo ao trabalho um caráter de luto. Sua primeira versão era a de um cineteatro em que a câmera de Dea Ferraz criava dramaturgias através de planos-sequências, closes, enquadramentos e zooms. Sempre dinâmica, nunca estática. “A gente trabalhava diretamente no palco, ao vivo, incorporando elementos do cinema”, conta Olga, que também é dançarina, palhaça e escritora.


Com profundo interesse pelas questões humanas, ela direcionou um olhar microscópico para sua própria história e um telescópio para o mundo à sua volta. Na sua opinião, além dessa síntese entre o íntimo e o universal, o formato da dramaturgia também contribui para gerar identificação com várias mulheres, e também homens, a ponto de muitas retornarem para rever o espetáculo “Não há um caminho linear", revela a atriz. “Isso faz com que cada pessoa complete as lacunas a partir das próprias memórias e referências”.

Olga, mãe de Davi e Tom, viu no espetáculo a oportunidade de ressignificar e consolidar sua maternidade. Avós também nasceu do encontro visceral entre a experiência de ser mãe e a constatação do quanto a sociedade permanece despreparada para abraçar as mulheres nessa travessia. “Depois da peça, percebi que não preciso voltar ao mercado de trabalho fingindo que não sou mãe. Eu volto sendo quem sou agora, com todas as dimensões que isso carrega”, destaca.

O convívio ao longo dos anos com suas avós, tanto materna quanto paterna, mostrou a Olga o quanto do feminino foi silenciado na esfera familiar e no ato da maternidade, bem como as profundas diferenças entre as experiências vividas por mães e pais. “Ainda falta espaço, acolhimento e estrutura real para as crianças e para quem cuida delas”, reflete a atriz. É essa realidade que Avós coloca em cena, fazendo do teatro um espaço de denúncia e, ao mesmo tempo, de reconstrução afetiva.