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Companhia de Dança Deborah Colker apresenta 'Sagração' no Teatro Guararapes

Em meio às comemorações de 31 anos de estrada, a Companhia de Dança Deborah Colker encena 'Sagração'. sua releitura do clássico 'A Sagração da Primavera' na próxima terça-feira, no Teatro Guararapes

Por Allan Lopes

Espetáculo 'Sagração' é uma releitura abrasileirada do clássico 'A Sagração da Primavera'

Em 1913, a estreia do espetáculo A Sagração da Primavera escandalizou Paris e transformou para sempre os rumos da dança e da música. A composição revolucionária de Igor Stravinsky, somada à coreografia pujante de Nijinsky, encenava um ritual pagão de sacrifício humano. Mais de um século depois, a Companhia de Dança Deborah Colker, que celebra três décadas de estrada, revisita a obra-prima, ressignificando-a com referências ao Brasil ancestral. O espetáculo chega a Olinda na próxima terça-feira, no Teatro Guararapes, às 20h30.


O mais novo trabalho conclui uma trilogia que teve início com Cão sem Plumas (2017) e seguiu com Cura (2021), na qual cada obra explora uma faceta distinta da experiência humana. Enquanto aquele primeiro trabalho olhava para o Nordeste em uma perspectiva mais ampla, a partir do poema do pernambucano João Cabral de Melo Neto, agora a conexão se dará por um viés mais íntimo e identitário, ligado aos mitos indígenas e à floresta que nos molda. “É outro tipo de proximidade. Quero que as pessoas sintam esse Brasil profundo que pulsa no palco”, explica Deborah Colker, em conversa exclusiva com o Viver.


Em um único ato de 70 minutos, dividido em 14 cenas, a dramaturgia se constrói a partir de elementos cosmogônicos. Um deles recria a lenda narrada por Takumã Kuikuro sobre a origem do fogo. Outro traz mitos judaicos-cristãos do Gênesis, como Eva e a serpente e Abraão. Há ainda um que incorpora a linguagem científica, materializando em cena seres como bactérias, herbívoros e quadrúpedes.


Para dar vida a essa fusão de narrativas, a trilha abandona a referência clássica de Stravinsky em favor de uma sonoridade genuinamente brasileira, incorporando ritmos como coco, afoxé e samba. Para reproduzir esses sons com fidelidade, Deborah e o diretor musical Alexandre Elias mergulharam em pesquisas, ouvindo gravações de rituais e identificando instrumentos indígenas como flauta de madeira, maracá e caxixi. “Alexandre não apenas adaptou arranjos. Também criou pontos de respiro e camadas rítmicas novas sem misturar com Stravinsky, mas o expandindo”, observa a carioca.


Uma das principais expoentes da dança contemporânea nacional, Deborah recentemente ampliou seu território criativo para a ópera, onde fez história: tornou-se a primeira brasileira a assinar a direção cênica de um espetáculo exibido no Metropolitan Opera, templo máximo da arte lírica em Nova York, com a montagem Ainadamar. “É um universo imenso, de grande complexidade, que exige outra forma de escuta e de olhar”, afirma a artista, que já voltou suas atenções para a próxima encenação no local, O Último Sonho de Frida e Diego, com estreia prevista para 2026.


Conquistas como essa, somadas à sua visão artística única, são o que permitiram a Deborah Colker não apenas consolidar sua carreira, mas também liderar a sua companhia por três décadas. Um legado que hoje é reconhecido internacionalmente e coroado com o título de patrimônio cultural imaterial do Rio de Janeiro. “O que mais me move é a certeza de que a arte é essencial para transformar vidas”, destaca a coreógrafa, cuja trajetória já mudou para sempre o cenário da dança no Brasil.